Sendo aclamado como um dos blogueiros mais influentes do mundo, o iraniano Hossein Derakhshan ficou seis anos preso por comandar um movimento contra a censura no país. Durante esse período, naturalmente, o ativista ficou sem poder acessar a internet. Ao ser solto em 2014, Derakhshan ficou chocado ao ver no que a web estava se transformando.
“Seis anos é muito tempo para ficar atrás das grades, mas é uma era inteira no mundo online”, desabafou o iraniano em um longo texto em seu blog pessoal. O blogueiro afirma que o que mais lhe assustou na “nova internet” é como as redes sociais estão tomando conta de tudo – especialmente o Facebook, que, na época de sua prisão, só tinha 100 milhões de usuários (contra mais de 1,5 bilhão de hoje em dia).
“Se eu quisesse atrair pessoas para que elas lessem o que eu escrevo, eu teria que usar as mídias sociais. Eu postei o link de um de meus artigos no Facebook. Mas no fim das contas o Facebook não ligou muito para isso. [...] Eu consegui três curtidas. Três! Ficou claro para mim que as coisas haviam mudado. Eu não estava preparado para enfrentar esse novo solo – todo o meu investimento e esforço foram incinerados”, afirma.
As redes sociais tomam conta da internet
De acordo com Derakhshan, blogueiros eram verdadeiros astros do rock em 2008. Mesmo com os esforços do governo iraniano de derrubar o blog em questão, a página do ativista era visualizada por pelo menos 20 mil pessoas diariamente. “Os celulares ainda eram usados para fazer ligações, ler emails e enviar mensagens. Não haviam apps, ou pelo menos não da forma que os conhecemos hoje em dia; não havia Instagram, Snapchat, Viber ou WhatsApp”.
O Facebook tem a web em suas mãos, e passou a usar isso para decidir o que as pessoas veem ou não
Se antes a navegação pela web era baseada no uso de hyperlinks – ligações que representam a natureza aberta e descentralizada da internet –, hoje em dia os conteúdos são filtrados e destacados de acordo com os algoritmos de uma rede social. O Facebook tem a rede mundial de computadores em suas mãos, e passou a usar isso para decidir o que as pessoas veem ou não.
“Um fotógrafo explicou para mim que as imagens enviadas diretamente ao Facebook recebem um número muito maior de curtidas. Por outro lado, quando ele publica um link com a mesma imagem em algum lugar fora do Facebook – como o seu blog abandonado –, ela se torna muito menos visível na rede social, e consequentemente recebe muito menos curtidas”, explica o iraniano.
Derakhshan também critica aplicativos como o Instagram. “Você pode colocar um endereço de um site junto com suas fotos, mas não pode clicá-lo. [...] Aplicativos como o Instagram são cegos; eles não levem a lugar nenhum exceto para dentro deles mesmos, relutantes em transferir seus vastos poderes para outros”. A consequência disso, de acordo com o iraniano, é que a web fundada por Tim-Berners Lee está se tornando cada vez mais trancada e limitada.
Tendência ou submissão?
Em outro ponto de seu texto, o blogueiro afirma ainda que a internet está se transformado em uma espécie de televisão: linear, passiva e programada. “Eu entro no meu Facebook e minha TV pessoal é ligada. Tudo o que eu preciso fazer é rolar a página: novas fotos de perfil de amigos, pequenos trechos de opinião, anúncios e, claro, vídeos que são reproduzidos automaticamente”, comenta. “Às vezes eu até abro um artigo. Mas continuo dentro do Facebook, e ele continua mostrando o que acha que eu gosto.
A internet está se transformado em uma espécie de televisão: linear, passiva e programada
A crítica de Derakhshan diz respeito ao método que a rede social usa para fazer a curadoria de conteúdos que surgem na sua linha do tempo – tudo é automatizado e selecionado com base naquilo que você ou seus amigos interagem. Naturalmente, muita coisa bacana acaba sendo escondida com esse sistema. “O mais brilhante parágrafo de alguma pessoa comum pode ser deixado de lado, enquanto divagações bobas de alguma celebridade ganha popularização”.
Por fim, o escritor reclama ainda da eminente morte do texto e ascensão dos vídeos na internet. Para o ativista, isso deixa os internautas preguiçosos e silencia as minorias. “As pessoas gastam a maior parte de seu tempo assistindo a vídeos do Facebook, Instagram e Snapchat. Há cada vez menos textos para ler. [...] É uma tendência ocasionada por mudanças culturais das pessoas ou nós simplesmente estamos seguindo as novas leis das redes sociais? ”, questiona. Caso queira, o artigo completo de Derakshshan pode ser lido aqui (em inglês).
Fontes