*Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Se você está lendo esta coluna, ou se é um leitor desse site, não é absurdo imaginar que você é uma pessoa que se interessa por Ciência e na maneira como o conhecimento científico é pensado e produzido. A Ciência possui um “status” em nossa sociedade, visto que, quando algum argumento, para qualquer coisa que seja, é embasado ou comprovado cientificamente, tal argumento é considerado relevante, seja em conversas cotidianas e até no meio político.
As pseudociências, e as pessoas que se utilizam delas em benefício próprio, de modo geral, usufruem do status científico e de sua similaridade (e apenas similaridade) com a Ciência para ganhos, não somente financeiros, como de posição social. Uma questão que surge disso é: como pensam as pessoas que são influenciadas diretamente pelas pseudociências?
Em artigo publicado em janeiro de 2022 na revista americana Nature, o cientista australiano Ullrich Ecker e seus colaboradores avaliaram como funciona a mente de pessoas que acreditam em informações falsas (desinformação). Eles encontraram fatores cognitivos: como a falta de pensamento analítico, a negação de fontes confiáveis e também contra-argumentos; e fatores socioafetivos: como a confiança plena e incondicional em fontes familiares e o fato de que a visão de mundo da pessoa pode ser confirmada se determinada desinformação for verdadeira.
Notícias falsas e pseudociências podem se espalhar com rapidez nas redes sociaisFonte: Getty Images
Sobre a falta de pensamento analítico, em outro artigo da mesma revista, publicado em dezembro de 2021, os cientistas Javier Rodríguez-Ferreiro e Itxaso Barberia, demonstraram que pessoas que acreditam em pseudociências possuem um critério mais baixo para acreditar em provas de que algo é verdade.
Nesse estudo, os cientistas fizeram com que os participantes realizassem dois experimentos e respondessem a um questionário. No primeiro experimento existiam dois potes: o primeiro com 60 bolas azuis e 40 bolas vermelhas (majoritariamente azul) e o segundo com 60 bolas vermelhas e 40 bolas azuis (majoritariamente vermelho). Os participantes deveriam tentar descobrir com qual pote estavam lidando pedindo para que os cientistas retirassem bolas uma a uma e poderiam escolher, a cada bola retirada, retirar mais uma bola ou encerrar o experimento quando achassem que tinham descoberto o pote em questão. O que os participantes não sabiam é que os cientistas retiravam as bolas dos potes sempre na mesma ordem inicial (por exemplo: azul, vermelha, azul, azul, ...), independente de qual fosse o pote em questão.
Após os experimentos, os participantes responderam ao questionário que avaliaria o quanto cada um acredita em afirmações pseudocientíficas. Como, por exemplo: “escutar música clássica na infância faz com que as crianças fiquem mais inteligentes” ou que “...é possível manipular energias e curar doenças físicas e psicológicas aproximando as mãos de um especialista da pessoa afetada”.
O resultado encontrado mostrou que as pessoas que mais concordavam com o tipo de afirmação feita no questionário pediram que fossem retiradas menos bolas do pote antes de tirar uma conclusão. Ou seja, as pessoas que mais acreditam em pseudociências precisaram de menos provas para crer em uma “verdade”, ou pelo menos chegar a uma conclusão.
No segundo experimento, os participantes tinham que descobrir a regra de um jogo de labirinto. O labirinto em questão era extremamente simples, porém os participantes só recebiam a mensagem de vitória caso fizessem o percurso em 4 segundos ou mais. Apenas 7 de 62 participantes descobriram corretamente a regra do jogo, porém, mais uma vez, os cientistas observaram que as pessoas que acreditam em pseudociências tentaram resolver o jogo uma quantidade menor de vezes antes de afirmar qual seria a regra.
Por fim, a ideia com isso tudo é sempre entender o modo de pensar das pessoas para que a comunicação da Ciência e a educação científica da população seja cada vez mais efetiva no sentido de estabelecer uma prevenção e, por assim dizer, uma imunidade contra a desinformação. Assim, crenças anticientíficas altamente prejudiciais, como o movimento antivacina, por exemplo, estariam cada vez mais perto de serem erradicadas.
Rodolfo Lima Barros Souza, professor de Física e colunista do TecMundo. É licenciado em Física e mestre em Ensino de Ciências e Matemática pela Unicamp na área de Percepção Pública da Ciência. Está presente nas redes sociais como @rodolfo.sou