Um estudo publicado pela Nature Communications na última terça-feira (23) revela que o calor acentuado de uma região até então pouco analisada do globo está fazendo com que correntes de gelo fluam mais rápido em comparação ao comportamento que apresentavam antigamente, virando "de cabeça para baixo" conceitos de ritmos glaciais e gerando consequências preocupantes.
Segundo os autores, dados de satélites a respeito da plataforma Getz capturados por 25 anos indicam que ela foi responsável por pouco mais de 10% da contribuição total da Antártica para o aumento do nível do mar desde o início da década de 1990.
Entre 1994 e 2018, por exemplo, a velocidade das 14 geleiras pesquisadas aumentou em média quase 23%; a de três delas ficou 44% superior, e a de um exemplar ultrapassou 59% do padrão verificado há duas décadas. Além disso, 315 gigatoneladas de gelo – o suficiente para encher 126 milhões de piscinas olímpicas – foram perdidas no período.
Entre 2000 e 2009, 5,8 gigatoneladas derreteram por ano. Já entre 2010 e 2018, a taxa disparou para 24,8 gigatoneladas – o que sugere que o processo tem adquirido proporções ainda maiores com o passar do tempo.
Cubos posicionados sobre Manhattan representam o gelo perdido ao longo do tempo na região de Getz.Fonte: Reprodução
De acordo com Heather Selley, autora principal do artigo, cientistas observam as alterações há um bom tempo. Ainda assim, questionavam se eram decorrentes de eventos atmosféricos, como menos neve ou derretimento do gelo superficial, ou se estavam relacionadas à velocidade do gelo, impulsionado pela água mais quente do oceano, o que reduz o material flutuante.
Com a nova abordagem apresentada, a associação do fenômeno ao aquecimento oceânico foi, de fato, confirmada.
Ainda segundo a especialista, apenas mapas detalhados de onde as mudanças ocorrem são capazes de demonstrar os processos físicos que as impulsionam, algo conquistado pela equipe. A pesquisa, ressalta, é primeira "a mostrar que a região está se acelerando em longas escalas de tempo multidecadais."
Pesquisa sobre lugar remoto na Antártica explica como mudanças ocorrem.Fonte: Reprodução
Retrocesso imparável
Apesar de situada em uma área de grande importância científica, Getz é tão remota que humano algum chegou até lá. "Em comparação com centenas de estudos nas geleiras do mar de Amundsen [também no oceano Antártico], há somente alguns relacionados à região sobre a qual nos debruçamos", observa Selley, que complementa: "A aceleração percentual é comparável à mensurada nos locais mais conhecidos."
Heather se refere aos glaciares Pine Island e Thwaites, que estão entre os mais ameaçados da Antártica. David Holland, glaciologista da Universidade de Nova York, após pesquisa realizada no ano passado na segunda delas, disse em um comunicado à imprensa que observações diretas da água do mar quente fluindo por baixo da plataforma "sugerem que [ela] pode estar passando por um retrocesso imparável."
Por fim, as novas descobertas na região de Getz adicionam outra camada de preocupação, e cientistas alertam que desvendarmos o comportamento do gelo está se tornando cada vez mais crucial para ficarmos cientes de quanto aumento do nível do mar podemos enfrentar. A título de curiosidade, sabe-se que, se depositadas no oceano, as geleiras Thwaites e Pine Island podem empurrar os mares 3,1 metros ou mais para cima.
Glaciar de Thwaites também demanda atenção.Fonte: Reprodução
Prestar mais atenção em como áreas pouco estudadas como Getz estão se saindo será importante para a preparação para o futuro. "Se não entendermos por que as mudanças estão ocorrendo, não podemos modelá-las com precisão. Isso, por sua vez, mostra nossa incapacidade de prevermos com segurança a perda futura de gelo e a contribuição da Antártica ao nível do mar", finaliza Selley.
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