*Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Um dos fatos mais impressionantes que a cosmologia moderna nos revelou sobre o Universo é saber qual é a sua idade: 13,8 bilhões de anos.
Todas as estrelas e galáxias que vemos hoje surgiram de uma série de fusões gravitacionais de objetos de menor massa que deram origem a objetos maiores que, por sua vez, foram evoluindo ao longo desse tempo. Porém, nos estágios iniciais do Cosmos, não havia estrelas, planetas ou galáxias e o cenário era muito diferente.
Os astrofísicos e cosmólogos que estudam esse universo primitivo conseguem estimar há quanto tempo ele ocorreu com bastante precisão, indicando valores que possuem incertezas não maiores do que 1%.
Idade da Terra, do Sol, da galáxia e do Universo comparativamente (crédito: NASA/JPL-Caltech)
Essa é uma conquista notável para a ciência moderna e reflete a engenhosidade do intelecto humano que, embora não tenha nos levado fisicamente mais longe do que à Lua, ainda assim possibilitou viagens profundas na imensidão cósmica. Mas como chegamos lá? Como somos capazes de saber a idade do Universo?
Para responder essa pergunta, precisamos entender que, na física, se é possível obter as equações que governam um determinado sistema – isto é, o conjunto de equações que informam como esse sistema evolui ao longo do tempo – e se soubermos o que esse sistema está fazendo em um determinado momento no tempo, é possível estudá-lo em qualquer instante de tempo, tanto no passado quanto no futuro. Se as leis da física e o conteúdo do sistema continuarem inalteráveis, essa previsão estará correta.
Na Cosmologia, as regras que descrevem o nosso Universo em expansão são originadas de soluções das equações da Teoria da Relatividade Geral de Albert Einstein para um universo que é, em média, relativamente similar (com iguais quantidades e distribuições de objetos) em todos os lugares e em todas as direções.
Representação artística das épocas cósmicas (crédito: ESA/Hubble)
Do ponto de vista conceitual, então, a ideia é relativamente simples: depois de descobrir que o Universo está se expandindo, no final da década de 20 do século passado, tudo o que os astrônomos precisaram fazer foi medir a taxa de expansão atual e usar as leis da física para determinar como a taxa de expansão evoluiu ao longo do tempo. Em vez de extrapolar a matemática para o futuro e determinar o destino do Universo, foi possível fazer o cálculo inverso, forçando o tempo correr para trás e percorrendo todo o caminho de volta até atingir o próprio Big Bang.
Esse método não apenas funciona, como continua sendo a maneira eficaz que temos para calcular a idade cósmica até hoje. Para contar seus detalhes, porém, mais delicados e sutis, precisaremos de mais alguns parágrafos.
O primeiro lugar para começar é com o próprio Universo em expansão e com o parâmetro que informa a taxa com o qual ele faz isso: a constante de Hubble. Ao observar o Universo em grandes escalas, as galáxias que encontramos obedecem a uma relação simples entre os parâmetros distância e velocidade. Essa relação nos informa que quanto mais distante um objeto estiver de nós, maior será a velocidade com que ele se afasta.
Earendel, uma das estrelas mais distantes e antigas do Universo, com idade estimada em 13,4 bilhões de anos (crédito: NASA, ESA, Brian Welch - JHU, Dan Coe - STScI/NASA, ESA, Alyssa Pagan - STScI)
O valor da constante de Hubble atual deve ser consistente também com a soma total de todas as formas de energia que contribuem para a composição do Universo: a matéria normal, a matéria escura, os neutrinos, a radiação, a energia escura e a curvatura do espaço (e alguma eventual outra coisa que seja possível de adicionar).
Embora esse trabalho não esteja finalizado e os cosmólogos ainda tenham que aprimorar esses parâmetros e obter resultados a partir de diferentes métodos combinados, a relação entre eles garantem que, se um parâmetro for diferente, uma série de outros parâmetros também deverá mudar para permanecer consistente com o conjunto completo de dados observacionais.
Um método que é possível de ser utilizado para confirmar as estimativas da idade do Universo é medir as idades das estrelas mais antigas que existem. Afinal, se acreditamos que o Universo tem 13,8 bilhões de anos, então é melhor não encontrarmos nenhuma estrela dentro dele que seja mais velha que isso.
Existem muitas propriedades do Universo sobre as quais os astrônomos ainda têm dúvida, mas a sua idade é uma das poucas em que há alguma certeza confiável. Poderíamos tentar construir modelos teóricos para um Universo mais velho ou mais jovem, mas as evidências observacionais indicam que o Universo como conhecemos começou há 13,8 bilhões de anos com o Big Bang. Esse valor possui uma margem de erro tão pequena que nos possibilita afirmar que qualquer estimativa no nosso Universo que resulte em algo com menos de 13,6 bilhões ou mais de 14,0 bilhões de anos já está descartado.
Nícolas Oliveira, colunista do TecMundo, é licenciado em Física e mestre em Astrofísica. É professor e atualmente faz doutorado no Observatório Nacional, trabalhando com aglomerados de galáxias. Tem experiência com Ensino de Física e Astronomia e com pesquisa em Astrofísica Extragaláctica e Cosmologia. Atua como divulgador e comunicador científico, buscando a popularização e a democratização da ciência. Nícolas está presente nas redes sociais como @nicooliveira_.
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