O vídeo postado acima trata de uma questão existencial: quem é você, internauta cercado por milhares de amigos? De que forma as relações em ambiente virtual têm afetado sua vida? Fazer de si mesmo uma imagem construída às custas de mera aparência não seria o mesmo que adorar uma divindade prestes a padecer? Assista a esta provocadora reflexão e então siga adiante com a leitura, que toca também sobre algumas das facetas do fenômeno "comunidade global".
Já disse uma vez o escrever afiado de Augusto Cury: “Um homem sem amigos é uma terra sem umidade, uma manhã sem orvalho, um céu sem nuvens”. Isso significa que o cantar dos pássaros é sempre mais bonito àqueles que colecionam centenas de contatos em suas agendas de amizades? Tirar a prova desta provocação não é lá grande desafio: quantos nomes você armazena em sua preciosa lista de amigos no Facebook? Dezenas? Centenas?
(Fonte da imagem: Reprodução/Inovadorespm)
Pois então seus dias deveriam ser sublimes! Olhe pela janela e veja as forma que as nuvens insistem em desenhar! Mas como fazer isso se as cortinas estão sempre fechadas? Como sentir a terra úmida sob os pés se um apertado sapato sufoca o respirar de cada pequeno dedo?
As relações sociais passam hoje por um cataclismo: milhares de contatos acabam por criar um tipo de rede virtual que, ironicamente, é capaz de prender até o mais livre dos sujeitos. Parecem ser os tempos em que a existência não mais depende de um esforço racional cuidadoso: “compartilho, logo existo” é a máxima estampada hoje na testa da nossa impaciente, agitada, inventiva e também egoísta geração.
E, nessa mesma linha crítica, centenas de sociólogos, filósofos, psicólogos e pensadores não diplomados tão competentes quanto qualquer outro bacharel têm conduzido estudos que refletem justamente o que se tem dito por aqui. “Somos anjos e demônios na internet”, comenta o sociólogo Manuel Castells, por exemplo, em clara menção ao potencial bivalente das redes sociais.
O poder de um clique
Mas a “inovação da solidão” não é, de forma alguma, o único resultado gerado pelas turbulentas revoluções em plano virtual. A internet tem sido usada de modo intenso por diversos segmentos da sociedade como um tipo de ferramenta capaz de congregar, disseminar e dar vida a ideias. Exemplos disso são as recentes revoltas acontecidas mundo afora, tais como a Revolução do Panelaço (2008, Islândia), a Revolução de Jasmim (2010, Tunísia), os Indignados (2011, Espanha) ou o Occupy Wall Street (2011, Estados Unidos).
Casos em que os “ativistas de sofá” permaneceram em casa comendo Doritos e curtindo fotos upadas por um companheiro qualquer não podem ser ignorados. “Porque se o que eles estão fazendo é um desafio à ordem institucional, não basta apenas criticar na internet; é necessário que o movimento seja visível”, diz ainda Castells, um dos pensadores mais populares da contemporaneidade sobre as novas relações fruto dos estreitamentos virtuais.
As manifestações que tomaram o país em junho do ano passado contaram com a participação massiva dos canais Facebook, YouTube e Twitter. Em levantamento realizado pela empresa de consultoria Serasa Experian, estimou-se que 70% dos perfis brasileiros no Facebook registraram atividades no dia 13 de junho – o terceiro maior pico de movimentação online na rede de 2013. Via Twitter, 11 milhões de atualizações com a palavra “Brasil” foram feitas na época.
Sangue nos olhos
Ainda de acordo com Castells, o medo ou qualquer tipo de ameaça só pode ser enfrentado a partir de um sentimento de emoção coletiva que gera, por sua vez, raiva e coragem — o “sentimento coletivo” que tanto aparece nas falas dos tais pensadores. É como já dizia Mikhail Bakunin, teórico russo do século 19, há mais de 100 anos:
"Meu nome é multidão. E somos muitos". (Fonte da imagem: Reprodução/Ronaud)
“A força do sentimento coletivo ou do espírito público já é muito séria hoje (...). Nenhum homem, por mais possante que se imagine, jamais terá força para suportar o desprezo unânime da sociedade, ninguém poderia viver sem sentir-se apoiado pelo consentimento e pela estima, ao menos por uma certa parte desta sociedade. É preciso que um homem seja levado por uma imensa e bem sincera convicção, para que encontre coragem de opinar e de marchar contra todos, e nunca um homem egoísta, depravado e covarde terá esta coragem.”
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