Crianças do Brasil, eis a pergunta que não quer calar: quantos “teras”, “gigas” ou “megas” vocês acham que possuía a mídia removível que nasceu praticamente junto com o PC e, por um tempo, ficou tão popular quanto ele?
Os nascidos depois de 1990 terão dificuldades para responder essa pergunta sem alguns minutos de pesquisa e leitura. Já os anciãos que trabalham na redação do Baixaki teriam a resposta na ponta da língua: 1.44 MB.
Sim, você leu corretamente. Um mísero “megabytezinho” e pouco era o que tínhamos na época em que não existiam HDs, pendrives, iPods, iPhones, Hi-Phones, MP3, MP4, MP5, MP10, MP15, CDs, DVDs, Blu-rays, memory sticks, etc. Inclusive, é provável que as gerações mais novas não consigam nem conceber a vida antes desse tipo de bugiganga.
Nós, da geração pioneira da internet, do ICQ, do MSN e das redes sociais, costumávamos ter caixas e mais caixas com dezenas de disquetes com a irrisória capacidade de armazenamento de 1.44 MB.
Para os velhacos, adolescentes que só conhecem o disquete de “3 ½” de ouvir falar e criançada que nunca viu nada mais feio, a notícia é a mesma: o disquete está oficialmente morto.
Pequeno gigante
Em 1979, o mercado de discos flexíveis de 5,25 polegadas ganhou um concorrente: o disquete de 3,5 polegadas, trazido pela Sony (som de tambores de escolas de samba, festa e alegria geral na nação).
Menor, mais confiável e com mais capacidade de armazenamento, o disco que, apesar de não ter nada de flexível, era chamado de “disco flexível” (floppy disk) rapidamente ganhou o mundo, passando a ser a principal mídia para distribuição de dados, softwares, jogos e tudo relacionado ao mundo da informática.
Com o tipo de dispositivos que temos hoje, “mais confiável” deixou de ser uma expressão válida para o disquete e, portanto, talvez devêssemos nos referir a ele como “menos desconfiável”, já que, ao contrário do disco realmente flexível, não podia ser dobrado para caber no bolso da calça jeans e, portanto, tinha teoricamente maior durabilidade.
Os mais céticos poderiam dizer que a era do disquete — que teve seu apogeu na década de 1980 e foi perdendo espaço da metade para o final da década de 1990, com a chegada dos CDs — foi marcada por uma insanidade temporária coletiva, vivida por toda a humanidade. Bem, pelo menos pela humanidade que foi acometida pela convivência pioneira com o mundo da tecnologia e do recém-inventado “Pê-Cê”.
A verdade é que o disquete nunca foi bom para nada. Se você salvasse um trabalho em um só disquete e deixasse para imprimi-lo na escola, provavelmente veria uma mensagem — do magnífico Windows 3.11 ou 95 — dizendo “O disquete inserido não está formatado. Deseja formatá-lo?”, fazendo com que diversas interrogações pipocassem ao redor da sua cabeça.
Como você se achava muito esperto, gravava o mesmo arquivo DOC em sete disquetes diferentes (já que sete é o número sagrado) para garantir que conseguiria abrir o arquivo. Depois que o computador falhava na leitura de seis, você inseria o sétimo com o maior cuidado, dedos cruzados, patuá e três pulinhos, pedindo a todas as divindades de três religiões para que nada desse errado.
Os felizes proprietários dos novíssimos PCs nem sabiam o que era “disco rígido”, pois nenhum computador possuía tal equipamento. O sistema operacional era o DOS, que desde o seu lançamento já possuía interface gráfica ultrapassada. Correção: ele não tinha interface gráfica.
“Meu irmão tem até hoje vários jogos tanto em disquete de 3.5 polegadas como o maiorzão de 5.25. Wolfenstein, Day of the Tentacle e outros clássicos.” — Danilo Amororo (Redação Baixaki) |
Na era do DOS, era necessário carregar o sistema em disquetes e usá-los para dar o boot na máquina. Feito isso, você deveria digitar “a:” e depois “dir” para saber onde exatamente estava gravado o programa a ser aberto.
Depois de digitar o nome do dito cujo, a tela travava e o som bizarro de leitura do disquete começava a ser produzido pela “unidade A”. Depois de alguns segundos de tensão, seu lindo programa ou jogo era aberto (ou não).
