(Fonte da imagem: NewScientist)
Um dos aspectos mais interessantes da ciência é o fato de que ela é constituída pela incerteza. Tudo aquilo que é considerado uma lei da natureza só permanece como tal enquanto não houver evidências que provem sua ineficácia.
Interpretar o mundo dessa maneira permite que o meio científico realmente avance e, assim, esclareça vários dos mistérios da existência. Afinal, se considerássemos tudo o que sabemos como certo e infalível, de nada adiantaria fazer perguntas que nos levam a novos mistérios e soluções.
Neste artigo, reunimos exemplos de cinco experiências químicas que, embora parecessem impossíveis em um primeiro momento, podem ocorrer quando as condições ideias são alcançadas. Tais descobertas são só alguns exemplos de que vale a pena duvidar de ideais estabelecidas, mesmo que muitas vezes isso não agrade a opinião geral.
Gases nobres reagem com outros elementos
Uma das poucas lembranças conservadas por quem teve aulas de química no ensino médio, mas nunca se interessou muito pelo assunto, é que os gases nobres são os únicos elementos da tabela periódica que nunca reagem com outros. Isso se deve à teoria clássica das ligações químicas, que explica que reações deixam de acontecer a partir do momento em que a camada exterior dos elétrons de uma substância é preenchida.
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Essa impossibilidade foi desmentida pelo químico britânico Neil Bartlett, da University of British Columbia, em Vancouver. Em 1961, ele observou que o hexafluoreto de platina (PtF6) era capaz de roubar elétrons do oxigênio, elemento que normalmente provoca a reação contrária — característica que inclusive originou o termo oxidação.
Ao analisar o potencial de ionização (quantidade de energia necessária para mover um elétron) do oxigênio, Batlett percebeu que ele era muito semelhante ao do xenônio, um gás nobre. Como todo bom cientista, ele decidiu misturá-lo ao hexafluoreto de platina: o resultado foi o hexafluoroplatinato de xenônio, XePtF6.
Desde então, diversas reações químicas foram realizadas usando elementos como o criptônio, algumas delas explosivamente instáveis. Situações do tipo mostram que, além de não conhecermos os gases nobres tão bem quanto imaginamos, não é recomendado acreditar em tudo que você ouve na escola.
Existem ligações entre mais de dois elementos
Outra coisa que aprendemos na escola é que o modelo clássico da química só admite reações entre dois elementos, sem que haja espaço para qualquer intruso na história. Essa teoria passou a ser questionada já na década de 1940, por pesquisadores que tentavam explicar certas reações ocorridas em moléculas orgânicas que envolviam a troca de cargas negativas entre grupos pendentes.
Caso uma dessas cargas se perdesse, o fato resultaria na criação de algo conhecido como “carbocátion”, um íon contendo um átomo de carbono com carga positiva. As leis estabelecidas até então diziam que os demais grupos pendentes deveriam se ligar à nova molécula, processo que nem sempre acontecia.
Para explicar a situação, alguns cientistas formularam a tese de que a carga positiva estava formando uma matriz triangular com três átomos de carbono. Essa estrutura não só possibilitava que os grupos pendentes se ligassem a vários locais diferentes, como também permitia que um dos átomos de carbono fizesse cinco ligações, em vez das quatro tradicionais.
Essa tese só pôde ser provada décadas depois, pelo cientista húngaro George Olah, que utilizou espectroscopia nuclear magnética para isolar um carbocátion — feito até então considerado impossível, devido à sua instabilidade. O trabalho não só provou que existem ligações entre três elementos, como rendeu ao pesquisador o prêmio Nobel de química em 1994.
Reações espontâneas podem acontecer em dois sentidos
A Segunda Lei da Termodinâmica afirma que toda espécie de mudança ocorrida no universo é acompanhada pelo aumento da entropia — ou seja, a desordem da existência aumenta constantemente. Assim, todas as reações químicas só trabalhariam em um único sentido, sem a possibilidade de uma volta a seu estado original.
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A descoberta do cientista russo Boris Belousov mostrou que isso não era necessariamente verdade. Usando um coquetel de elementos químicos semelhantes à glicose, ele criou uma mistura que alternava entre o amarelo e o incolor de maneira constante — sinal de que a reação estava acontecendo em ambos os sentidos.
Tais oscilações são explicadas pelos compostos intermediários gerados durante o processo, capazes de acelerar suas próprias produções. Combinados a outras misturas capazes de gerar um ciclo que restaurava os componentes usados a seus estados originais, esses agentes explicam os motivos pelos quais o processo acontecia nos dois sentidos.
Eventualmente, os elementos químicos se estabilizavam conforme os compostos intermediários eram consumidos, provando que a situação só ocorre durante reações instáveis. Os fãs da Segunda Lei da Termodinâmica não precisam se preocupar — como ela só abrange reações estáveis, a descoberta não foi capaz de desacreditá-la.
Reações químicas podem acontecer em ambientes frios
A maioria das reações químicas depende de um processo que forma moléculas intermediárias com grande energia que se rearranjam em produtos com menor vigor energético. Para que isso ocorra, geralmente é preciso existir alguma espécie de aquecimento, o que impediria que houvesse qualquer espécie de combinação de elementos no espaço.
Na década de 1970, o químico soviético Vitali Goldanski contestou essa afirmação, provando que certas moléculas envolvidas em reações de polimerização continuavam reagindo mesmo em ambientes com temperaturas próximas a 4 Kelvin (-269° C). O cientista sugeriu que isso acontecia devido a um processo quântico denominado Efeito Túnel, que consiste em uma partícula atravessando uma região em que a energia potencial é maior do que a sua energia total.
Goldanski afirma que é isso que possibilita a ocorrência de reações químicas no espaço, talvez sendo até mesmo o responsável pela formação de moléculas construtoras da vida em grãos interestelares, a partir de ingredientes como cianeto, amônia e água. Mera curiosidade na época de seu descobrimento, o Efeito Túnel é uma das teorias mais bem estabelecidas da química atual.
Simetrias impossíveis
Quando o químico israelita Dan Shechtman afirmou ter descoberto uma forma quasicristalina de simetria atômica em certos sólidos, ele provocou reações bastante contrárias no meio científico. Um de seus principais opositores foi Linus Pauling, cientista famoso por ter chegado próximo de descobrir a estrutura do DNA (ele havia apostado em um formato de três hélices, em vez das duas realmente existentes).
A reação foi tão negativa que ele se viu impedido de continuar suas pesquisas, passando por sérias dificuldades para divulgar seu trabalho. A recompensa veio em 2011, ano em que o pesquisador recebeu um prêmio Nobel por seu trabalho.
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A descoberta ocorreu enquanto Shechtman atirava raios de elétrons em ligas metálicas e conferia os padrões resultantes de suas reflexões, o que permitia a ele conferir a forma como os átomos que constituíam os materiais se agrupavam. Entre os resultados, estava uma forma com simetria semelhante a um pentágono, cujos padrões nunca se repetiam de forma exata.
Várias outras ligas quasicristalinas foram descobertas desde então, tanto em polímeros quanto em pedaços de meteoros. Atualmente, há pesquisas que afirmam que até mesmo a água adquire essa característica quando confinada a fendas com espessura extremamente reduzida.
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