Com apenas 13 anos, o garoto Jack Dorsey desenvolveu um sistema que era capaz de calcular rotas para empresas de táxi em St. Louis, no Missouri (EUA). Autodidata, o jovem aprendeu a programar num PC da IBM comprado pela família e diz que nunca quis ser um programador, que apenas queria saber o que estava acontecendo em sua cidade, em tempo real.
“Comecei a desenhar mapas em um programa com a localização de ambulâncias e delegacias. Mas percebi em um ponto que faltava algo [nos mapas]. Não havia pessoas falando sobre o que estavam fazendo, e deste pensamento saiu o Twitter”, conta Dorsey, hoje um dos bilionários do Vale do Silício e fundador da famosa rede social.
Pensando em potencializar e encontrar desde cedo talentos como Gates, Zuckerberg, Jobs, Dorsey e outros, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, sugeriu que as escolas norte-americanas incentivassem a programação entre os estudantes, oferecendo cursos dessa área e de design gráfico em suas grades curriculares.
Dorsey (Twitter) e Zuckerberg (Facebook) são exemplos de talentos precoces da programação (Fonte das imagens: Wikimedia Commons/Reprodução/Facebook)
Obama afirma que o interesse dos mais novos pelo mundo digital e o conhecimento de linguagens de programação podem abrir novos caminhos no mercado de trabalho – mesmo para quem não tem um diploma universitário.
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Os pequenos programadores do Brasil
A realidade educacional do Brasil é diferente, mas já há iniciativas que vislumbram os jovens como futuros talentos da programação. Um desses programas de iniciação aproveitou o período de férias escolares para iniciar a criançada no caminho das variáveis, exceções e códigos.
Em uma semana, com cinco aulas de três horas apenas, uma turma de 13 “futuros Zuckerberg” vai desenvolver seu primeiro jogo. Essa é a expectativa do curso Game Design for Kids do Instituto de Artes Interativas (conhecido como “iai?”), em São Paulo, que usa o programa Scratch para guiar os primeiros passos de garotos de 9 a 15 anos para “dentro da Matrix”.
O software livre foi desenvolvido pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) e permite que os jogos criados sejam publicados e compartilhados na internet com facilidade. A ideia de começar a ensinar programação pelo desenvolvimento de jogos é aguçar a curiosidade das crianças para a realidade digital, afirma Lucas Longo, fundador da iai?.
“O curso abre bastante a cabeça dos alunos. Eles aprendem a dar valor ao que estão usando: computadores e celulares. No meu caso, quando comecei a programar, parei de comprar softwares piratas porque eu vi o trabalho que os desenvolvedores estavam tendo com a criação daqueles produtos”, comenta o criador do curso.
Longo projeta que saber uma linguagem de programação vai ser uma realidade cada dia mais presente para os brasileiros e vai até mesmo ganhar mais importância que algumas matérias escolares. “Aprender programação vai se tornar essencial. Acredito que seja mais importante do que algumas matérias que são ensinadas atualmente nas escolas, como química orgânica, por exemplo”, comenta o fundador do instituto.
(Fonte da imagem: TecMundo)
“O Instagram do futuro”
Dentro da sala de aula, o professor Eduardo Rossini conta que tem dificuldade em manter as crianças concentradas por muito tempo. “Elas querem avançar muito rápido. Você ensina como atirar na bruxa e eles já estão pensando em como o personagem vai explodir”, explica o instrutor, que também dá aulas de design de interfaces mobile para adultos na escola.
Após três dias de curso, Rossini está confiante no progresso feito por seus pequenos discípulos. “Dá para apostar que o Instagram do futuro pode sair dessa sala. Acredito que a turma vai formar, pelo menos, um bom programador”, comenta o professor.
Além de ajudar a desenvolver o raciocínio lógico, a programação pode preparar mais os jovens para o mercado do futuro, já que os aplicativos estão cada dia mais presente nas telas dos mais diversos dispositivos. Esse foi um dos incentivos que levaram Hae Vital a matricular seu filho, Lucas, 11 anos, no curso.
(Fonte da imagem: TecMundo)
“Na geração dele, o conhecimento em design e interatividade serão necessários. Não acho que é apenas um aprendizado lúdico”, explica Hae. A mãe ainda conta que diz para o filho não se sentir chateado quando algum amigo o chama de nerd na escola. “Eu digo para ele que ‘ser nerd’ significa ter uma grande chance de ser bem-sucedido no futuro”, afirma a mãe.
Sonhando alto
Enquanto criam condições e programam as ações de um jogo no Scratch, as crianças fazem perguntas e comemoram quando tudo funciona corretamente. O ambiente criado pelas brincadeiras e gritaria pode parecer caótico, mas funciona bem para a garotada.
Ao lado de Lucas, um dos alunos mais avançados da sala é o garoto Gabriel Kishido, 12 anos, que conta ter adorado a ideia dos pais de se matricular e estudar jogos nas férias, mas não tem a pretensão de se tornar um Mark Zuckerberg. Fã de Minecraft e outros jogos do estilo sandbox, as expectativas do garoto estão no mundo dos jogos. “Meu sonho é virar um programador e criar jogos diferenciados, como Diablo”, comenta Gabriel.
O trabalho com a linguagem de programação simplificada pelo programa também inspira Guilherme Estéfano, 15 anos. A ideia de mexer com números, variáveis e condicionais nas férias pode não atrair boa parte dos meninos, mas faz todo sentido para Guilherme. “Acho que é assim que o Leonardo Da Vinci se sentia quando dissecava os corpos para aprender anatomia. Era uma coisa que ele já conhecia, mas estava vendo como funcionava”, afirma Guilherme, citando o gênio do Renascimento.
(Fonte da imagem: Wikimedia Commons/Divulgação)
Fã de StarFox e outros games clássicos do Game Cube, o adolescente foi incentivado pelo tio, que fez outro curso no instituto. Com conhecimentos básicos em programas como Flash e MUGEN, Guilherme afirma que o interesse em games é a combinação de um hobby com um interesse para sua carreira profissional.
O idioma do futuro
Por outro lado, a turma de apenas 13 jovens demonstra que estamos distantes de uma realidade em que a linguagem de programação seja ensinada e prestigiada tanto quanto o aprendizado de idiomas estrangeiros.
“Não é todo mundo que vai gostar desse tipo de quebra-cabeça. O ideal é os pais baixarem o programa e darem para os filhos brincar. Se as crianças gostarem, é um bom começo. Programação não é para todo mundo, depende da aptidão.”, comenta Lucas Longo.
O fundador do iai? aposta na linguagem de programação como o idioma do futuro. Entretanto, um dos desafios é trazer mais meninas para a carreira, conhecida por ter uma quantidade maior de profissionais do sexo masculino. Longo afirma que as turmas voltadas para lógica de programação têm, no máximo, 5% de garotas matriculadas. Já nos cursos de design, uma carreira mais artística, há um índice maior de mulheres interessadas.
Aos pais, o educador deixa a dica de incentivar os filhos a programar. “O sonho é que a carreira de programador entre ao lado das de político e jogador de futebol na preferência dos pais para seus filhos”, brinca Longo.
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