Velocidade e conforto cobrindo grandes distâncias (Fonte da imagem: Reprodução/China Car Times)
Quando precisamos fazer alguma viagem um pouco mais longa, quase sempre há aquela reflexão sobre qual meio de transporte será utilizado. Ir de carro ou de ônibus é, na maioria das vezes, a opção escolhida, mesmo que seja mais demorada e traga estatísticas comprovando que estas são as alternativas menos seguras.
Há também a opção de ir de avião, contudo, os atrasos, as grandes distâncias entre o centro das cidades e os aeroportos e o fato de você ficar incomunicável durante as viagens podem pesar bastante – principalmente para aqueles que voam a negócios.
Mas e que tal viajar de trem? Apesar de o modal praticamente não ser utilizado no Brasil, na Europa e na Ásia, cada vez mais os países vêm adotando esse tipo de transporte. E nesse sentido o destaque fica por conta da China, que recentemente construiu a maior e mais moderna linha de trens-bala do planeta.
Conheça agora um pouco sobre a China Railways e o CRH380A: o trem-bala sobre rodas mais rápido do mundo.
Ligando o país de forma rápida e inteligente
A China tem experimentado na última década um ritmo de crescimento extremamente acelerado. A economia do país vem conseguindo superar com força as últimas crises mundiais – e a nação já rivaliza com os Estados Unidos pelo posto de maior economia do planeta.
Região mais populosa do país (Fonte da imagem: Reprodução/Railway Technology)
Além disso, estamos falando do país mais populoso do mundo, com cerca de 1,3 bilhão de habitantes. Estes se encontram espalhados em uma área de 9.640.821 quilômetros quadrados – a terceira maior nação do mundo em espaço territorial. Com tanta gente e toda essa área, o que é possível fazer para ligar tudo de maneira eficiente?
Há muitos anos o país já vinha construindo e utilizando as linhas férreas para facilitar o transporte de cargas e da população entre as cidades. Percebendo que essa é uma saída inteligente, o governo começou a intensificar os investimentos no desenvolvimento da malha ferroviária do país, principalmente em um novo tipo de linha: a ferrovia de alta velocidade, chamada no país de China High Speed Rail Network.
Com o projeto em execução desde 2008, a primeira linha a ser colocada em operação foi a Jinghu High-Speed Railway, em 2010. Ela passa por uma das regiões mais importantes da China, pois, além de ligar as duas maiores cidades da nação, Beijing e Shanghai, ela acaba cobrindo um quarto da população total do país– cerca de 330 milhões de pessoas.
O século XXI anda sobre trilhos
Antes de falarmos sobre as maravilhas do trem CRH380A, primeiro é preciso conhecer por onde ele passa. Não estamos falando somente das paisagens e grandes cidades, mas sim do trajeto em si – os trilhos. E acredite: eles merecem destaque.
Construção de parte da linha (Fonte da imagem: Reprodução/TCJL)
Para a implantação da nova ferrovia de alta velocidade, o país precisou substituir as linhas pré-existentes, pois algumas já tinham mais de 100 anos de utilização. Além disso, esses trilhos também não seriam capazes de suportar a velocidade atingida pelos novos trens. Por isso, a solução encontrada pelos chineses foi drástica: construir uma nova linha com aproximadamente 1.320 quilômetros de distância – e fazer isso implantando muita tecnologia.
Tudo começa na maneira como o trecho foi montado. Pelo fato de a Jinghu High-Speed Railway cortar campos de criação de animais, enormes plantações e muitas montanhas, os engenheiros resolveram desenvolver boa parte do trajeto utilizando pontes, viadutos e túneis. Ao todo, cerca de 85% do caminho é elevado.
Dessa forma, o trajeto inclui nada menos do que 244 pontes e 22 túneis. E não é só isso. As duas maiores pontes do mundo fazem parte da linha: a Danyang–Kunshan Grand Bridge, maior ponte do planeta, com 164 quilômetros, e a Tianjin Grand Bridge, segunda maior, com cerca de 114 quilômetros de comprimento.
Além de contar com um caminho quase totalmente elevado, um novo tipo de trilho foi desenvolvido para que os trens de alta velocidade possam circular. Assim, ao contrário daquele modelo que você conhece, com tábuas de madeira e pedrinhas sustentando os trilhos, aqui foi utilizada uma nova forma de construção.
