(Fonte da imagem: Reprodução/Wikimedia)
No mundo da tecnologia tudo passa muito rápido, e quem não consegue se reinventar acaba, invariavelmente, ficando para trás. Não importa o tamanho da empresa: o público pode mudar de opinião de uma hora para outra e quem não estiver preparado para se antecipar a esse movimento corre o risco de cair.
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Já vimos isso acontecer recentemente com empresas grandes como a Kodak, Nokia e BlackBerry: a primeira não acreditou na revolução das câmeras digitais e, quando tentou recuperar o tempo perdido, viu que era tarde. A segunda não chegou a quebrar, mas perdeu a liderança e viu a sua participação no mercado de smartphones diminuir consideravelmente. A palavra “BlackBerry” era sinônimo de smartphones antes do iPhone. Entretanto, ela demorou a reagir e hoje luta para sobreviver.
Apple e Microsoft possuem quase a mesma idade. Ambas as empresas surgiram em meados da década de 1970 e, no início de suas trajetórias, competiam com ferocidade. Parte desse início tumultuado pode ser visto no filme “Piratas do Vale do Silício”, que mostra como Bill Gates e Steve Jobs moldaram o mundo da tecnologia.
Hoje, a situação não é ruim para as empresas, longe disso. O lucro de ambas vem superando as expectativas e, no caso da Apple, batendo recordes. Entretanto, alguns problemas estruturais podem acabar minando o sucesso das duas companhias a médio e longo prazo.
Windows 8: crise de identidade
O Windows 8 chegou ao mercado prometendo uma revolução. O sistema seria o responsável por integrar todas as plataformas da empresa: smartphones, tablets e PCs. Para isso, ele chegou com duas interfaces distintas: o desktop tradicional e a nova interface de tiles (antes chamada “Metro”), que foi desenvolvida especialmente para telas de toque. O botão Iniciar, a principal característica do sistema desde o lançamento do Windows 95, desapareceu, deixando o desktop um pouco “refém” da nova interface.
(Fonte da imagem: Baixaki/Tecmundo)
Isso acabou causando certa confusão nos usuários, pois muitos aplicativos possuem duas versões, uma para a nova interface e outra para a o desktop tradicional. O problema é que para acessar os aplicativos não tem outro jeito, é preciso procurar por eles dentro da Tela Iniciar em vez de no tradicional botão Iniciar.
Tanto que o público exigiu a volta dele, que acabou chegando com a atualização 8.1. Contudo, ele serve apenas para levar o usuário à nova interface, o que continua deixando o Windows 8 com crise de identidade.
Para tentar amenizar um pouco essa situação, a Microsoft pode estar preparando uma atualização para o Windows 8.1 que tem por objetivo “mesclar” as duas interfaces, tudo para ganhar mais aceitação do público. Nós comentamos sobre essa e sobre outras aguardadas mudanças para o Windows 9 neste artigo.
Para piorar a situação, o Windows 7 aumentou a participação de mercado sobre o 8 nos últimos meses — resposta do público que não está muito satisfeito com o sistema novo. Um sinal de que isso está mesmo acontecendo é a recente manobra da HP: a montadora, que é uma das maiores do mundo, voltou a vender máquinas com Windows 7, segundo ela por “demanda popular”.
Complicando um pouco mais: os próprios funcionários da Microsoft estão chamando o Windows de “o novo Vista”. Não que o Windows 8 tenha os mesmos problemas do Vista, pois a comparação é feita em termos de aceitação do público.
Mercado de PCs em declínio
O mercado de PCs certamente já viu dias melhores, e isso é culpa do crescimento dos dispositivos móveis. O desenvolvimento dos smartphones e tablets substituiu boa parte das tarefas que antes eram executadas pelos computadores pessoais. Com isso, consequentemente, a Microsoft vem perdendo mercado, já que o Windows é responsável por mais de 90% dos desktops no mundo todo.
A empresa também demorou para entrar no barco dos portáteis. Quando o Windows Phone chegou ao mercado, o iOS já havia dominado completamente o setor, e o Android estava a caminho de assumir a liderança, fazendo com que o SO móvel da companhia acabasse ficando na lanterna por um bom tempo, tanto em número de aplicativos quanto em número de aparelhos disponíveis.
