*Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Em geral, se pedirmos para pessoas diversas citarem o nome de grandes cientistas da história, seria bastante comum e esperado ouvir os nomes de Isaac Newton, Albert Einstein, Charles Darwin, Stephen Hawking, entre outros. E algo que esses cientistas todos têm em comum, é o fato de terem nascido na Europa.
Atualmente, o cenário dos cientistas mais importantes é bastante espalhado por todo o mundo, mas, partindo disso, podemos nos perguntar quais “vantagens”, por assim dizer, os europeus possuíram que fazem com que os cientistas mais famosos até hoje sejam desse único continente.
Uma resposta óbvia para tal questionamento é o contexto histórico. Isto é, os países europeus que conhecemos hoje são descendentes diretos de impérios que dominaram diversos povos por todo o mundo (atualmente, temos outros tipos de impérios). Essa dominação fez com que os europeus tivessem contato com absolutamente tudo o que era produzido culturalmente e, por consequência, cientificamente por esses povos.
A acumulação e a valorização dos mais diversos tipos de conhecimento por um povo, além da liberdade que tal povo possui para investir em longas jornadas, que muitas vezes não possuem resultados imediatos, são apenas alguns dos fatores essenciais para que a produção científica seja estimulada em determinada sociedade.
No caso da Europa, tais fatores foram extremamente favoráveis durante o período conhecido como Renascimento, o que ainda nos influencia diretamente quando pensamos em nomes europeus como os “maiores” dentro da Ciência. Porém, para que exista um contexto científico tão favorável, diversas outras coisas devem estar alinhadas no contexto social. No caso do Renascimento europeu, uma dessas coisas foi o conhecimento produzido na Idade de Ouro Islâmica.
Enquanto a Europa vivia a chamada Idade Média (conhecida por alguns como Idade das Trevas), o império islâmico estava em seu auge. Com incentivos financeiros extremamente generosos por parte do governo e a abertura do império que permitia livre acesso à diversas outras culturas, o desenvolvimento científico produzido nesse período foi um dos maiores na história da humanidade.
Os cientistas islâmicos dessa época realizaram contribuições importantes para diversas áreas do conhecimento humano. Uma das evidências da importância desse período na história da ciência, é a presença do prefixo árabe “al-” em palavras como álgebra, algoritmo, alquimia, entre outras. Porém, dentre todas as contribuições islâmicas para a Ciência, talvez a maior delas seja o desenvolvimento do chamado Método Científico.
O Método Científico pode ser entendido como um mecanismo de correção de erros utilizado entre cientistas para prevenir o pensamento descuidado ou preconceituoso sobre determinado assunto. Essa forma de pensar sobre a natureza e sobre a sociedade é, de maneiras diferentes, empregada até hoje por cientistas do mundo todo em sua busca por conhecimento.
A concepção dessa forma de pensar é creditada ao estudo de propriedades da luz realizado por Ibn Al-Haytham. Esse físico islâmico, que já foi citado como o “primeiro verdadeiro cientista”, embasou suas afirmações em experimentos que poderiam ser reproduzidos por qualquer pessoa e em argumentos lógicos. Ele defendia que, sem essas duas coisas, a “busca pela verdade” que a Ciência se propõe a fazer não seria sequer possível.
Ibn Al-Haytham é conhecido como o "primeiro cientista".Fonte: Shutterstock
Sem o pensamento de Al-Haytham, nenhum outro cientista posterior poderia formular suas famosas teorias. A Ciência possui seu status social atual, dentre outros motivos, pelo fato de que o conhecimento científico embasa suas afirmações em argumentos lógicos e que são perfeitamente verificáveis para todos que desejarem. Caso uma afirmação científica seja provada falsa ou inconsistente com a verdade da natureza ou de uma sociedade, essa afirmação deve ser revista e reformulada num processo que já é previsto pelo Método Científico.
A Ciência é uma empreitada tipicamente humana e possui contribuições diversas ao longo de toda a nossa história. A influência europeia é bastante presente em nossa sociedade atual, mas é sempre essencial, no campo da Ciência como em quaisquer outros, valorizarmos e entendermos os motivos pelos quais estamos onde estamos. Para que a Ciência continue evoluindo e sendo valorizada, o contexto social é primordial. E é importante ressaltar que a produção de tal contexto favorável cabe a cada um de nós.
Rodolfo Lima Barros Souza, professor de Física e colunista do TecMundo. É licenciado em Física e mestre em Ensino de Ciências e Matemática pela Unicamp na área de Percepção Pública da Ciência. Está presente nas redes sociais como @rodolfo.sou