Alain Touwaide em seu habitat preferido: bibliotecas (Fonte da imagem: Smithsonian)
Quem é que nunca recorreu às plantas na hora de tratar algum desconforto ou doença corriqueira? Chá de cidreira para pessoas nervosas, limão e alho para gripe e assim por diante. Hoje, esse tipo de recurso se dá mais como tratamento complementar do que como medicamento real, mas houve uma época em que enfermidades graves eram tratadas exclusivamente dessa forma.
O pesquisador Alain Touwaide, do Museu de História Natural do Smithsonian, concedeu uma entrevista à revista New Scientist de 18 de fevereiro de 2012, revelando detalhes curiosos de seu trabalho. Grosso modo, Touwaide precisa analisar a literatura médico-farmacêutica de séculos atrás, que consiste, basicamente, de manuscritos guardados em bibliotecas do mundo todo, como Londres, Vaticano e até monastérios da península de Athos, na Grécia. Especialista no uso medicinal da flora mediterrânea, Touwaide se vê obrigado a consultar materiais escritos em grego, árabe e latim.
Hipócrates e seus medicamentos
Pintura do séc XII mostra Hipócrates e Galeno conversando (Fonte da imagem: Nina Aldin Thune)
Hipócrates, médico grego que viveu durante os anos 460 a.C. a 370 a.C., é considerado hoje como uma das figuras mais conhecidas da história da medicina, além de ser um dos precursores dessa ciência. De acordo com as pesquisas de Touwaide, Hipócrates usava uma substância pastosa composta por flores do gênero Íris, vinagre e perfume de rosa para tratar dores de cabeça. Quando o assunto era enxaqueca crônica, o doutor apelava para os atributos dos pepinos. Já as dores de estômago eram aliviadas pelo uso de tâmaras, caldo de galinha e alfaces cultivadas.
Os poderes da teia de aranha
(Fonte da imagem: The National Science Foundation)
Quando perguntado sobre os remédios mais instigantes que já encontrou, Touwaide cita as diversas menções ao uso de teias de aranha. E ainda hoje esse material “exótico” chama a atenção de pesquisadores. De acordo com o Science Daily, há um grande número de relatos do uso desse tipo de material como cicatrizante e coagulante para feridas e cortes.
Entretanto, pesquisadores ainda não testaram para valer o potencial da teia de aranha na medicina. Pode ser que, no futuro, os fios produzidos pelos aracnídeos possam servir de matéria-prima para a fabricação de ataduras usadas por soldados e vítimas de acidentes. Outra hipótese é que a teia de aranha também possa ajudar a diminuir o risco de rejeição em implantes de órgãos ou membros.
Brócolis e ginecologia
Brócolis era indicado como medicamento de uso geral (Fonte da imagem: iStock)
Rico em vitamina C, fibras, cálcio e até mesmo nutrientes anticancerígenos, o brócolis tem se tornado alvo de diversas pesquisas farmacológicas. E Touwaide explica que, de acordo com textos antigos, o uso medicinal desse vegetal tem sido explorado há muito tempo, inclusive no combate a desordens ginecológicas. A partir do terceiro século a.C., o brócolis também serviu de tratamento para problemas digestivos, tétano e edemas.
Já no primeiro século d.C., as principais doenças tratadas com essa planta foram as infecções da pele. A popularidade do alimento era tanta que o líder romano Cato incentivava os cidadãos da época a cultivarem o brócolis como uma espécie de medicamente de uso geral.
Além disso, o médico grego Galeno receitava o vegetal como medicamento para uma doença que hoje poderia ser diagnosticada como câncer de próstata. Curiosamente, essa é uma das propriedades do brócolis que interessam os pesquisadores de hoje.
Reciclagem de conhecimento
Remédio para o estafilococo-dourado pode estar em textos antigos (Fonte da imagem: CDC)
Outro ponto comentado por Touwaide diz respeito às plantas usadas pelos antigos que possuem potencial de serem empregadas na medicina de hoje. Como exemplo, o pesquisador citou a nogueira, que fornece as deliciosas nozes para a ceia de Natal, e duas espécies não muito populares: marroio-negro e marroio-branco.
As três plantas são citadas, na literatura antiga, como detentoras de efeitos desinfetante e anti-inflamatório, sendo prováveis combatentes da bactéria conhecida como estafilococo-dourado, famosa por sobreviver à aplicação de muitas drogas modernas.
Além disso, é incontestável o fato de que o estudo da medicina antiga pode colaborar para a ciência de hoje. Touwaide cita, por exemplo, o caso da malária, para a qual são encontrados mais de 70 agentes para tratar a doença na literatura médica grega do período que vai do quinto século a.C. até o terceiro d.C., incluindo o gênero botânico Artemisia, usado ainda hoje para combater essa doença.
Mas como todo bom cientista, Touwaide é cauteloso. Ao ser questionado sobre a possibilidade de testar essas plantas ou métodos em seu próprio corpo, ele responde: “Eu não pratico automedicação! Para mim, o estudo desses remédios antigos é atividade científica, não uma busca de um estilo de vida.”
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