Se você nasceu depois de 1994, acredite: houve uma época em que não tínhamos internet. Ou melhor, a internet até existia, mas o acesso a ela era restrito a militares e pesquisadores. Para piorar, no início a rede mundial de computadores servia basicamente para troca de emails, já que as páginas da web ainda não haviam sido inventadas.
Como boa parte das tecnologias, o desenvolvimento da internet também começou para fins militares. Em plena Guerra Fria, os Estados Unidos buscavam uma forma descentralizada de comunicação e armazenamento de dados, que continuasse ativa mesmo que parte dela fosse bombardeada, por exemplo.
A tal rede foi desenvolvida em ambiente acadêmico, mas com o financiamento de um órgão militar especialmente construído para esse fim, em 1958: a Advanced Research Projects Agency (ARPA), que estava diretamente vinculada ao Departamento de Defesa dos EUA.
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A primeira demonstração da ARPANET, que podemos considerar como sendo a mãe da internet, aconteceu em 5 de agosto de 1968. Na internet é possível encontrar os mapas que mostravam os pontos conectados por meio da ARPANET. Em dezembro de 1969, por exemplo, a rede era composta por apenas quatro pontos. Muito diferente da visão que temos em março de 1977, quando dezenas de hosts estão interconectados.
Com o passar do tempo e o crescimento da ARPANET, a rede começou a ser utilizada também por universidades e, na década de 80, adotou o TCP/IP, protocolo atualmente em uso na internet, como tecnologia padrão para comunicação.
Aliado à popularização do computador pessoal (PC) e do TCP/IP, outra “personagem” que ajudou a convergir todas essas tecnologias para a criação da internet foi a NSFnet, uma rede criada pela National Science Foundation com o objetivo de interligar outras redes.
A chegada da grande rede ao Brasil
O que possibilitou a chegada da internet ao Brasil foi outra predecessora da rede: a Bitnet, uma rede de universidades fundada em 1981 e que ligava Universidade da Cidade de Nova York (CUNY) à Universidade Yale, em Connecticut.
Em solo brasileiro, a Bitnet conectava a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) ao Fermilab, laboratório de física especializado no estudo de partículas atômicas, que ficava em Illinois, nos Estados Unidos.
As duas instituições eram ligadas via linha telefônica, por meio de um fio de cobre dentro de um cabo submarino. Bastante rudimentar se compararmos com as fibras ópticas de hoje. Como a conexão era do tipo ponto a ponto, ela também dispensava a discagem: a FAPESP estava sempre conectada ao Fermilab.
Em 1990 foi criada a Rede Nacional de Pesquisa (RNP), pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, com o objetivo de implantar uma infraestrutura com abrangência nacional para os serviços de internet.
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E já que a internet se popularizava entre o meio acadêmico dos Estados Unidos, o Fermilab também resolveu adotar a nova tecnologia. Porém, sem abandonar o uso da Bitnet. Por isso, com o passar do tempo a conexão entre a FAPESP e o Fermilab acabou se tornando a única rota de saída de dados do Brasil para o mundo e a principal conexão tupiniquim com a internet, no início de 1991. A Fundação também ficou encarregada da administração do dominínio “.br” e da distribuição dos números IPs para o Brasil.
Outra novidade no cenário nacional foi a expansão da rede dentro do país. Uma nova conexão interligava a FAPESP ao Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), no Rio de Janeiro. Posteriormente, as conexões de internet foram estendidas também para outras instituições dentro de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Essas conexões usavam linhas privadas que operavam na faixa de 2.400 a 9.600 bits por segundo (bps).
A própria conexão entre a FAPESP e o Fermilab operava a 4.800 bps até setembro de 1990, quando então passou a trafegar dados a 9600 bps. Esse valor é muito inferior ao que temos hoje em nossas casas, com as conexões de até 10 megabits por segundo (Mbps), por exemplo. Hoje, a conexão atual da FAPESP opera na faixa de 10 Gigabits por segundo (Gbps).
O engraçado é que na época a internet não era tão diferente da Bitnet, em termos de usabilidade. Os pesquisadores usavam a rede basicamente para trocar mensagens eletrônicas com cientistas de outras instituições acadêmicas. A grande novidade era o fato de que os endereços de email agora faziam parte do domínio “.br”.
Em 1992 a RNP já tinha implementado uma rede de abrangência nacional, interligando 11 capitais brasileiras por meio de uma malha de 9.600 bps. Já as conexões entre Brasília, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre possuíam links de 64.000 bps.
