Richard é um programador que, enquanto buscava uma solução que parecia impossível para desenvolver um aplicativo, encontrou uma melhoria nunca antes vista na história da computação. Como resultado, ele ganha milhões de dólares de um investidor para aperfeiçoar o projeto, mas precisa lidar com as pressões da indústria da tecnologia, colegas preguiçosos ou gananciosos demais e a própria falta de aptidão social. Parece a realidade, mas essa é a trama de “Silicon Valley”, o mais novo seriado de comédia da HBO.
Já reconhecida por produções de altíssima qualidade, como “Game of Thrones”, a HBO estreou a produção de comédia em 7 de abril no Brasil. A primeira temporada terminou há pouco tempo: foram oito episódios de meia hora cada e a segunda já está confirmada, possivelmente para o ano que vem.
Como a série fala sobre gigantes da tecnologia, a indústria em geral e os profissionais que trabalham nesse meio, não podíamos deixar de conferir. E já avisamos: ela é tão trágica quanto cômica.
A jornada do herói
Richard (Thomas Middleditch) é o tal programador que tem a vida transformada após descobrir um algoritmo de compressão que faz o serviço mais rápido e de forma mais econômica. Mas não pense que a vida a partir daí é só alegria: ele é um dos milhares de estudantes ou engenheiros que moram na Califórnia, mais precisamente na região do Vale do Silício, terra das oportunidades para quem deseja ingressar no mercado da tecnologia. Por ainda não ser um magnata da área, ele vive em uma "incubadora", que é uma empresa que trabalha para ajudar no desenvolvimento de startups que mal saíram do papel.
Gilfoyle (Martin Starr), Dinesh (Kumail Nanjiani), Jared (Zack Woods) e Big Head (Josh Brener) completam o time da computação, cada um com uma especialidade. Agora que Richard descobriu o algoritmo e aceitou um investimento milionário para aperfeiçoá-lo, toda a equipe passa a dedicar-se ao “Pied Piped” (ou “Flautista”), nome escolhido para a startup. No grupo, há ainda Erlich Bachman (T. J. Miller), o investidor que passa a explorar Richard financeiramente de toda e qualquer forma possível.
Há ainda o incrível personagem Peter Gregory (Christopher Evan Welch), um investidor excêntrico que lembra muito um Steve Jobs dos anos 1980 e capta bem o estilo maluco de algumas pessoas da área. Infelizmente, o ator faleceu no final das gravações da primeira temporada, vítima de um câncer.
O criador e diretor da série tem gabarito na área: trata-se de Mike Judge, ator do "Saturday Night Live", dublador da dupla animada "Beavis & Butthead" e responsável pelas comédias "Como Enlouquecer seu Chefe" e "Idiocracia". A série é baseada não só nos acontecimentos mais recentes da tecnologia, mas também em eventos presenciados pelo próprio criador da série na década de 1980, quando ele mesmo aventurou-se pelo Vale do Silício.
Desbravando o vale
Se você convive diariamente com notícias sobre as gigantes ou está nesse meio, fique atento: as referências vêm em altas quantidades. Há piadas sutis com programação, Facebook, Steve Jobs (note as roupas de Elrich e como ele se acha o marqueteiro da empresa, enquanto Richard é o Woz do time) e todas as dificuldades de uma startup, desde achar um nome adequado, fechar as contas do mês e conviver com milionários excêntricos.
Vemos a frustração na resolução de bugs, complicações com advogados, a luta para sair da dependência financeira e virar um CEO — tudo de forma realista, apesar dos exageros típicos de uma comédia ficcional.
Em certos momentos, há uma constante em fazer piadas sobre sexo (ou a falta dele, no caso dos protagonistas), o que causa mais constrangimentos do que risadas. Esse é um dos estereótipos que a série infelizmente não consegue quebrar, gerando algumas subtramas um pouco cansativas.
Mas o fator mais irritante do seriado é mesmo Erlich. O sujeito não só é inconveniente e arruma brigas com todos do time, sendo metido e ganancioso, mas também toma decisões corporativas duvidosas. Ele suga toda a energia de Richard, fazendo o rapaz trabalhar também para consertar os erros cometidos por seu “mentor”. Esse é outro ponto positivo: demora um pouco, mas nos identificamos com o protagonista e passamos a torcer por seu sucesso.
Não é mais um “The Big Bang Theory”
É impossível deixar de comparar. São quatro ou cinco nerds assumidos conversando sobre códigos e tendo dificuldade com mulheres – mas as duas séries não poderiam deixar de ser mais diferentes.
Enquanto Sheldon e companhia são todos relativamente bem-sucedidos e têm quase todas as piadas focadas no convívio social e na vida amorosa, o destaque aqui vai para a carreira profissional dos personagens e a indústria da tecnologia. A ausência de trilha de risadas é outro diferencial — e, na opinião deste autor, uma excelente escolha.
Em resumo, a série é excelente para quem trabalha com a indústria, seja desenvolvedor ou jornalista da área, ou simplesmente está por dentro das novidades do mundo da tecnologia. Ela tem potencial para explorar ainda mais o universo do Vale do Silício, com a vantagem de ser situada em uma era em que startups e gigantes estão na mais na moda do que nunca.
Com personagens simpáticos e uma trama cativante, Silicon Valley acerta ao trabalhar com piadas e situações atuais e, apesar de apostar sempre no exagero e no absurdo, sintetizar a indústria da tecnologia em sua velocidade, pressão e possibilidade de deixar muita gente maluca ou milionária – e, às vezes, as duas coisas ao mesmo tempo.
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