Você provavelmente conhece a loja online chinesa que vende absolutamente de tudo, alguns produtos muito bons e outros de qualidade meio duvidosa, e que demoram meses pra chegar na sua casa depois de tirarem férias em Curitiba.
Estamos falando do Aliexpress e do grupo dono desse serviço, o Alibaba, temas da vez na série de história da tecnologia. Além de conhecer o dono super simpático, você vai ver que esse negócio é bem mais antigo do que você pensa.
Tecnologia, negócios e comportamento sob um olhar crítico.
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Ali-quem?
A história começa em 1999, com a fundação da empresa Alibaba por 18 pessoas lideradas pelo executivo Jack Ma. As primeiras reuniões eram no apartamento dele, em Hangzhou, na China, e nesse período nasceram os dois primeiros filhos desse negócio: os comércios eletrônicos Alibaba.com, todo em inglês, e o 1688.com, só pra China.
As primeiras reuniões do Alibaba.
Já em outubro desse ano, vem o primeiro financiamento da marca: 5 milhões de dólares de um grupo de investidores. Foi o próprio Jack Ma que bolou o nome da marca, uma referência ao conto Alibabá e os 40 Ladrões lá das 1001 noites. Ele conta que a ideia veio na cabeça numa viagem aos Estados Unidos, e ele saiu perguntando no café em que ele tava e até no meio da rua se as pessoas conheciam o nome, e todas responderam que sim.
Não teve jeito, o nome era bom mesmo. Segundo o CEO, o personagem Alibabá é uma pessoa esperta, bondosa e voltada pros negócios, que nem a marca. E o Abre-te Sésamo, passe pra abrir a porta secreta que leva ao tesouro, é pra mostrar que a empresa ajuda pequenas e médias companhias a chegaram às riquezas.
O pai de tudo
Antes de continuar, é obrigatório falar sobre o Jack Ma. O nome verdadeiro dele é Ma Yun, e o apelido ocidental veio de amigos norte-americanos que não conseguiam pronunciar o original. Jack demorou pra completar os estudos por morar em uma região pobre e ter dificuldades em matemática. Pra compensar, ele curtia inglês, e ia de bicicleta pra um hotel da cidade só pra falar com estrangeiros. Deu tão certo que um tempo depois ele virou professor do idioma.
Jack ainda conta que foi rejeitado mais de 20 vezes em entrevistas de emprego, até em um KFC. Tudo mudou no meio da década de 90, quando ele foi pros Estados Unidos e conheceu uma tal de internet. De volta pra China e disposto a colocar o país na rede, ele criou um serviço que era tipo um páginas amarelas local, com as empresas e seus respectivos serviços.
Ele se uniu com uma instituição do governo pra ampliar os negócios e acabou ficando pra trás no mar de burocracia e controle estatal da China, deixando o empreendimento.
Ele então passou pra um cargo no ministério de relações exteriores, e ficou lá até começar as reuniões no próprio apartamento pra fundar o Alibaba. Jack largou o cargo de CEO em 2012, mas permanece na presidência. Ele é o homem mais rico da China, estrelou um curta de ação e adora fazer performances musicais nas conferências da empresa. E é um homem puramente dos negócios: ele não é programador ou engenheiro e só comprou o primeiro computador com 33 anos.
Começo promissor
Com um ano de empresa, ele já consegue um investimento de um dos fundos mais respeitados do mundo, o SoftBank. Com ele e outros parceiros, a marca levanta 25 milhões de dólares em 2000 e atinge 1 milhão de usuários registrados em 2001, o que pros padrões chineses ainda é quase nada, mas pra internet da época já era muito. Pra coroar a boa fase inicial, em 2002 o Alibaba atinge o lucro pela primeira vez, e daí pra frente seria quase só alegria.
É que em 2003 a China tem muitos problemas com a SARS, o vírus da Síndrome respiratória aguda grave. E, enquanto o país estava em alerta, o Alibaba cresceu ainda mais. É que o período coincidiu com a chegada da internet em alta velocidade, e o eCommerce se tornou a grande alternativa pra quem tinha medo de sair de casa. Jack Ma deixou os funcionários trabalharem de casa, mas uma equipe ficou reunida lá no apartamento da fundação da companhia pra dar a luz a outro empreendimento.