Outra novidade neste mesmo ano foi o aparecimento de organizações que passaram a agir localmente, em nível estadual. A Rede Rio, por exemplo, conectava instituições de ensino do Rio de Janeiro usando enlaces de 64.000 bps. Mais tarde a instituição se ligou à California Education and Research Federation Network), no Centro de Computação de San Diego, Estados Unidos.
No estado de São Paulo surgiu a Academic Network at São Paulo (ANSP), que interligou a Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade Estadual Paulista (Unesp), e o IPT, Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo.
Nesse período a conexão que ligava a FAPESP ao Fermilab também ganhou um upgrade, passando a trafegar dados a 64 Kilobits por segundo (Kbps; 64 mil bps). Além disso, também surgiram redes estaduais em Minas Gerais, Pernambuco, Rio Grande do Sul e no Distrito Federal.
A internet começa a ficar ainda mais interessante com o surgimento da World Wide Web (WWW), em 1990. O responsável por escrever o protocolo HTTP, que possibilita a transferência de páginas web para os navegadores, foi Timothy Berners-Lee, que participou recentemente como palestrante na Campus Party Brasil.
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Em 1993 os pesquisadores da Universidade de Illinois Urbana-Champaign criaram o Mosaic, o primeiro browser a funcionar no Windows, o que também favoreceu uma popularização maior da web.
Em 1994, a internet finalmente sai do nicho acadêmico e passa a ser comercializada para o público em geral. No Brasil, a EMBRATEL lança o Serviço Internet Comercial, em caráter experimental e com conexão internacional de 256 Kbps. Cinco mil usuários foram escolhidos para testar o serviço.
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Em maio de 1995 o serviço começou a funcionar de forma definitiva e, para evitar o monopólio estatal da internet no Brasil, o Ministério das Comunicações tornou pública a sua posição a favor da exploração comercial da rede mundial no país.
A internet passou a ser capa de revistas e até assunto de novela, se popularizando cada vez mais, crescendo de maneira espantosa. Em 1996 foram lançados grandes portais e provedores de conexão à rede no Brasil e, em 1998, o país já ocupava o 19º lugar em número de hosts no mundo e o liderava o pódio na América do Sul. No continente americano, ficava atrás apenas dos Estados Unidos e Canadá.
Já estava consolidado o uso da internet no Brasil. Quase dez anos depois, em 2007, o Brasil movimentava cerca de 114 bilhões de dólares em comércio eletrônico e possuía uma base de 40 milhões de computadores instalados no país. De acordo com o Ibope/NetRatings, tínhamos cerca de 18 milhões de internautas residenciais.
Softwares das décadas passadas
Nesses vinte anos de internet no Brasil, muita coisa mudou. Hoje a rede mundial está muito mais presente em nosso cotidiano e se tornou um dos principais meios de comunicação e de entretenimento do país. Além disso, o comércio eletrônico passou a ser uma exigência para empresas, mesmo que sejam de pequeno porte.
E para podermos traçar um comparativo, que tal darmos uma olhada nas tecnologias que dominavam a internet no passado?
Web browsers
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Como já citamos anteriormente, o Mosaic foi o navegador responsável por popularizar a World Wide Web. Com a versão inicial (0.5) lançada em janeiro de 1993, o browser também servia como um cliente para protocolos de transferência de arquivos (FTP), leitura de fóruns de discussão via Usenet (NNTP) e Gopher, uma espécie de predecessor da WWW.
O software começou a ser desenvolvido no final de 1992, pelos engenheiros Marc Andreessen e Eric Bina, do Centro Nacional de Aplicações de Supercomputação (NCSA), na Universidade de Illinois Urbana Champaign. O Mosaic foi aperfeiçoado até janeiro de 1997, quando foi oficialmente descontinuado.
Por causa de tanta popularidade, muita gente pensa que o navegador do NCSA foi o primeiro browser a surgir. Mas a verdade é que o Mosaic foi precedido por dois outros navegadores, o Erwise e o ViolaWWW.
O Erwise foi lançado em abril de 1992 e foi o primeiro navegador web a usar uma interface gráfica de interação com o usuário. O software foi desenvolvido para funcionar com o sistema operacional Unix, e foi concebido como projeto de mestrado de quatro estudantes finlandeses da Universidade de Tecnologia de Helsinque: Kim Nyberg, Teemu Rantanen, Kati Suominen and Kari Sydänmaanlakka.
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Dizem que Timothy Berners-Lee, criador da WWW, viajou até a Finlândia para incentivar os estudantes a continuarem com o desenvolvimento do Erwise, que havia sido interrompido depois que todos se formaram. Infelizmente o projeto não vingou por falta de patrocínio.