Algumas pessoas, inclusive, eram chamadas de “crânios” ou “hackers”, só porque conheciam comandos mais específicos, como “dir /p /w”, “deltree” e outros que podiam ser facilmente encontrados se o usuário digitasse “help” e teclasse ENTER.
Essa fama foi substituída por outra: hoje, quem sabe mexer em DOS é chamado de “tiozinho”, “velho”, “ancião” e outros adjetivos que dão vergonha aos nascidos antes de 1990.
Trazendo a fama de hacker para os dias de hoje, poderíamos fazer um paralelo com usuários que conseguem usar plenamente o Linux, sem problemas e sem recorrer à ajuda dos “tiozinhos”. Eles são chamados de hackers pelos leigos que usam Windows e tremem à imagem do pinguim.
“Eu costumava comprar jogos e pagar com disquetes. Doom, por exemplo, eu lembro que ‘custou’ $5,00 disquetes.” — Lucas Karasinski (Redação Baixaki) |
Já os que são capazes de memorizar, entender e executar procedimentos e comandos no console do sistema do pinguim, bem, estes provavelmente têm dificuldades de distinguir o mundo real do virtual.
Voltando ao assunto e fazendo uma análise com a visão de 2010, os famigerados disquetes eram indispensáveis para fazer o PC funcionar, mas eles próprios não funcionavam em, digamos, 90% dos casos.
Desde que a humanidade existe, sempre que alguém tem uma ideia para revolucionar o mercado e facilitar a vida das pessoas, algum habitante de calabouço tem outra para tentar destruir a primeira. Surgiram então os vírus, que eram espalhados como praga, através de disquetes contaminados.
Para todo vilão, é necessário um herói e, portanto, surgiram também os antivírus, que se tornaram rapidamente indispensáveis de se ter em qualquer computador.
Com eficiência duvidosa, passar antivírus na hora de inserir disquetes de terceiros era hábito de qualquer pessoa informada, mas nem sempre resolvia, e dá-lhe imagem da Madonna, Marilyn Monroe e outras celebridades posando na sua tela enquanto o vírus se encarregava de fazer sabe-se lá o que eles faziam nessa época.
Criador e carrasco
Se contássemos todas as histórias que aconteceram com uma só pessoa usuária de disquetes na época em que eles eram populares, teríamos conteúdo para encher, sem exagero, milhares de páginas do Baixaki. Sigamos, portanto, em frente.
O disquete está morto já há alguns anos, e todos já sabiam, exceto alguns usuários insistentes que ainda mantém cópias de seus documentos importantes em backups feitos em disquetes — e que os deuses protejam estas almas.
Contudo, uma atitude da Sony, empresa que mudou o curso da história quando inventou o disquete, oficializou o óbito das mídias magnéticas removíveis de 3.5 polegadas.
Sem perguntar nossa opinião (eu concordo!), a Sony Japão informou recentemente que, devido à falta de demanda pelo produto, em março de 2011, a produção de disquetes será descontinuada. Como diria um personagem amplamente conhecido no Brasil “já não era sem tempo hein!”.
Depois do surgimento dos CDs graváveis, o disquete gradualmente perdeu espaço, caindo completamente em desuso quando os DVDs graváveis surgiram e sendo vergonhosamente superado pelo Blu-ray.
As três novas mídias possuem capacidades de armazenamento tão maiores que o disquete que seria necessário um exército de discos flexíveis para somente chegar perto da quantidade de dados que cabe nas novas mídias, sem falar na confiabilidade.
Para humilhar, falemos então de confiabilidade, mas de forma breve, para que alguma honra seja levada pelo finado para o túmulo: um disquete pode simplesmente parar de funcionar sem motivo aparente.
“Meu pai tinha raiva de disquetes coloridos. ‘Coloridos não funcionam, pô!’, e aí, seguindo essa ideia, quebrou vários.” — Danilo Amoroso (Redação Baixaki) |
Para que isso aconteça com uma mídia ótica, é preciso que ela seja judiada, jogada na parede, pisada, rabiscada, lixada, enfim, submetida a danos diretos ou cuidados negligentes. Com o disquete, não importando o cuidado em sua conservação, a qualquer momento ele pode parar de funcionar (podia).
