O primeiro console com os primeiros cartuchos, a locadora favorita e até a televisão de tubo que por anos serviu para exibir os jogos — poucas horas por dia, já que a mãe falava que jogar demais estragava a tela. Esse tipo de memória fica guardado no coração de quem passou a infância ou adolescência com video games, e essa história agora existe também em forma de documentário.
O projeto "1983 - O Ano dos Videogames no Brasil" começou como um livro do pesquisador e jogador Marcus Chiado Garrett há cinco anos. Depois de lançar um segundo volume ("1984: A Febre dos Videogames Continua") e uma versão definitiva unindo os anos em um só arquivo, o autor deu um passo ainda maior e transformou a ideia em documentário. Com o mesmo título da primeira obra, ele foi financiado com sucesso no Kickante e de fato saiu do papel em 2017.
A capa do livro "1983+1984", obra revisada e com informações adicionais.
Dirigido por Marcus e Artur Palma com produção da ZeroQuatroMidia, o documentário está disponível no YouTube e deve ser guardado para a posteridade, seja para você relembrar os bons e velhos tempos ou apresentar uma época que não volta mais para as gerações mais novas.
Um Brasil diferente
Até antes do lançamento do livro e agora do filme, a história da chegada dos games ao Brasil era pouco conhecida — e, apesar do título começa anos antes de 1983. Por conta de leis protecionistas da ditadura militar, do mercado inflacionado e até da desconfiança inicial das companhias daqui, os games chegavam por importação, contrabando ou a boa e velha pirataria.
Trechos de jogos clássicos do Atari e suas variantes são exibidos aos montes, e quem cresceu com esses títulos vai sentir os flashbacks chegando.
Leva um tempo até sermos introduzidos aos projetos de marcas como Philco (com o Telejogo em parceria com a Ford), Gradiante/Polyvox (distribuidora oficial do Atari 2600), Phillips (com o Odyssey), Sharp (Intellivision), Splice (do Splice Vision), CCE (do Super Game) e muitas outras.
Mas tem uma ressalva aí: a duração é um pouco longa, passando das duas horas e vinte minutos. Por isso, ver em uma tacada só pode ser pesado — só que a ideia de usar o YouTube ou um arquivo digital elimina essa falha. Tal qual um jogo, é só pausar e continuar no dia seguinte.
Uma das propagandas de lançamento de um novo console no país.
Para ajudar a não cansar o espectador, a edição é bem executada, seguindo a linha cronológica de acontecimentos e passando por temas paralelos variados. Tem papo sobre videolocadoras, a rivalidade entre as fabricantes e até projetos que foram engavetados.
Trechos de jogos clássicos do Atari e suas variantes são exibidos aos montes, e quem cresceu com esses títulos vai sentir os flashbacks chegando. Até a abertura vale ser vista com atenção, misturando locais brasileiros típicos com gráficos 8-bit, quase lembrando o curta-metragem “Pixels”.
Só feras
As entrevistas são ricas em conteúdo, inclusive com executivos e engenheiros que tomaram decisões e começaram a indústria de games no Brasil. Até Nolan Bushnell, cofundador da Atari e que esteve na Brasil Game Show 2017, está no elenco. Jogadores apaixonados e colecionadores veteranos também contribuem com depoimentos carregados de nostalgia, e dá para ver claramente pela empolgação o quanto eles gostam de falar sobre o tema.
Stefano Arnhold, atualmente no comando da Tectoy, era do setor de planejamento da Sharp em 1983.
Já a narração muito bem executada fica por conta de Flávio Dias, veterano na área e que atua inclusive como dublador, sendo a voz de ninguém menos que o protagonista em “O Mundo de Beakman”.
O documentário também vale pelas imagens de arquivo, sendo um verdadeiro túnel do tempo para a década de 1980. Reportagens de televisão, matérias de jornal, fotos e simples menções ao histórico da época recontam a vida nessa “década perdida” que, para os games no Brasil, de perdida não teve nada.
Assim como a recentemente criada Sociedade Histórica de Videogames do Brasil, o documentário "1983 - O Ano dos Videogames no Brasil" é um projeto de resgate, memória e, acima de tudo, conhecimento sobre o país. Quem não faz ideia de como era viver em uma época sem celular e internet vai se surpreender, e quem vibrou quando abriu um presente de Natal em dezembro daquele ano e se deparou com um Atari terá ótimas lembranças.
O documentário completo pode ser conferido neste link.
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