Já o ViolaWWW teve uma carreira bem mais popular. O navegador, desenvolvido por Pei-Yuan Wei na Universidade da Califórnia em Berkley, na época chegou até a ser recomendado como browser ideal pela Organização Europeia para a Investigação Nuclear (CERN).
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A primeira versão do ViolaWWW saiu em abril de 1992, também para o sistema Unix. Foi o primeiro navegador a ter suporte para folhas de estilo e tabelas, além de scripts embarcados e formulários para a entrada de informações.
Clientes de email
Um dos primeiros clientes de email a ter uma interface com o usuário, ainda que em modo texto, foi o Elm. Criado por volta de 1986, ele oferecia aos usuários a possibilidade de responder e repassar mensagens com atalhos fornecidos em uma linha de comando.
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A última versão do Elm foi lançada em 2005 e, por incrível que pareça, ainda está em desenvolvimento, mesmo que funcione apenas em modo texto e em sistemas Unix. Hoje esse cliente de email tem funções mais avançadas, como a possibilidade de ordenar as mensagens por data ou nome, além de poder lidar com anexos e ter uma interface mais visual.
Um dos concorrentes do Elm foi o MUTT, lançado em 1996 e que trouxe novidades de peso, como a possibilidade de ordenar as mensagens por assunto (threads) e de utilizar os protocolos POP e IMAP.
Outros clientes de email popular na época foi o Citadel/UX, que tinha suporte para criptografia SSL e para diversos protocolos de email, além de possibilitar que seus usuários compartilhassem agendas.
Além desse, também podemos destacar o Eudora, que nasceu em 1988 e o YAM, que tinha suporte para múltiplos usuários, hierarquia ilimitada de pastas, filtros, interface configurável e diversas funções que fazem parte ainda hoje dos clientes de email mais modernos.
E acredite, naquela época também já existiam spammers. O primeiro registro de que se tem notícia de um spam foi sobre o anúncio de um novo sistema de computador em 1973, enviado para mais de 600 usuários da ARPANET, que tiveram seus endereços digitados manualmente pelo spammer. Haja paciência!
Comunicação instantânea
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MSN? Google Talk? Nada disso! Os primeiros softwares de comunicação instantânea não tinham nem um servidor central, em que os usuários se conectavam. A comunicação era feita no estilo peer-to-peer, ponta a ponta.
O comando talk, do Unix, foi muito popular durante os anos 80 e início da década de 90. Uma característica curiosa era o fato de que a mensagem era enviada letra a letra e, portanto, a outra ponta podia ler as palavras à medida que elas eram digitadas.
Outro sistema muito popular e bem mais moderno é o Internet Relay Chat (IRC). Inventado em 1988, o protocolo foi desenvolvido para possibilitar a comunicação em grupo, em salas de bate-papo chamadas de “canais”. Porém, o sistema também possibilitava conversas privadas e até mesmo troca de arquivos.
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Engana-se quem pensa que o IRC está morto e que usar o mIRC é coisa do passado. Em maio de 2009, os cem principais servidores de IRC da internet proporcionaram conversas entre mais de meio milhão de usuários, distribuídos em centenas de milhares de canais. É comum encontrar canais dedicados a projetos de software livre em redes como a Freenode e OTFC, em que desenvolvedores e usuários discutem os rumos de cada projeto.
Em meados dos anos 90 começaram a surgir os clientes de mensagem instantânea mais parecidos com o que temos hoje dia. Entre eles destacam-se o PowPow, desenvolvido pela empresa Tribal Voice, o AOL Instant Messenger (AIM), ainda em desenvolvimento e uso, e o famoso ICQ, que teve sua primeira versão lançado em 1996 e foi o primeiro software desse tipo a ser amplamente utilizado na internet.
Os sites do passado
Pouca gente sabe, mas existe uma espécie de museu online que guarda cópias dos sites ao longo dos anos. A Wayback Machine é uma máquina do tempo virtual, mantida pela Internet Archive, uma organização sem fins lucrativos com base em São Francisco, Califórnia.
Ao visitar o site do projeto, o usuário pode ver como eram as páginas anos atrás e até navegar por elas. Quer ver como era o Baixaki em 2001, por exemplo? Então acesse a Wayback Machine, digite o endereço https://www.baixaki.com.br no campo para entrada de texto, e clique no botão “Show All”. Depois, basta navegar pelo calendário e pela história do site.
Aproveite e confira também como eram as páginas iniciais do Yahoo! em 1996, do Google em 1998 e do portal Terra, em 2000.
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