Todo mundo tem um amigo nerd, certo? Até aí, nada demais. O problema é que, no meu caso, o meu é quase um Sheldon Cooper. Até parece que o cara saiu de um episódio de The Big Bang Theory só para me atormentar.
Eles não são parecidos fisicamente. O Alberto não é tão magro ou tão alto quanto o Dr. Cooper. Porém, eles são muito semelhantes psicologicamente. O gênio aqui da rua tem até o mesmo alto índice de antissociabilidade do personagem da TV.
Quer um exemplo? Com as festas de fim de ano se aproximando, é comum a galera do colégio organizar um amigo-secreto e uma pequena festa para a troca de presentes. Tudo corria bem, até convidarem o Alberto para participar da brincadeira.
— Isso parece muito irracional.
— Como assim, Alberto?
— Oras, pense comigo. Você quer um presente. Eu quero um presente. Você compra um presente para mim e eu compro um para você. Aparentemente, nada demais. Mas se pararmos para analisar, essa é uma situação completamente irracional e muito pouco otimizada.
— Não entendi. O que você sugere?
— Jovem Padawan, você já foi mais esperto. A maneira de otimizar essa situação irracional e baseada em meras carências humanas seria cada um de nós comprar o seu próprio presente. Assim, economizaríamos tempo, dinheiro e não perderíamos a aula que vocês pretendem sacrificar em nome dessa tal “festa americana”.
— Mas e a confraternização? A amizade?
— Esse é o problema de dar muito valor ao seu lado emocional. Em nome de sentimentos irracionais, as pessoas acabam dificultando um processo que poderia ser demasiadamente simples.
— Meu deus! Será que você não pode simplesmente se divertir?
— Estou confuso. Essa é uma pergunta retórica ou você está mesmo curioso?
— Quer saber? Deixe pra lá!
A tragédia do calor
Eu já estou acostumado a conviver com o Alberto. Como conheço a “peça” há muitos anos, acabo evitando, automaticamente, algumas expressões ou palavras que são cientificamente equivocadas. Infelizmente, nem todo mundo já aprendeu esse recurso estratégico.
Dia desses, voltando da aula, nosso amigo Milton conseguiu, sem querer, ativar o pedantismo do Alberto com poucas palavras:
— Nossa, estou com muito calor!
— Isso é impossível.
— Como assim? Veja esse sol! Está muito calor!
— Fisicamente, sua declaração não quer dizer nada. Calor se refere à energia térmica transferida de um corpo para o outro. Logo, a expressão que você deveria utilizar é “estou muito quente”, pois essa sim diz respeito à sua temperatura. Alternativamente, você também poderia dizer que o ambiente em que você se encontra está com uma energia térmica muito alta e que a transferência dessa energia para você está deixando-o muito desconfortável.
Depois dessa, meu amigo permaneceu calado pelo resto do trajeto. Não porque ele se sentiu ofendido, mas porque não gostaria de ativar o senso nerd do Alberto novamente.
Aumenta o som, DJ!
Depois de uma longa discussão, convencemos Alberto a ir a uma festinha da galera do colégio. Na verdade, chantageamos o sujeito: sequestramos os cabos de força do PS3 e do computador dele e dissemos que ele poderia buscá-los na festa. Obviamente, ele foi o primeiro a chegar.
Mas não seria tão fácil. Ele só veria aqueles cabos novamente ao fim da festa, quando todo mundo estivesse indo embora. Nesse meio tempo, tentamos fazê-lo dançar e até dar em cima de alguma garota. Mas nada feito.
De repente, vejo um conhecido gritar, muito animado: “aumenta o som, DJ!” Olhei para o Alberto quase que imediatamente. Ele estava nervoso e ameaçou se levantar por duas ou três vezes, até que não se conteve e foi falar com o menino que gritou para o “disc jockey”.
— Apesar de nunca ter visto você antes, preciso dizer que o seu pedido não faz sentido. O DJ não pode “aumentar o som”, como também não pode baixá-lo. É possível, no máximo, enfraquecê-lo ou fortalecê-lo. Quando você aumenta o volume, você deixa o som mais forte. É por isso, por exemplo, que a bateria do MP3 player acaba mais rápido quando o volume está no máximo.
Ainda me lembro da resposta do rapaz, gritada em meio ao funk ensurdecedor:
— Cara, eu não sei o que é que você está falando e nem escutei direito. Mas a festa está muito maneira! Uhuul!
Pesar é massa
Ir à farmácia com o Alberto também é complicado. Certa vez, estávamos na fila para pagar o remédio da minha mãe quando, de repente, duas senhoras resolvem usar a balança do local.
— E então, Olívia? Qual é o seu peso?
— Estou com 70 kg, menina!
Repentinamente, Alberto voltou sua atenção para a conversa das mulheres e começou a agitar os braços, feito um maluco, quase gritando com uma voz desesperadora:
— Não! Não! O peso não é medido em quilogramas!
—Desculpa, senhor?
— Oh, sinto-me lisonjeado pelo seu pedido de desculpas, mas mesmo assim é preciso explicar para vocês, leigas, que uma balança não mede o peso, mas sim a massa. Caso contrário, o valor exibido para a senhora seria 686,4655 Newtons, ou seja, sua massa de 70 kg multiplicada pela aceleração da gravidade, que é, aproximadamente, 9,80665 m/s².
As duas saíram rapidinho da farmácia, meio desorientadas, eu diria. E eu tive que aguentar o olhar perplexo de todos que estavam na fila.
E assim continua minha vida. Seja na rua onde moro ou na escola, o Alberto está sempre por perto para testar minha paciência. Mas no fundo ele é um cara bacana. Confesso que aprendo muita coisa sendo seu amigo. Só espero não estar como ele daqui a alguns anos.
...
Atenção: este artigo faz parte do quadro "Erro 404", publicado semanalmente no Baixaki e Tecmundo com o objetivo de trazer um texto divertido aos leitores do site. Algumas das informações publicadas aqui são fictícias, ou seja, não correspondem à realidade.
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