O velho e o novo
Para efeito de comparação, a quantidade total de disquetes vendidos no Japão em 2009 é capaz de encher pouco mais da metade de UM disco Blu-ray. Sendo assim, a frase de despedida ouvida por muitos disquetes será “já vai tarde”.
Não há como falar em disquetes sem submetê-los à humilhação máxima, que é compará-los às atuais mídias de armazenamento disponíveis.
Mas para que o processo não seja tão doloroso, falaremos somente dos tipos mais comuns, começando pelo CD, que chegou de mansinho e demorou alguns anos para emplacar, mas acabou ganhando mercado quando substituiu as fitas cassete — que, por sinal morreram sem velório.
A pugna
Inicialmente, os CDs graváveis tinham a capacidade de 650 MB, que depois foi aumentada para 700 MB. Seriam necessários aproximadamente 485 disquetes de 1.44 MB (ou 48 caixas e meia) para guardar um filme, com aproximadamente 11 segundos de vídeo em cada disquete. Imagine que delícia assistir a filmes assim.
Aumentando "só um pouquinho" a capacidade de armazenamento para a autonomia de um DVD gravável comum, com reles 4.7 GB, o vexame fica ainda mais feio. A conta é tão grande que a calculadora do Windows começou a rir.
Se comparássemos as capacidades das duas mídias a exércitos em guerra, seriam necessários mais de 3200 disquetes-soldado para enfrentar cada um dos DVDs, que com certeza ganhariam a batalha de qualquer forma, porque metade dos disquetes pararia de funcionar antes mesmo de o primeiro golpe ser desferido.
Os DVDs com maiores capacidades seriam os comandantes do exército, que nunca entram em batalhas corpo a corpo e, portanto, também não entram na conta. Se entrassem, o massacre seria maior.
Os pendrives, que têm capacidades variando entre 1 a centenas de gigabytes são os burgueses da história e, portanto, ficam assistindo de camarote e rindo das pobres coitadas mídias magnéticas.
O leitor com estômago fraco provavelmente já parou de ler este texto quando começaram as comparações dos disquetes com o CD, mas há alguns sanguinários que gostam de ver até onde somos capazes de levar nosso sadismo. Que assim seja, prossigamos para a comparação com o Blu-ray.
Os discos Blu-ray não se deram o trabalho de mandar um exército para o campo de batalha, pois se consideram muito superiores a qualquer tecnologia, seja atual ou ultrapassada.
Por isso, mandaram somente um representante, que por sinal, prefere ser chamado de BD-zão (é verdade, ele me disse).
Rapidamente, todos os disquetes remanescentes (provavelmente aqueles 12 milhões vendidos em 2009), entraram em formação de batalha e olharam feio para o BD-zão.
Grande erro, pois a coisa que um Blu-ray mais odeia é imagem feia. Por isso, em uma só pisada, um único Blu-ray destruiu o resto dos "discos flexíveis de 3.5 polegadas" existentes no mundo.
É lógico que antes de desferir o golpe fatal, o BD-zão tinha que se vingar da cara feia em baixa definição dos disquetes e proferir a sentença de morte: “se eu ganhei do HD-DVD, esmago fácil estes meros pedaços de plástico preto!”.
E foi esse o fim oficial de uma era que certamente a humanidade não sentirá falta. A aplicação atual para os disquetes, a partir de março de 2011, será nas histórias para assombrar criancinhas, além das que citamos abaixo.
Para os saudosos
Se você já estiver com saudade, confira esta galeria do Flickr, na qual estão publicadas diversas fotos organizadas cronologicamente, mostrando a história percorrida pelos primeiros disquetes — incluindo a instalação do Photoshop, do Windows e do Microsoft Flight Simulator — até o momento em que passaram a ser usados como objetos de decoração.
Aplicações atuais
E por falar em objeto de decoração, não há limites para a criatividade humana. Restos mortais também podem, por exemplo, ser usados para a criação de belas peças de arte retrô.
Bolsa feita de disquetes. Clique na imagem para ver como ela foi feita. | Porta-lápis feito de disquetes. Clique na imagem para ver como ele foi feito. |
(Créditos: O Gambá de Blumenau) |
Para não perder o costume, o Portal Baixaki desafia você a criar suas próprias aplicações para os discos flexíveis de 3 ½”, em nosso sistema de comentários. Seja criativo!
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