(Fonte da imagem: Divulgação/HP)
A situação dos PCs certamente não vai se reverter, muito pelo contrário: tudo indica que o declínio do setor seja cada vez mais acentuado antes de se estabilizar. Deste modo, para manter a liderança no mercado de sistemas operacionais, a Microsoft precisa tornar o Windows Phone muito mais relevante do que ele é atualmente.
Um estudo publicado pela Gartner sugere que a tendência é o crescimento cada vez maior do número de dispositivos móveis, graças aos preços baixos e à evolução desses equipamentos que já substituíram grande parte das funções executadas antes por um PC. Segundo o estudo, até 2017 a participação de mercado da Microsoft no ramo dos sistemas operacionais será a mesma da Apple, mas ambas estarão com quase três vezes menos mercado que o Android.
Sistemas móveis: Android tem a maioria esmagadora
Por mais que o iOS tenha inovado e trazido o mundo para uma nova era de smartphones, é inegável que o sistema da Apple possa ser considerado “datado” atualmente.
Ele não trouxe mudanças fundamentais em sua estrutura desde que foi lançado, em 2007. A maior transformação ocorreu ano passado, com o lançamento do iOS 7. O sistema ganhou um novo visual, mas continuou um pouco mais “amarrado” que o Android em diversos aspectos.
A falta de smartphones com telas maiores também é um fator que certamente ajudou a empresa da Maçã a perder boa parte de sua participação de mercado. Mesmo que tenha vendido mais iPhones no último ano fiscal, a empresa se viu ameaçada até mesmo pelo Windows Phone, que teve um crescimento exponencial no último ano fiscal, dobrando a sua participação de mercado e superando a Apple em algumas partes do mundo.
(Fonte da imagem: Baixaki/Tecmundo)
O crescimento do Windows Phone é importante para a Microsoft, mas não é suficiente para superar a força esmagadora do Android, que também cresceu e chegou a mais de 81% de dominação no mundo (no mercado de tablets e smartphones), e um número como esse não pode ser ignorado.
Um fato curioso: mais de 90% da parcela de marcas com Windows Phone, inclusive, é representada pela Nokia, pois outras montadoras continuam preferindo o Android. A Microsoft até que tenta: recentemente ela teria dado um “incentivo” à Sony de US$ 500 milhões para que a empresa trabalhasse com o Windows Phone. A Microsoft também teria oferecido dinheiro à Samsung (US$ 600 milhões) e à Huawei (US$ 1,2 bilhão). Tudo isso para tentar fazer a sua plataforma móvel emplacar.
Isso não significa necessariamente que iOS e Windows Phone são irrelevantes, mas indica que o papel dos dois sistemas deve ter cada vez menos importância no mercado, já que a maioria dos fabricantes prefere o Android. Mesmo que todos os sistemas sejam basicamente iguais em termos de funcionalidade e desempenho, o crescimento do sistema da Google tende a ser cada vez mais acentuado.
Veja na imagem a distribuição de mercado dos sistemas operacionais no mundo.
Dados: IDC
Será que a Apple perdeu mesmo o poder de inovar?
O último produto de grande destaque lançado pela Apple foi o iPad, em 2010. Depois disso, apenas upgrades de produtos já existentes chegaram ao mercado. É como se a empresa tivesse ficado com um pouco de medo de inovar e tivesse adotado a estratégia “em time que está ganhando não se mexe”.
Isso pode ser entendido, em parte, porque o iPhone é a atual galinha dos ovos de ouro da Apple. A empresa não muda muito a receita, mas todos os anos lança upgrades importantes nos aparelhos. Foi assim com o sistema operacional, foi assim com a tela Retina e provavelmente será assim como o sensor de impressões digitais lançado com o iPhone 5S.
(Fonte da imagem: Divulgação/Apple)
Curiosamente, o problema da Apple não é falta de inovação, mas sim ter inovado demais no passado, o que acabou “acostumando mal” o público, que não vê nas pequenas novidades apresentadas pela empresa algo grande o suficiente para carregar a marca da Apple.
