Há muito já se sabe que as mudanças climáticas estão afetando o comportamento dos animais no planeta – seja nos padrões de migração ou nas temporadas de acasalamento. Um estudo publicado na revista Current Biology mostrou que as flores também tiveram alterações por causa da degradação do meio ambiente nos últimos 75 anos – e isso pode ter consequências funestas.
Invisíveis ao olho humano, os pigmentos para absorção da radiação ultravioleta das flores é o que se poderia chamar de filtro solar vegetal: quanto mais desse tipo de pigmento a flor produz, menos efeito a radiação prejudicial tem sobre as pétalas e, principalmente, o pólen. Não podemos ver esses pigmentos, mas os animais polinizadores, sim.
O botânico Matthew Koski, da Universidade Clemson, e os coautores do estudo — o geógrafo Drew MacQueen, da Universidade da Virginia, e a ecologista evolucionária Tia-Lynn Ashman, da Universidade de Pittsburgh — visitaram herbários da Europa, da Austrália e da América do Norte para obter um histórico de espécimes de flores desde 1941. Os dados coletados permitiram mensurar as mudanças na pigmentação das flores, responsável pela absorção da radiação ultravioleta, ao longo do tempo.
Ação do ser humano
Em um trabalho anterior, os três haviam examinado flores expostas a mais radiação ultravioleta, como em montanhas altas e perto da linha do Equador, e chegado à conclusão de que todas apresentavam mais pigmento ultravioleta em suas pétalas. A questão que norteou esse novo trabalho foi se dois dos piores danos causados pela atividade humana também entrariam nessa equação: a diminuição da camada de ozônio e o aumento global da temperatura.
Foram examinadas 1.238 flores de 42 espécies diferentes. Além disso, os três fotografaram pétalas de flores da mesma espécie coletadas em momentos e locais diferentes, usando uma câmera sensível ao UV. Então, eles compararam os resultados da análise das flores com dados sobre a camada de ozônio e a temperatura, descobrindo que a quantidade de pigmentos responsáveis pela absorção de UV nas flores mudou em todo o mundo nos últimos 75 anos – em média, um aumento anual de 2%.
“Algumas espécies aumentaram sua pigmentação ao longo do tempo; em outras, ela diminuiu. Para entender essas respostas diferentes às mudanças no clima global, observamos a quantidade de ozônio e a mudança de temperatura experimentada por cada espécie ao longo do tempo”, disse Koski.
As flores de cinquefoil alpino (à esquerda) colhidas em 1977 (centro) e 1999 (direita) têm padrões de pigmentação ultravioleta visivelmente diferentes.Fonte: Current Biology/Koski et all
Padrão "olho de boi"
O resultado a que eles chegaram mostrou que a pigmentação aumentou para flores cujo pólen foi exposto à crescente radiação por conta da diminuição da camada de ozônio; nas espécies em que o pólen é protegido pelas pétalas, a pigmentação diminuiu com o aumento da temperatura.
Nós não vemos quaisquer diferenças, mas animais polinizadores, como abelhas e beija-flores, percebem a mudança. Segundo Koski, "a maioria dos polinizadores prefere flores com um padrão ‘olho de boi': pétalas com pigmentos que refletem os raios ultravioleta nas pontas e, no centro da flor, pigmentos que absorvem a radiação".
O padrão "olho de boi" é o preferido dos polinizadores.Fonte: ResearchGate/Anna J Schulte et all
“Isso tem implicações para a reprodução das plantas — tanto de flores silvestres nativas quanto de espécies de culturas domesticadas que têm padrões florais para o ultravioleta, como a colza e os girassóis. A coloração floral alterada para o ultravioleta pode mudar e até interromper os padrões de polinização”, diz Koski.
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