Em novembro de 2020, milhões de visons criados em cativeiro para a indústria de peles europeia foram abatidos quando o novo coronavírus foi detectado entre eles. O alerta fez fabricantes americanas de medicamentos veterinários começarem a pesquisar vacinas para animal, mas um grupo de cientistas já havia desenvolvido uma e inoculado em um parente dos visons à beira da extinção: as doninhas-de-patas-pretas.
Foram vacinados os animais abrigados no Centro Nacional para Conservação de Furões-de-Pés-Pretos (NBFCC), no Colorado (EUA). Mesmo que o país não tenha detectado um único caso nas fazendas de criação de martas, a descoberta do vírus em um vison selvagem em Utah acendeu o alerta entre os conservacionistas.
Em meados de março, 18 furões (todos machos e com um ano de idade) receberam a primeira dose da vacina; a segunda dose, de reforço, foi administrada poucas semanas depois. Os cientistas esperaram um mês para testar o sangue dos animais, comemorando a descoberta de anticorpos.
O programa de vacinação se expandiu em meados de setembro, quando 120 dos 180 furões alojados no centro receberam a dose (os 60 animais restantes não foram imunizados por precaução, já que o tempo de vida dessa espécie é de 4 a 6 anos em cativeiro).
Todos parentes
Segundo a microbióloga Tonie Rocke, pesquisadora do Centro Nacional de Saúde de Vida Selvagem, “até agora, a vacina parece segura, mas ainda não há dados que mostrem se ela protege mesmo os animais contra a doença. Não temos ideia se isso realmente vai funcionar”.
O problema maior, segundo ela, está nos próprios animais. Além de serem de uma espécie próxima dos visons, são geneticamente muito semelhantes, já que descendem de um pequeno grupo que passou a se reproduzir em cativeiro, o que enfraquece seu sistema imunológico: se um é vulnerável, é quase certo que todos serão.
“Não temos evidências diretas de que os furões-de-pés-pretos sejam suscetíveis à covid-19, mas não gostaríamos de descobrir”, disse a pesquisadora, que começou a trabalhar na vacina em meados de março.
Em 1979, a espécie foi declarada extinta, até que uma pequena população escondida nas proximidades de uma fazenda no Wyoming ajudou na recuperação da linhagem: esses 18 animais deram início a um programa de reprodução em cativeiro.
Dependência
Antes abundante nos EUA, essa espécie nativa declinou rapidamente quando fazendeiros começaram a dizimar sua principal fonte de alimento, o cão-da-pradaria, eliminado como uma praga para a agricultura.
Hoje, existem 300 furões em cativeiro e 400 já reintroduzidos na natureza. Outros fatores, como a peste silvestre (uma variante da peste bubônica), ajudaram a extinguir o animal. Em 2006, já havia mais de 1.500 furões reintroduzidos, mas em 2016 a doença se espalhou pela população de cães-da-pradaria, matando esses animais e fazendo despencar o número de furões para 300.
A peste silvestre, segundo os pesquisadores, é muito difícil de combater. Por isso, pastilhas de vacina com sabor de manteiga de amendoim foram espalhadas por milhares de hectares, na tentativa de imunizar o maior número possível de cães-da-pradaria.
O salto de vírus de uma espécie para a outra não se restringe àquelas próximas. Segundo o virologista do Instituto de Pesquisas para Doenças Infecciosas Corey Casper, “no caso de vírus respiratórios altamente contagiosos, é importante estar atento ao reservatório animal. Se o vírus contaminar um animal, sofrer uma mutação e pular novamente para o ser humano, podemos não ter mais nenhuma imunidade”.
Categorias