Há quase 2 décadas, Peter Skillman desenvolveu um exercício muito interessante, batizado de Marshmallow Challenge (Desafio do Marshmallow).
A ideia é bastante simples: ao longo de 18 minutos, times formados por até 4 integrantes têm de construir a maior estrutura possível utilizando os seguintes elementos: 20 palitos crus de espaguete, 1 fita adesiva, 1 tira de barbante e 1 marshmallow. A única regra é que, esgotado o tempo, a estrutura deve ser capaz de parar de pé, sustentando o marshmallow em seu ponto mais alto.
Tecnologia, negócios e comportamento sob um olhar crítico.
Assine já o The BRIEF, a newsletter diária que te deixa por dentro de tudo
Fonte: Shutterstock
Após lançado, o desafio foi popularizado por Tom Wujec, que passou a aplicá-lo amplamente em workshops de liderança e outras sessões de brainstorming corporativo
Com base nessa experiência, viu-se que uma tarefa que inicialmente se mostra tranquila, na verdade, pode se tornar um verdadeiro pesadelo. Observou-se que não raro os times esgotam o tempo sem terem qualquer coisa para apresentar, pois o marshmallow, inserido nos momentos finais do exercício, revela-se pesado demais para as precárias estruturas sustentarem.
Após a aplicação massiva do desafio, os organizadores reuniram uma série de reflexões interessantes, das quais podemos extrair os seguintes aprendizados:
1. A fase de execução se mostra muito mais importante e efetiva do que a fase de planejamento, pois há diversas situações que os times são incapazes de prever em um primeiro momento;
2. Trabalhar em conjunto é uma habilidade indispensável, e muitos times fracassam justamente por não conseguirem agir bem como grupo;
3. Observar o trabalho de outros grupos é muito produtivo, pois permite ver diversas ideias serem testadas e selecionar aquelas que deram certo;
4. Ser o primeiro time a terminar o projeto não necessariamente é uma boa, pois assim perde-se a oportunidade de aprender com os demais e construir uma estrutura melhor.
Para além dos insights citados, o mais interessante é notar que os times que melhor performam no Desafio do Marshmallow são formados não por adultos mestres em Administração de Empresa, e sim por crianças do jardim de infância. A surpreendente razão é que, enquanto adultos tendem a perder tempo discutindo quem dará as ordens e buscando o projeto perfeito, crianças simplesmente saem fazendo testes e prototipando soluções, de modo que fracassam diversas vezes ao longo dos 18 minutos, mas chegam ao final com uma estrutura viável.
Fonte: Shutterstock
Trazendo essas percepções para o campo da inovação baseada em dados, muitas vezes observamos que os times de inovação despendem consideráveis esforços na criação de soluções incríveis sem considerar os impactos à privacidade e proteção dos dados (o marshmallow) dos indivíduos-alvos dos projetos. Assim, as soluções já totalmente desenvolvidas chegam para análise tardia dos times de privacidade, que têm de testá-las inserindo o marshmallow até então ignorado. O resultado é, na maioria das vezes, catastrófico, com o desmoronamento das soluções desenvolvidas, as quais têm de ser reconstruídas (gerando custos e retrabalho) ou, então, lançadas de qualquer jeito no mercado com aceitação de riscos que poderiam ter sido mitigados.
Em ambos os cenários, a empresa perde a oportunidade de inovar de maneira segura (privacy friendly) e de ter suas melhores peças empenhadas na prototipagem de soluções para problemas (inclusive regulatórios) relacionados a privacidade e proteção de dados.
***
Paulo Vidigal, colunista do TecMundo, é sócio do escritório Prado Vidigal, especializado em Direito Digital, Privacidade e Proteção de Dados, certificado pela International Association of Privacy Professionals (CIPP/E), pós-graduado em MBA em Direito Eletrônico pela Escola Paulista de Direito, com extensão em Privacidade e Proteção de Dados pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e em Privacy by Design pela Ryerson University.
Categorias