A equipe de Jack Ma protegida, mas trabalhando.
O resultado é o Taobao, um site de comércio e leilões online de consumidores pra consumidores, mais parecido com o esquema do Mercado Livre e apenas voltado pro público chinês. Lá você pode comprar absolutamente qualquer coisa, desde itens que são possíveis achar num supermercado até uma casa ou um carro. Deu muito certo, o Taobao virou líder em dois anos e fez até o eBay fechar as portas da filial chinesa por não conseguir competir.
O ano de 2004 marca mais um investimento milionário no grupo Alibaba e dois lançamentos importantes. O primeiro é o Aliwangwang, um mensageiro que só funciona dentro do Taobao e permite um contato direto entre você e o vendedor. Teve ainda a plataforma terceirizada Alipay, que é um sistema de pagamentos online que também cuida de toda a sua situação bancária. 2005 é o ano da consolidação de uma longa amizade.
O grupo Alibaba primeiro anuncia uma parceria e logo depois toma conta de todas as operações do Yahoo! na China. Jack Ma já era amigo de um dos fundadores da empresa, que já teve a história contada por aqui, e a transação foi uma das maiores da época em toda a indústria chinesa. Um ano depois, é lançada a Taobao University. O nome diz tudo: esse é o braço de educação do Alibaba, mas focado só em ajudar você a abrir um novo negócio e empreender online.
Em todos os mercados
Não é pura sorte o que tá acontecendo com o Alibaba até aqui. O Jack Ma realmente entende o pensamento da população local e também a peculiar forma da internet chinesa funcionar, e aí ele sabe exatamente o que lançar e onde investir.
Vale lembrar que, por lá, existe uma forte censura de conteúdos vindos do outro lado do mundo, e a China tem a própria versão pra uma rede social de microblog e um app próprio de troca de mensagens.
Em 2007, o grupo Alibaba abre a oferta pública de ações na bolsa de Hong Kong. Isso faz o domínio dela naquela região ficar ainda maior e a riqueza aumentar, mas a escolha do país vai dar problema mais pra frente. E o Alibaba apresenta nessa época o Alimama, um braço de marketing digital e big data que cuida do eCommerce da companhia e seus parceiros. Outro lançamento é o Taobao Mall, ou Tmall, que adiciona revendedores, distribuidores e marcas ao antes restrito a usuários Taobao.
Nesse período, a empresa também passou a investir cedo e bastante em dois temas que estão na moda hoje: inteligência artificial e nuvem. O primeiro veio por causa dos laboratórios de pesquisa e desenvolvimento, que recebem investimentos bilionários do Alibaba. O segundo vem principalmente do Alibaba Cloud ou Aliyun, um serviço de armazenamento, servidor e transferência de dados pra consumidor e empresas que é líder isolado do mercado na China.
Nasce o Aliexpress
Mas China e região já estavam ficando pequenos pro Alibaba. Em abril de 2010, nasce o Aliexpress, e você com certeza já comprou de lá, recebeu links com ofertas absurdas ou pelo menos teve vontade. A plataforma é o eCommerce internacional da empresa, com vendedores apenas chineses de pequenos a grandes negócios enviando pra todo o mundo, exceto China.
O brasileiro adotou com gosto o Aliexpress pra comprar de tudo, de roupas e eletrônicos até quinquilharias e decoração. A versão em português saiu em 2013 e dois anos depois viramos a quarta maior base do site. Em 2017, o Ali já era o sétimo comércio eletrônico mais acessado no Brasil.
Ele abriu as portas não só pro Alibaba no Brasil, mas também pra outros sites chineses, como Gearbest e Wish, fora o mais antigo Dealextreme. Mas claro que nem tudo é bom e correto nesse ambiente tão grande.
