Se você for comprar uma nova TV hoje, vai ver uma série de recursos nas propagandas. A resolução, o contraste, o sistema operacional, o material da tela, a espessura do aparelho, o uso de inteligência artificial... mas tem uma coisa que você não vê mais: 3D.
Conteúdos com efeitos em três dimensões ganharam o cinema em mais uma onda de popularidade, e isso tentou ser levado para os televisores, mas não vingou. Como foi esse auge? E como aconteceu a queda? Afinal, por que deu errado?
Tecnologia antiga
Para começar, 3D não é uma tecnologia recente. O estereoscópio, que é o equipamento que permite a visualização de imagens que dão a impressão de três dimensões, foi inventado em 1838 pelo físico Charles Wheatstone. De um efeito engraçadinho em fotografias, com o tempo ele passou a ser usado como brinquedo, como no caso do View Master, que hoje pertence à Mattel. E logo os efeitos foram para o cinema, com a primeira exibição ao público de algo parecido em 1922*.
A partir daí, o 3D nas telonas teve vários auges, nos anos 1950 e depois no anos 1980, especialmente em filmes de terror, como Sexta-Feira 13 e Tubarão. O desenvolvimento da tecnologia IMAX ajudou no retorno desses efeitos, que são usados até hoje.
Só que a nova moda se firmou mesmo por volta de 2010 e teve um grande culpado: Avatar. O filme de aventura e fantasia de James Cameron saiu no ano anterior e foi um fenômeno nas bilheterias, antes do início da febre dos filmes de herói de Marvel e DC, e se tornou na época o longa-metragem que mais arrecadou dinheiro com ingressos. E um dos motivos era bem claro: a curiosidade do público em ver os efeitos em 3D cuidadosamente planejados pelo diretor — e é claro que o bilhete um pouco mais caro também ajudou.
No mesmo ano, a Coreia do Sul se empolgou e lançou um canal de TV com programação no formato, o SKY 3D. E em 2011 a agitação começou rápido, com modelos de LED e plasma cada vez maiores. Os dispositivos não eram muito baratos, mas a curiosidade e o "fator novidade" fizeram as vendas responderem bem.
Como funciona a tecnologia em TVs 3D?
É bem simples: ela engana o seu cérebro de uma maneira bem inteligente. Primeiro, é preciso lembrar que imagens em três dimensões são exibidas em dois "pedaços": parte no olho esquerdo e outra no direito. Com os óculos 3D, que são obrigatórios para ver o conteúdo, a visão é "corrigida" e desembaralhada, mas tem como resultado o efeito que dá a sensação de que alguns objetos estão mais próximos, como se tivessem saltado do painel para a sala.
Existem dois formatos da tecnologia: o 3D passivo, que é aquele dos óculos de papel mais simples, com lentes de cores diferentes; e o 3D ativo, com óculos movidos a bateria fazendo em tempo real o trabalho de bloquear uma lente por vez em sincronia com a TV, gerando a ilusão. Essa é uma estratégia diferente da que a Nintendo adotou com o portátil 3DS, que usa a chamada barreira de paralaxe. Mas isso é assunto para outro texto.
Fabricantes como a Toshiba pesquisaram por anos como fazer uma TV 3D sem óculos que realmente funcionasse bem, mas todos os modelos tinham problemas e exigiam que o espectador ficasse paradinho para não estragar a experiência. Pode parecer meio óbvio, mas vale lembrar que nem todo conteúdo exibido na tela vira 3D: ele precisa ter sido filmado assim ou convertido para ter esse efeito, e alguns ficam muito melhores do que outros.
Óculos especiais usados com TV 3D
A ascensão e a queda
A empolgação durou menos de 3 anos. Por volta de 2014, as TVs que ainda usavam a tecnologia já não colocavam essa função como um dos destaques, e as feiras especializadas, como a CES, já não tinham muito espaço reservado para o 3D. E olha que uma parcela boa do mercado ainda era de aparelhos que rodavam essa tecnologia. Segundo dados do NPD Group, as TV 3D tinham só 8% do mercado nos Estados Unidos em 2016, contra 23% da fatia no mesmo setor em 2012.
Em 2016, uma das líderes do segmento de Smart TVs, a Samsung, não mostrou mais modelos com suporte a imagens que saltavam da tela, mas outras grandes marcas seguiram, como Sharp e TCL. Em 2017 veio o último golpe: Sony e LG, que eram a resistência dessa forma de conteúdo, começaram o ano sem levar modelos 3D para a CES. Isso significou que as fabricantes perceberam a falta de interesse do público e o mau negócio que era insistir no setor. Pouco a pouco, a tecnologia foi abandonada e hoje só são encontrados modelos daquele período mesmo.
Mas por que deu errado?
Vamos listar os motivos. Para começar, o cinema 3D já se bastava — aliás, nem mesmo ele é uma unanimidade, e muita gente prefere ver até os blockbusters na boa e velha telona 2D. Vários consumidores ainda sentem os efeitos do bug no cérebro, ficando com dor de cabeça ou sensações que lembram a motion sickness causada pela realidade virtual. E dá para ir um pouco mais fundo: o público não queria levar essa experiência para o conforto do lar; boa parte da clientela não precisa disso e só quer uma televisão com imagem boa.
Além disso, há o velho problema da falta de oferta de conteúdos. Pois é, a gente teve filmes em Blu-ray, emissoras e até jogos em 3D, mas não foi adotado de forma massiva e não compensava o investimento. Alguns eventos esportivos eram outra forma de convencer o público, e isso começou com a Copa do Mundo de 2010, na África do Sul, mas também foi limitado. Sem contar que para mídias físicas era preciso um aparelho que lesse a tecnologia 3D, além do televisor, o que também restringia o consumidor. Star Wars: O Despertar da Força chegou a ter um Blu-ray em 3D em 2016, mas já era tarde demais.
E tem outro motivo que é bem positivo para a indústria: o 3D foi deixado de lado para que outras tecnologias ocupassem o tempo e a verba das fabricantes. Estão nessa lista o HDR, por exemplo, e resoluções cada vez maiores, como 8K, que até já ganhou vídeo por aqui.
Você gostava das TVs 3D? Ou achava uma tecnologia dispensável e que não era bem utilizada nesses aparelhos? E o cinema 3D, é uma boa ideia? Qual vai ser a próxima tecnologia abandonada pelas fabricantes?
*Colorido e com duração de longa-metragem, Bwana, O Demônio (1952) é considerado o pioneiro do primeiro auge do cinema 3D.