Colocação final dos trilhos (Fonte da imagem: Reprodução/China Train Trip)
Para suportar toda a pressão dos trens, os engenheiros chineses inventaram um caminho composto por gigantescos blocos de cimento e metal. O processo é incrível. Primeiro, foram criados grandes blocos de malha de aço. Depois, foram adicionados, também, cabos de aço esticados, cruzando toda essa estrutura de um lado para o outro.
Essa estrutura-base faz com que estas placas tenham uma força de 500 toneladas, algo que as mantém firmes e sem sofrer nenhum deslocamento ou deformação. Em seguida, os blocos receberam toneladas de cimento para ganhar corpo. Por fim, os painéis ganharam uma modelagem por meio de cortes a laser, algo que fez dos trilhos desta linha os mais lisos, resistentes e precisos de todo o planeta.
Mais de 450 mil blocos foram utilizados na construção da linha. Para atender a demanda, o governo chinês instalou fábricas ao longo do caminho, conseguindo, assim, abastecer a obra de forma rápida e mais eficiente.
O trem sobre rodas mais rápido do planeta
Com uma linha tão espetacular, o trem também precisa ser impressionante. Para o projeto, engenheiros de todas as partes criaram 20 ideias diferentes. Após meses de estudo, o modelo CRH380A foi o escolhido. E podemos dizer que a eleição foi justa.
O destaque do veículo se dá já à primeira vista: sua frente rebaixada traz a modelagem aerodinâmica mais adequada para a velocidade média pretendida: 380 quilômetros por hora. Isso, sem prejudicar a visibilidade do condutor – que precisa ficar atento a todos os detalhes do caminho.
Falando em visibilidade, um dos primeiros fatores a serem desenvolvidos para o CRH380A foi o seu para-brisa frontal. Técnicos do país precisaram desenvolver um novo tipo de vidro super-resistente, capaz de suportar impactos em altas velocidades. A principal preocupação dos especialistas durante o processo foi criar algo que pudesse resistir ao impacto de pássaros que possam surgir pelo caminho.
O que eles criaram foi um verdadeiro sanduíche de vidro, utilizando várias camadas do material e uma parte central diferenciada, uma espécie de "recheio" feito de resina. Dessa forma, o trem ganhou um para-brisa extremamente forte – e que pode proteger o condutor no caso de algum possível impacto.
Corpo em forma
A construção do trem também merece destaque. Além de o carro principal contar com uma ponta que lembra muito a frente de um ônibus espacial, o formato dos vagões traz linhas que dão continuidade ao design da "cabeça" do trem.
Isso é fundamental, pois, quando o trem está em alta velocidade, como os pretendidos 380 quilômetros por hora, ele encontra pela frente um ar extremamente comprimido, cuja resistência é capaz de criar “muros invisíveis” no caminho do veículo.
Corpo capaz de furar qualquer tipo de barreira (Fonte da imagem: Reprodução/Xinhua News)
Por isso, tudo foi estudado para que o trem seja capaz de romper esse tipo de obstáculo. Até mesmo as interseções entre os vagões contam com uma espécie de vedação capaz de manter a velocidade do trem inabalada.
Para aguentar toda essa pressão, o corpo do CRH380A também foi construído de maneira diferenciada. O trem precisava ser leve e eficiente em termos energéticos, além de ser capaz de atingir altas velocidades e furar o bloqueio imposto pela resistência do ar.
Por isso, a solução encontrada foi inovadora: utilizar uma estrutura oca nas paredes do veículo. Ou seja: em vez de mais aço, os engenheiros desenvolveram uma maneira de fazer tudo com menos metal – mas com muito mais resistência, cruzando faixas de aço parecidas com aquele quadriculado do seu antigo caderno de matemática.
Há ainda outro fator aerodinâmico essencial para o sucesso do CRH380A. Como ele atinge velocidades superiores à dos aviões quando estão decolando, algo precisou ser feito para garantir que ele e os seus vagões fiquem em contato constante com o chão.
Vista do condutor (Fonte da imagem: Reprodução/TownHall)
Por isso, o veículo conta com saias laterais dos dois lados. Elas o deixam com um corpo bem mais largo do que aquele visto em um trem comum. A principal função deste recurso é trabalhar como asas invertidas, ou seja, elas funcionam “empurrando” o trem para baixo, em vez de fazer como as encontradas nos aviões, que ajudam as aeronaves na hora de decolar.