O Aliexpress e o Taobao sofrem com as falsificações, que são cópias ilegais e sem direitos de produtos de grandes marcas e até de projetos de financiamento coletivo.
Além disso, tem todo aquele papo da demora pra que produtos da China cheguem ao Brasil, sempre parando no buraco negro que é a unidade dos Correios em Curitiba. O problema é bem complexo e envolve tanto a falta de logística quanto o alto numero de pedidos,
Dividir para conquistar
Mas vamos voltar pra linha do tempo. Em 2011, o gigantesco TaoBao é dividido. O Marketplace vira a loja online de consumidores pra consumidores, o Tmall vira um site mais limitado pra empresas venderem aos consumidores e o eTao é o buscador de produtos que engloba filiais chinesas de marcas internacionais. Tudo isso, vale lembrar, só opera lá no país.
Laiwang.
Falando em China, em 2013 sai o Laiwang, um mensageiro pra tentar tirar o domínio do WeChat na China. Ele foi renomeado pra DianDianChong anos depois e se aproximou mais de ser um clone do Snapchat.
Sem parar
Em 2014, depois de muita expectativa, o Alibaba faz a oferta pública de ações em Nova York, e claro que ela foi uma das maiores da história. Hoje, ela está até envolvida com cinema. A Alibaba Pictures é uma produtora comprada pelo grupo nesse mesmo ano que foca no desenvolvimento de filmes orientais, mas financia produções Hollywoodianas como Missao Impossível: Nação Secreta e Star Trek: Sem Fronteiras.
Em 2015, seguindo a tendência de lançar uma versão chinesa de serviços que existem no resto do mundo, ela lança o Alitrip pra viagens e hotéis. Ele mudou de nome pra Fliggy um ano depois. Tem ainda o lançamento do mensageiro mobile empresarial DingTalk, a compra do jornal South China Morning Post e a fundação da plataforma Alibaba Sports. Aliás, falando em esportes, Jack ma é dono de quase um terço da equipe chinesa de futebol Guangzhou Evergrande, que tem brasileiros no time e já foi comandada por Luis Felipe Scolari, o Felipão.
Não dá pra citar todos os projetos atuais do Alibaba, mas é só você pensar em tecnologias da moda e acreditar: eles têm um setor pra isso. Em compras, lançaram o Hema, um mercado sem caixas em que você faz tudo pelo smartphone, tipo um Amazon Go melhorado. Eles também tem um sistema operacional de internet das coisas, o AliOS. Ele antes se chama Aliyun OS e chegou a ser usado em smart TVs e smartphones.
E até lançaram um carro conectado em 2015 em parceria com uma montadora, o OS’Car RX5. Recentemente, Jack ma comprou a fabricante de chips Hangzhou C-SKY Microsystems e a desenvolvedora de jogos Ejoy.
Segundo um relatório da Digital Statshot, o Alibaba já é mais popular do que a gigantesca Amazon e o eBay, o TaoBao é um dos 10 sites mais visitados no mundo e o Aliexpress é um dos 10 apps mobile mais usados mensalmente em todo o planeta.
O dia da loucura
E o Alibaba ainda é o responsável pela chamada "Black Friday chinesa", que é sempre no dia 11 de novembro, ou seja, nem sempre é uma sexta. Esse é o Dia dos Solteiros na China, uma data que começou a ser comemorado em uma universidade como um festival de entretenimento e até pra tentar formar casais.
Desde 2009, a empresa usa a data pra vendas a preços especiais, e em 2012 até registrou oficialmente a marca 11-11. É nesse dia que a empresa costuma bater recordes de venda e faturamento. Em 2017, foram 25,3 bilhões de dólares arrecadados em somente 24 horas, um crescimento de 39% em relação ao ano anterior.
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E essa é a história do Alibaba, uma das gigantes chinesas que a gente conhece menos por estarem lá do outro lado do mundo, mas que dominam o mercado local e tem pelo menos um dedinho em cada setor da tecnologia atual. Se você quiser ver uma empresa, produto ou serviço aqui na série, é só deixar um comentário com a sugestão.
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