Uma das habilidades mais poderosas dos seres humanos é a capacidade de imaginar. A imaginação, em todos os ramos do conhecimento e da cultura, permite construir cenários hipotéticos, adicionar infinitas características a eles e examinar suas possibilidades, extraindo, muitas vezes, resultados bastante úteis.
Perguntas do tipo “como seria o mundo hoje se a Alemanha tivesse vencido a Segunda Guerra Mundial?” ou “o que acontecerá se o Brasil se tornar uma potência mundial?” podem ter pouco ou nenhum valor histórico pelo simples fato de não terem acontecido ou não serem um aspecto da realidade atual, porém, têm seu valor para o exercício do raciocínio e da lógica.
A imaginação para as ciências da natureza é, contudo, fundamental. Ao longo da história, inúmeros resultados revolucionários que propiciaram um salto no desenvolvimento científico tiveram como ponto de partida o puro e simples ato de imaginar. E se ...? Examinemos aqui o caso de um cenário impossível: e se a Terra se transformasse em um buraco negro?
Simulação de um buraco negro.Fonte: NASA
Partiremos do fato de que, no Universo, na ausência de quaisquer outras forças ou interações além da gravitacional, qualquer configuração inicial de massa inevitavelmente entrará em colapso para formar um buraco negro. De fato, a gravidade não precisa nem ser a única força, basta ser a interação dominante. À medida que a matéria entra em colapso, ela cruza um limite crítico para a quantidade de massa dentro de um determinado volume, levando à formação de um horizonte de eventos. Qualquer objeto em repouso, não importa quão longe desse horizonte de eventos esteja, dado tempo suficiente, cruzará esse horizonte e encontrará a singularidade central.
Se, de alguma forma, as forças eletromagnéticas e as interações quânticas dos átomos que constituem nosso planeta (e naturalmente contrabalanceiam o colapso gravitacional) fossem desligadas, a Terra rapidamente se tornaria um buraco negro.
Representação artística da transformação da Terra em um buraco negro.Fonte: Riddle
Se isso acontecesse, todo o material que compõe a Terra começaria imediatamente a acelerar em direção ao centro da Terra, como se estivesse em queda livre perfeita. No núcleo, a massa se acumularia cada vez mais e sua densidade aumentaria exponencialmente ao longo dos primeiros minutos. Isso ocorreria porque, embora a massa permanecesse a mesma, o volume ao qual ela estaria contida estaria diminuindo constantemente.
Depois de cerca de 10 a 20 minutos, uma quantidade suficiente de matéria teria se reunido nos poucos milímetros centrais para formar um horizonte de eventos pela primeira vez. Depois de apenas mais 1 ou 2 minutos no total, toda a massa da Terra teria colapsado em um buraco negro de apenas 1,72 centímetros de diâmetro.
Se a Terra colapsasse de repente em um buraco negro, se você não estivesse no espaço, teria um destino igual ao de todos os demais seres humanos: quando olhássemos para baixo, se o material que compõe a Terra ainda conseguisse emitir ou refletir a luz ambiente, poderíamos ver o que aconteceu com a superfície sob nossos pés quando caímos. Porém, à medida que o buraco negro se formasse, ele simplesmente distorceria o espaço e as imagens que veríamos seriam retorcidas devido aos raios de luz sendo curvados.
Esquema da distorção dos raios de luz nas proximidades de um buraco negro.Fonte: Hubble/NASA/ESO
Depois da sensação inicial de sair do repouso para estar em queda livre a uma aceleração de 9,8 m/s² em direção ao centro da Terra, quanto tivéssemos caído a meio caminho do centro da Terra (a uma distância de aproximadamente 3.187 quilômetros), nossa velocidade seria de 11 quilômetros por segundo e quando estivéssemos a apenas 1 quilômetro do centro, nossa velocidade de queda seria de impressionantes 895 quilômetros por segundo.
Como você já conseguiu imaginar, nessa aventura hipotética não restariam sobreviventes para contar história. A principal razão para isso é que, à medida que caíssemos cada vez mais para perto do centro da Terra em colapso, começaríamos a experimentar enormes aumentos nas forças de maré, resultado da interação gravitacional.
Representação de como seria cair em um buraco negro, evento chamado de espaguetificação.Fonte: Domínio público
Quando estivéssemos a cerca de 25 quilômetros do buraco negro central, as forças de maré causariam um alongamento das nossas colunas, fazendo com que ela se alongue tão severamente que as vértebras individuais não permaneceriam intactas. A cerca de 14 quilômetros de distância, todas as nossas articulações teriam se soltado e nosso corpo não estaria mais unido em partes maiores. Por fim, ao nos aproximarmos mais e mais, as forças de maré seriam fortes o suficiente para destruírem todas as nossas células e dividir até mesmo os átomos que um dia constituíram nosso corpo. No final, como tudo no planeta, seríamos absorvidos pelo buraco negro ao longo de um total de 22 minutos desde que começamos a cair.
Se a Terra se transformasse em um buraco negro de repente, sob as leis da gravidade, o fim de todas as pessoas no planeta seria literalmente igual.
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