*Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Todo apaixonado pela astronomia já se deparou com informações do tipo: Proxima Centauri, a estrela mais próxima do Sistema Solar está a uma distância de 4,2 de anos-luz de nós; ou ainda: Betelgeuse, a estrela supergigante vermelha da constelação de Órion irá explodir uma supernova e, mesmo estando a 640 anos-luz de distância da Terra, quando isso acontecer, poderemos enxergar a olho nu.
Betelgeuse, uma supergigante vermelha.Fonte: ESO
Que as escalas astronômicas são impressionantes nós já sabemos. Mas como sabemos distâncias cósmicas se nenhum humano jamais saiu do Sistema Solar? Como os astrônomos conhecem esses valores com precisão de uma, duas e até três casas decimais?
Certamente, essas medidas não foram feitas com réguas. Pelo menos não as réguas físicas como as que usávamos para medir distâncias no papel quando crianças. As réguas utilizadas pelos astrônomos são ferramentas matemáticas e variam de acordo com o quão longe estamos olhando no Universo.
Se quisermos medir distâncias relativamente curtas digamos, dentro do Sistema Solar, é possível utilizar técnicas de observação de radar, em que é possível utilizar a reflexão de micro-ondas em um determinado objeto e analisar os ecos que retornam à Terra.
Essa é uma técnica imprescindível para a visualização espacial de asteroides, bem como a medição precisa de suas distâncias até nós, o que possibilita a determinação de sua órbita e se oferece risco de colisão com nosso planeta ou não.
Imagens de radar e o modelo computacional do asteroide 1998 JM8.Fonte: NASA
Porém, a intensidade do sinal de retorno do radar é proporcional ao inverso da quarta potência da distância, o que significa que se o objeto estiver a uma distância muito grande, o sinal recebido de volta será muito fraco para ser medido com precisão. Por essa razão, para distâncias maiores (em geral, superiores a 10 UA, unidades astronômicas) é comumente utilizada uma técnica chamada de paralaxe trigonométrica.
A paralaxe é um método que utiliza relações simples da geometria euclidiana para medir distâncias de estrelas usando a posição da Terra como parâmetro. À medida que a Terra orbita o Sol, a posição relativa de estrelas próximas muda levemente em relação ao fundo de estrelas situadas ainda mais distantes da Terra que aparentam estar fixas.
Representação da paralaxe estelar.Fonte: NASA/ESA
Uma verificação fácil e rápida da paralaxe é simplesmente estender a nossa mão diante dos nossos olhos com o polegar voltado para cima e observá-lo com um olho aberto e o outro fechado. Em seguida, se o observarmos trocando a ordem do olho que estava aberto e do que estava fechado, iremos perceber que a posição do dedo em relação aos objetos de fundo mudou.
Como mesmo as estrelas próximas estão muito distantes de nós, precisamos de uma diferença de posição muito maior que a distância entre um olho e outro na nossa cabeça para percebermos essa variação aparente de suas posições. Muitas vezes, nem mesmo observar uma determinada estrela com um telescópio no Brasil e em seguida observá-la no Japão é suficiente para perceber qualquer variação.
Por essa razão, os astrônomos costumam utilizar a própria órbita da Terra para fazer as medições dessas distâncias. Como sabemos a distância média entre a Terra e o Sol, é possível, através de aplicação simples de trigonometria, obter a distância a uma determinada estrela.
https://twitter.com/DrJorgeMelendez/status/1281735521534980096
Do ponto de vista observacional, contudo, essa não é uma tarefa das mais simples. O ângulo de paralaxe pelo qual até mesmo as estrelas mais próximas se deslocam é muito pequeno. Para Proxima Centauri, por exemplo, esse valor equivale a 0,77 segundo de arco. Um segundo de arco é o mesmo que 1/3.600 de grau. Se você pedir para alguém segurar um fio de cabelo seu a uma distância de cerca de 10 metros, esse fio cobre um ângulo correspondente a um segundo de arco.
A precisão da medição de distâncias com o método da paralaxe depende, além da sofisticação dos telescópios utilizados, da localização dos mesmos. Telescópios espaciais situados em órbita da Terra possuem uma vantagem significativa em relação aos observatórios de superfície, podendo medir de forma precisa a distância de estrelas que estejam num raio de aproximadamente 6.500 anos-luz.
Contudo, para o Universo, mesmo 6.500 anos-luz é uma distância pequena. Poderíamos dizer tranquilamente que nessa distância estão apenas os vizinhos mais próximos do nosso bairro galáctico. Nossa galáxia, a Via Láctea, tem um diâmetro de 100.000 anos-luz. A galáxia de Andrômeda, nossa vizinha galáctica, está distante cerca de 2,5 milhões de anos-luz. Existem inúmeras outras que estão a dezenas e até centenas de milhões de anos-luz daqui.
M51: um par de galáxias a 31 milhões de anos-luz de distância.Fonte: Josep Drudis
E essas distâncias? Como podemos conhecê-las, já que o método da paralaxe não é suficiente? Bom, essa é uma conversa para outro dia!
Nícolas Oliveira, colunista do TecMundo, é licenciado em Física e mestre em Astrofísica. É professor e atualmente faz doutorado no Observatório Nacional, trabalhando com aglomerados de galáxias. Tem experiência com Ensino de Física e Astronomia e com pesquisa em Astrofísica Extragaláctica e Cosmologia. Atua como divulgador e comunicador científico, buscando a popularização e a democratização da ciência. Nícolas está presente nas redes sociais como @nicooliveira_.
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