Ainda sobre rodas
Como estamos falando de um trem que, apesar de supermoderno, anda sobre rodas, precisamos destacar que elas também ganharam melhorias tecnológicas. Os trucks (espécie de chassis que seguram as rodas do trem) foram desenvolvidos para conseguir vencer as curvas do caminho sem causar nenhum acidente.
Além disso, a sua vibração é extremamente reduzida, tudo para que o trem balance o menos possível – e para que a dissonância também seja controlada, algo extremamente importante para a segurança do veículo e de toda a composição.
Isso porque a frequência em que vibram o trem, os trilhos e os trucks precisa ser perfeita, algo como uma verdadeira orquestra. Todos precisam estar em equilíbrio, caso contrário, isso pode causar uma pressão tão grande que chegaria a fazer o trem descarrilar.
Na parte inferior do trem ainda existem alguns outros dispositivos de segurança. Nas rodas, por exemplo, há sensores de velocidade que ajudam o condutor no controle exato do veículo. Além disso, embaixo dos vagões, há também uma espécie de computador de bordo, que controla a distância do veículo com relação aos trens que estão atrás ou à frente durante o trajeto.
Final da linha de produção de alguns novos trens (Fonte da imagem: Reprodução/China.org)
Esse sistema de gerenciamento também auxilia na hora de se calcular a frenagem até uma possível parada. Isso porque tal ação não pode ser feita de maneira brusca e o veículo precisa de quase seis quilômetros para conseguir parar totalmente.
Potência elétrica
O CRH380A conta com motor elétrico; por isso, uma rede de abastecimento fornece energia para os veículos durante todo o trajeto. Para levar os passageiros de um lugar ao outro, o trem dispõe de 12.900 cavalos de potência. Isso em seu primeiro modelo, que está em atividade desde 2010.
Atualmente, já existem alguns veículos com motor ainda mais forte. O chamado CRH380AL, por exemplo, apesar de andar nos mesmos 380 quilômetros por hora, traz nada menos do que 27.400 cavalos – mais do que o dobro da potência do seu antecessor. Em testes, este veículo passou dos 480 quilômetros por hora, contudo, a ideia é apenas conseguir alocar mais vagões e realizar viagens com ainda mais passageiros.
Conforto acima de tudo
Quem viaja em um CRH380A não tem do que reclamar. O trem leva, em média, mil passageiros por viagem e conta com três categorias diferentes: Classe A, Classe B e Classe Executiva. Na primeira, quem escolhe gastar um pouco mais tem direito a poltronas exclusivas e em cabines fechadas.
Já na Classe B, os passageiros encontram vagões que trazem uma disposição muito semelhante àquela vista nos aviões, com fileiras de dois ou três assentos – todos muito confortáveis e com tomadas disponíveis para que os passageiros conectem os seus gadgets.
Por fim, a Classe Executiva traz o máximo de comodidade para quem está viajando a trabalho e não pode ficar parado. A poltrona é individual e conta com mesa para facilitar o uso de um notebook ou para se realizar uma refeição. Além disso, há também uma televisão com touchscreen e acesso à internet. Já os executivos que queiram viajar descansando podem utilizar os controles do assento para transformá-lo em uma cama pronta para um belo cochilo.
Valeu a pena o investimento?
Ao todo, o governo chinês gastou 32 bilhões de dólares no desenvolvimento do projeto, incluindo os novos trens e a primeira linha, ligando Beijing e Shanghai. O trabalho começou no início de 2008 e, no final de 2010, o novo trajeto já estava em funcionamento.
No trajeto há 23 estações, que ajudam no desenvolvimento da região mais populosa do país. Apesar do alto investimento, estima-se que o país ganha cerca de 10 milhões de dólares por minuto "economizado" no novo trajeto. Atualmente, cerca de 10 mil pessoas embarcam nestes trens diariamente.
A viagem, que antes levava entre 10 e 14 horas (dependendo do movimento e da condição das linhas), atualmente pode ser feita em menos de 5 horas, isso com muito mais conforto e segurança.
Fonte: Railway Technology, Beijing Today, Tol, Folha de São Paulo, YouTube, China Righlights, Dear Passengers, Top China Travel, TownHall, China.org, Xinhua News, China Train Trip, TCJL e Railway Technology
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