*Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Se você não esteve isolado do mundo e da internet nos últimos anos, você deve ter ouvido alguma coisa ou algum termo ligado com a palavra “quântico”. Seja entre os famigerados coachs ou entre “tratamentos”, “curas” e “medicinas”, a apropriação do termo que faz referência à Mecânica Quântica é bastante disseminada e chegou até mesmo na alimentação com a “nutrição quântica” e o, acredite, “sal quântico”.
Richard Feynman, físico americano ganhador do prêmio Nobel, já disse que “ninguém entende a Mecânica Quântica”. Essa citação, mesmo que fora de contexto (Feynman fazia uma brincadeira em apresentação para outros físicos), e que pode até ter um fundo de verdade, mostra que talvez não seja necessário, para todas as pessoas, entender a tal Mecânica Quântica, mas somente saber o que vem a ser essa área de estudo para evitar cair em eventuais charlatanismos ou colocar a vida em risco com tratamentos sem comprovação científica.
Mas, afinal, o que vem a ser a Mecânica Quântica?
De maneira simplificada, a Mecânica Quântica é a área da física que estuda fenômenos de dimensões atômicas ou subatômicas. O grande “problema”, por assim dizer, é que não conseguimos relacionar tais fenômenos de maneira direta com nossa experiência macroscópica, isto é, aquilo que vivenciamos com nossos sentidos (visão, audição, olfato, etc).
Por exemplo, quando alguém chuta uma bola de futebol, uma certa quantidade de energia é deslocada de um ponto até outro, mas quando deixamos uma pedra cair em uma piscina ou um lago formando ondas, essas ondas transmitem energia de maneira diferente pelo espaço. Agora, quando cientistas tentam observar quantidades de energia subatômicas se deslocando, elas se comportam ora como partículas (análogas à bola de futebol), ora como ondas (como no lago) e, em algumas situações, das duas formas!
Ondas se propagando na superfície da água.Fonte: Shutterstock
Esse tipo de comportamento simultâneo, é apenas um exemplo de como fenômenos quânticos são, para dizer o mínimo, curiosos. Isso é também evidenciado no famoso experimento mental do gato de Schrödinger, onde o físico austríaco, para exemplificar um fenômeno quântico macroscopicamente propôs que, um gato trancado em uma caixa com um material radioativo, estaria vivo e morto ao mesmo tempo, até que se olhe o que está, de fato, acontecendo lá dentro.
Interessantemente, esses fenômenos estão mais presentes em nossa vida do que pensamos. Na verdade, é até difícil citar as tecnologias recentes que não os utilizam em seu funcionamento. Desde a tecnologia computacional dos celulares, passando pelos lasers e até a iluminação pública das ruas que funciona baseada em um fenômeno chamado efeito fotoelétrico, tem suas explicações embasadas na Mecânica Quântica.
Voltando ao uso do termo “quântico”
A discussão sobre as pseudociências e sobre como elas podem afetar as pessoas utilizando de um discurso aparentemente científico, como é o caso da homeopatia ou, em um exemplo talvez menos nocivo, da astrologia, pode ser feita num outro momento. Mas, no caso do “quântico”, só sabendo um pouco mais sobre esse tema e de onde o termo se origina, fica mais claro que não devemos nos animar tanto quando um coach vende seu “serviço” utilizando a Mecânica Quântica como justificativa para te dar conselhos financeiros, por exemplo.
Já o caso dos tratamentos quânticos é ainda mais delicado, pois acaba sendo uma questão de saúde pública. Cabe deixar claro que não se advoga aqui para que tais práticas sejam proibidas ou algo do tipo. O ponto é que, enquanto não há comprovação científica de eficácia, deve-se sempre, caso haja vontade e necessidade de realizar algum tipo de tratamento, aliar esse processo à medicina tradicional.
Talvez por se tratar de uma área de conhecimento relativamente nova (primeiros trabalhos entre o fim do século XIX e início do século XX) que não é ensinada na maioria das escolas, ou talvez para aproveitar o prestígio que a Ciência tem perante a sociedade (talvez um pouco dos dois, no que seria um típico comportamento quântico), devemos sempre estar atentos para possíveis golpes que usam a falta de conhecimento científico como ponto de partida.
Rodolfo Lima Barros Souza, professor de Física e colunista do TecMundo. É licenciado em Física e mestre em Ensino de Ciências e Matemática pela Unicamp na área de Percepção Pública da Ciência. Está presente nas redes sociais como @rodolfo.sou