*Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Durante a pandemia da covid-19, as pessoas passaram a usar ainda mais as redes sociais como forma de se manterem conectadas umas às outras e com o mundo. Só no Tik Tok, por exemplo, o número de usuários passou de aproximadamente 500 milhões no final de 2019 para mais de 1 bilhão de pessoas no meio de 2021. Em consequência disso, ficou mais evidente do que nunca a importância desse tipo de mídia na comunicação da Ciência, dado que o aumento das notícias falsas relacionadas a esse assunto foi enorme.
Essa preocupação com o potencial nocivo das redes sociais fez com que muitas pessoas passassem a enxergá-las, por mais contraditório que pareça, como uma ameaça ao nosso modo de vida em sociedade e não como uma possível ferramenta para promover a disseminação do conhecimento humano para o maior número possível de indivíduos.
Redes sociais tiveram crescimento expressivo durante a pandemia de covid-19Fonte: Getty Images
O caso da propagação de notícias falsas em redes sociais é um grande problema pois, diferentemente das mídias tradicionais (como a televisão, rádio e jornais impressos), essas redes não apresentam nenhum tipo de moderação, isto é, não existem profissionais responsáveis por checar a veracidade de uma informação antes de promovê-la. Nas redes sociais, os próprios usuários e consumidores de notícias podem também ser responsáveis pela produção e propagação das notícias e ideias. Uma coisa que pode ser questionada é o que leva as pessoas a acreditarem e (pior ainda) compartilharem notícias falsas voluntariamente?
Para tentarmos entender esse fenômeno, faça, por um momento, um questionamento sobre a maneira com que você interage com notícias nas redes sociais. Essa interação pode ser entendida como a avaliação sobre a veracidade da notícia e uma decisão sobre um possível compartilhamento dessa notícia. De uma forma ou de outra, não parece nenhum absurdo pensar que essa interação ocorre, para a maioria das pessoas, de maneira rápida e, por muitas vezes, desatenta ao rolar o seu “feed” e encontrar uma notícia sobre Ciência logo após um vídeo sobre culinária e logo antes de um vídeo de gatos tocando piano, por exemplo.
Em pesquisa publicada em março desse ano, na revista americana Science, os cientistas avaliaram com que grau de precisão pessoas diferentes avaliam a veracidade de manchetes. Em seguida, foi feita a comparação dos resultados com a intenção de compartilhar ou não tais manchetes. O resultado encontrado é, no mínimo, curioso e, no pior cenário, preocupante.
Os cientistas perceberam que, quando as pessoas eram pedidas para julgar algumas manchetes em verdadeiras ou falsas (sem serem perguntadas se pretendiam compartilhar ou não as notícias em suas redes), a precisão desses julgamentos foi consideravelmente maior do que quando, antes de realizar essa avaliação, as pessoas eram perguntadas se pretendiam compartilhar a manchete em questão.
Isto é, quando as pessoas afirmavam primeiro que pretendiam compartilhar uma determinada manchete, a tendência era de que essas pessoas avaliassem tal manchete como verdadeira. E o contrário é válido para quando as pessoas afirmam que não compartilhariam as manchetes por acharem que eram falsas. Esse estudo mostra que, apesar da propagação de notícias falsas acontecer voluntariamente, os usuários de rede sociais compartilham esse tipo de desinformação pois realmente acreditam, ou pelo menos gostariam que tais notícias fossem verdadeiras.
Porém, quando avaliamos a intenção de compartilhar uma determinada notícia, podemos pensar em diversos motivos pelos quais um usuário é estimulado a fazer isso. Por exemplo, compartilhar uma notícia relevante pode aumentar seu grau de prestígio social. Porém, os pesquisadores encontraram uma relação dessa decisão de compartilhamento de notícias falsas com a visão política das pessoas.
Ou seja, se a notícia científica não corrobora a visão política das pessoas, por mais sólidas que sejam as evidências, essa notícia tem baixa aceitação. Por outro lado, quando uma informação parece favorável politicamente, sua aceitação fica muito mais simples. Portanto, é sempre importante fazer o lembrete que a Ciência, e a natureza como um todo, não se importam nenhum pouco com nossas opiniões pessoais. Pelo menos não deveriam.
Rodolfo Lima Barros Souza, professor de Física e colunista do TecMundo. É licenciado em Física e mestre em Ensino de Ciências e Matemática pela Unicamp na área de Percepção Pública da Ciência. Está presente nas redes sociais como @rodolfo.sou
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