Além disso, justamente por funcionar tão bem é que a estratégia da Apple acabou colocando a empresa em um script pré-determinado que pode ser visto até mesmo nas apresentações. Se há alguns anos a euforia antes de um evento da Apple era grande, agora sabemos o roteiro de cor e salteado: Tim Cook sobe ao palco, conta como a empresa faturou no último trimestre e o quanto os desenvolvedores lucraram, até que um vídeo melodramático apresente um novo produto. E isso, aos poucos, está ficando chato e cansativo, consequentemente apagando parte do brilho da Maçã.
Enquanto isso, a Samsung lança dispositivos de todos os tipos, modelos e tamanhos, praticamente inundando o mercado com aparelhos de todos os tipos. Pode parecer exagerado, mas isso garantiu a ela mais de 40% de participação dentro dos 81% que o Android possui.
A Apple sem Steve Jobs e a Microsoft sem Bill Gates
Por mais que Tim Cook seja incrivelmente competente, é indiscutível que a Apple era uma empresa mais significativa nas mãos de Steve Jobs. Isso já foi provado uma vez, quando Jobs foi gentilmente convidado a se retirar da liderança da empresa em meados dos anos de 1980. Depois que isso aconteceu, a Apple se tornou uma empresa comum, até que o fundador retornasse em 1997 para colocar a empresa — já à beira da falência — nos trilhos novamente.
Agora, infelizmente, isso não é mais possível, e o mercado já percebeu a falta que o “criador” faz lá dentro. Apesar de continuar bastante lucrativa e ter a taxa de clientes mais satisfeitos do mercado, a falta de produtos realmente impactantes pode estar levando a empresa para uma segunda posição no mercado de tecnologia, e esse tipo de situação pode acabar tornando-se irreversível a longo prazo.
(Fonte da imagem: Reprodução/Wikimedia)
Outro problema é o efeito que Steve Jobs causava na Apple e no mercado. Mesmo que nos últimos tempos ele só estivesse lá de corpo presente, a sua presença inspirava uma espécie de “magia” no mercado, afinal de contas, Jobs sempre foi a cara da Apple.
Agora que ele se foi, não faltam especialistas de mercado para determinar o fim da empresa, mesmo que ela apresente lucros impressionantes. Suas previsões não são baseadas nos relatórios financeiros, e sim no efeito que a falta de Steve Jobs causa na empresa. Ou seja, o maior defeito de Tim Cook é não ser Steve Jobs e, mesmo que isso não faça muito sentido, já está se refletindo no mercado e no que ele espera da Apple.
Já na Microsoft, o problema é a escolha do novo CEO. Steve Ballmer está deixando a cadeira, e o novo líder acabou de ser escolhido: Satya Nadella. Além disso, o próprio Bill Gates deve voltar para a companhia, como uma “figura-símbolo” dentro da Microsoft e auxiliando o novo CEO nos primeiros passos.
Nessa situação, ele seria responsável por utilizar a sua influência na indústria para trazer mais negócios para a empresa. Afinal de contas, ele sempre foi a cara da Microsoft, e ter uma figura que foi recentemente considerada uma das personalidades mais admiradas do mundo certamente faria bem à empresa.
(Fonte da imagem: Reprodução/Wikimedia)
Contudo, a presença de Bill Gates (e talvez de Steve Ballmer) pode justamente ser o problema que afetou a escolha de um novo CEO. Segundo uma reportagem do The Wall Street Journal, poucos executivos têm a disposição de assumir a posição de CEO com dois antigos CEOs no quadro diretor da companhia.
Steve Ballmer tomou algumas atitudes controversas nos últimos meses — como a compra da Nokia, por US$ 7,4 bilhões —, o que acabou gerando opiniões divergentes na diretoria da Microsoft.
Vamos imaginar o seguinte cenário: o novo CEO chega na empresa e possui ideias diferentes de Ballmer, decidindo, inclusive, encerrar alguns projetos iniciados por ele. Se Ballmer estiver no quadro de diretores, pode acabar causando um certo desconforto ao novo CEO; o bom e velho “climão”, algo que não seria muito bom para a companhia e certamente menos ainda para os acionistas.
