Pesquisadores do Centro de Astrobiologia, usando o telescópio Gaia da Agência Espacial Europeia (ESA), descobriram uma nova região da Via Láctea repleta de estrelas jovens – uma cintilante ponte entre o Braço de Órion (onde estamos) e o de Perseu, agora batizada de esporão de Cefeus.
“Revisar o catálogo de estrelas original nos levou a conferir quais aspectos de nosso ambiente galáctico estavam se manifestando mais claramente. E aí surgiu a surpresa: uma superdensidade de estrelas em um espaço que antes estava aparentemente vazio”, disse o astrofísico do Centro de Astrobiologia (CAB) Michelangelo Pantaleoni González, principal autor do estudo publicado agora na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.
A descoberta dessa estrutura composta de estrelas classificadas como O e B é um indicativo da atividade em nossa galáxia, por serem regiões de formação estelar. Estrelas desses tipos são azuladas, muito quentes e extremamente luminosas. Elas são também muito raras: uma em três milhões de estrelas nas vizinhanças do nosso Sol são da classe O, brilhando mais de um milhão de vezes do que a estrela do nosso sistema.
O nosso Sol pertence à classe G.Fonte: Wikimedia Commons/Reprodução
Estrelas OB duram relativamente pouco tempo – apenas alguns milhões de anos. A Via Láctea tem cerca de 400 bilhões de estrelas; estrelas azuis são apenas 200 mil, queimando a mais de 30 mil graus centígrados. Por conta de sua grande massa, elas terminam em violentas explosões de supernovas, resultando em buracos negros ou estrelas de nêutrons.
“Sua juventude indica que não podem ter mudado muito sua posição na galáxia. Quase sempre as encontramos perto das regiões de formação estelar, onde a galáxia está ativa. Estrelas azuis são responsáveis pela criação de muitos elementos pesados; por causa delas a geoquímica do nosso planeta era complexa o suficiente para que a vida surgisse”, explicou González.
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O Alma Luminous Stars (ALS) é o maior catálogo existente de estrelas OB na nossa galáxia, elaborado nos últimos 20 anos com os dados do Atacama Large Millimiter/submillimeter Array (Alma).
Ao cruzarem as informações de cada uma das 20 mil estrelas do ALS com as atualizações obtidas pelo Gaia, os pesquisadores conseguiram descobrir uma estrutura de dez mil anos-luz (“esporão” é o nome que designa esse tipo de estrutura; Cefeu é a constelação onde ele se localiza).
Para localizar as estrelas, é usada a paralaxe estelar: a cada dia, é determinada a posição da estrela enquanto a Terra continua seu caminho pelo espaço. Foi então que os pesquisadores notaram estrelas para além da região do esporão – até então, uma área dada como vazia. Isso mostrou que não se tratava de um grupo aleatório de estrelas e sim, de uma parte do disco da galáxia.
A atualização do ALS permitiu também comprovar a existência das ondulações do disco galáctico. Segundo o astrônomo e coautor do estudo Jesús Maíz Apellániz, “recentemente foi proposta a existência de um fenômeno chamado de onda de Radcliffe, uma oscilação na distribuição das estrelas jovens ao nosso redor. Antes, se pensava que ela ocorresse em apenas uma dimensão; agora sabemos que ela se estende por duas dimensões”, diz ele.
Apellániz explica que “o esporão de Cefeus é a crista dessa onda, enquanto que o vale é formado por outras regiões formadoras de estrelas, como as nebulosas Roseta e de Órion. O plano galáctico tem rugas tal como um tecido; provavelmente, elas são relíquias da evolução da Via Láctea, talvez ecos de colisões com outras galáxias há bilhões de anos".
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