O papel do novo CEO é justamente fazer a diferença dentro da empresa, que durante a era Ballmer transformou o Windows e o Office em verdadeiras máquinas de dinheiro, mas enterrou o poder de inovação da companhia — uma força que era proeminente até o final dos anos 1990.
Segundo um porta-voz da empresa, a falta de inovação lá dentro é, em parte, causada pela má comunicação entre as diferentes divisões da Microsoft. Alguns funcionários da empresa, temendo por seus empregos, dizem que estão receosos de trabalhar em uma nova tecnologia que pode não sair do papel.
Satya Nadella tem uma tarefa difícil pela frente. (Fonte da imagem: Divulgação/Microsoft)
Essa cultura fez com que, aos poucos, as pessoas parassem de se arriscar lá dentro, e isso afetou toda a estrutura organizacional da Microsoft. Felizmente isso começou a mudar recentemente, devido a uma reorganização proposta por Steve Ballmer. Com a saída do executivo, essas mudanças devem ficar a cargo do novo CEO, Satya Nadella, que tem a tarefa de levar a Microsoft novamente para a inovação.
Apple fora dos automóveis?
A CES 2014 nos mostrou algo muito importante: a partir de agora, os veículos inteligentes devem ser o foco das empresas de tecnologia, e muitas delas já aproveitaram o evento para trazer novidades nesse setor.
A Google não participou do evento, mas aproveitou a data para anunciar a Open Automotive Alliance, uma organização que reúne empresas como Google, NVIDIA, Audi, General Motors, Honda e Hyundai. A ideia por trás disso é levar o Android até os automóveis, fazendo com que eles se tornem verdadeiramente inteligentes e conectados.
A Apple não é nova nesse mercado, pois a companhia já investiu em tecnologias automotivas e possui uma estratégia similar à da Google.A diferença é que, nos planos da Maçã, os veículos precisam ser pareados com dispositivos iOS externos para ter suas funções inteligentes liberadas. Tudo bem para o dono do veículo, mas e se ele esquecer o celular em casa ou emprestar o carro para alguém?
(Fonte da imagem: Reprodução/BroadcastingWorld)
No caso da Google, a estratégia é outra: o carro já terá o Android instalado e não precisará necessariamente se conectar com outros gadgets. O carro já sai de fábrica com todos os principais recursos disponíveis instalados e funcionando.
Deste modo, a solução da Google parece ser mais eficiente, já que não será preciso ter um dispositivo iOS para fazer o carro funcionar. Se a Google for tão agressiva no mercado automotivo quanto ela é no mercado de smartphone e tablets, a Apple pode acabar refém de um mercado repleto de carros com Android.
Qual será o futuro de Apple e Microsoft?
Como dissemos anteriormente, ambas as companhias vão muito bem financeiramente, batendo recordes e registrando ótimos lucros. No entanto, sabemos que esse cenário não é eterno e que a situação atual das empresas pode acabar minando o sucesso delas no futuro se não houver mudanças desde já.
E se pensarmos no futuro dessas duas companhias, existem teorias que podem soar absurdas em um primeiro momento, mas não são exatamente impossíveis, apesar de improváveis.
Recentemente, um analista financeiro chamado Keith Keith Fitz-Gerald sugeriu que em um futuro próximo — mais precisamente em 2018 — Apple e Microsoft podem acabar se tornando uma única companhia. Por mais que isso pareça absurdo, a alegação de Fitz-Gerald não é completamente infundada. Isso porque, segundo ele, ambas precisariam unir forças para lutar contra outros gigantes, como o Android e o Facebook, por exemplo.
Contudo, talvez esse tipo de fusão precise ser aprovada pelo governo dos Estados Unidos, algo quase tão improvável de acontecer quanto a fusão das duas empresas.
Sobre o possível futuro de Apple e Microsoft, é improvável que as duas companhias deixem de ser lucrativas, pelo menos nos próximos anos. O que pode acontecer é que elas acabem caindo para um segundo escalão e percam o lugar para outras empresas de tecnologia, mas isso apenas se elas não apresentarem novos projetos e mais inovação a partir deste ano.
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