Antes de 2020, os carregadores de celular serviam como o melhor exemplo de acessório que a gente nunca imaginou que pudesse ser removido da caixa dos aparelhos. Afinal, precisamos deles para garantir o funcionamento dos celulares.
Mas eis que vem a Apple como uma verdadeira defensora do planeta para nos salvar do desperdício, mostrando como os carregadores na verdade aumentam a nossa emissão de carbono global e contribuem para o acúmulo de lixo eletrônico.
E então, como todo mundo já tem carregadores em casa, eles anunciam que os próximos iPhones vão vir sem isso e sem fones na caixa. Dessa forma, as embalagens ficam menores e ajudam a otimizar o uso de espaço nos containers e a reduzir a emissão de poluentes.
Os argumentos são bem apresentados e, por mais que muitos fiquem revoltados e que a gente saiba que a justificativa real é apenas o lucro deles, no fundo parece que eles têm um bom motivo para justificar a ação dessa vez.
No entanto, quanto mais eu leio, pesquiso e penso a respeito, mais eu me convenço de que a realidade é outra e que simplesmente remover os carregadores das caixas dos smartphones é pior para o meio ambiente.
Carregadores viram lixo eletrônico
A Apple começou, e o negócio virou tendência na indústria. Um dos argumentos deles foi de que todo mundo já tem o carregador certo, por isso só o cabo já basta, mas aí, nos iPhones 12, ele mandam o cabo USB-C, que só funciona para quem ou já tinha comprado um acessório melhor, ou estava fazendo um upgrade direto do iPhone 11 Pro ou Pro Max, que foram os únicos a vir com esse tipo de carregador. Para os usuários que têm os básicos, esse cabo automaticamente se torna lixo eletrônico. A menos que eles comprem um novo.
Além disso, na mesma família do iPhone 12, a Apple traz como destaque o sistema magsafe de carregamento wireless que, pelo que os rumores indicam, aliás, vai ser obrigatório em aparelhos futuros da marca. Só que essa base nova não vem com os celulares. E pior, ela também não vem com o plug de tomada.
Então quem quiser esses acessórios também vai ter que comprar mais duas caixinhas diferentes. Sem falar que a recarga wireless é quase 50% menos eficiente que a feita via cabos, o que aumenta o consumo de energia elétrica e, portanto, é pior para o ambiente nesse sentido também. Percebe, Ivair, a petulância do cavalo?
Efeito dominó
Mas tudo bem, vamos ignorar essas inconsistências por alguns instantes e pensar na visão interna das empresas. Imagine que você é um executivo dessas companhias. Ao remover os carregadores e fones das caixas, elas ficam menores. Então eles não só conseguem fazer caber mais aparelhos por container e poluem menos assim, mas também estão contribuindo para gerar menos lixo eletrônico e tudo mais.
Você, como um bom executivo que é, faz algumas contas rápidas e calcula que, com isso, vai reduzir bastante a impressão de carbono e ao mesmo tempo economizar uma bolada com materiais.
Só que o mundo não acaba na empresa, e aí vem o efeito dominó. Eu não sei vocês, mas na época em que eu tinha meus próprios smartphones, quando eu trocava um antigo por um novo, eu não deixava guardado. O que a maioria das pessoas faz com celulares velhos é ou vender, ou passar adiante. E, nesses casos, você geralmente manda o carregador junto.
Mesmo que você tenha sido vidente, previsto que ia precisar do carregador e ficado com o seu quando deu um celular velho para alguém, a pessoa que recebeu o seu aparelho ainda vai precisar de um carregador, certo?
Isso ainda sem falar que tem outros problemas: os carregadores antigos eventualmente acabam estragando, são perdidos ou afanados, ou simplesmente não são tão rápidos quanto os mais modernos; como os smartphones atuais estão com baterias cada vez maiores, ficar com um carregador lento é uma desvantagem.
A produção de caixas diminuiu mesmo?
Então agora a gente faz uma conta: você compra um celular novo sem carregador e ele vem em uma caixinha menor e bonitinha. Só que você vai precisar de um carregador, e como ele não veio na mesma caixa, ele vai precisar de uma embalagem própria, que ocupa bem mais espaço do que se eles estivessem dentro de uma caixa de celular um pouco maior que essa.
Sendo assim, a gente já vê que o argumento da redução a favor do meio ambiente não dá muito certo. Mas fica pior, porque as embalagens que a gente recebe nas entregas não são só a do celular e a do carregador. A gente recebe cada uma delas dentro de uma caixa separada de papelão, geralmente forrada de bolhas de plástico, e até aqui já foram duas dessas.
Se você for entrar no mundo da recarga sem fios, aumenta a conta para três caixas. Se você não tem um fone de ouvido compatível com o conector do seu celular, que agora não tem mais entrada para fones normais, então vai ter que comprar um também, porque isso também foi tirado do pacote.
Agora são quatro caixas enormes de entrega e para cada uma delas provavelmente rolou uma viagem separada para envio até a sua casa, o que não ajuda na redução da poluição.
Os celulares têm caixa de som e não precisam dos fones para funcionar, então realmente esse acessório não é essencial e a gente até pode ignorar essa parte, embora muitas pessoas considerem esse ponto relevante.
Seja como for, por mais que eu não seja um cientista para fazer essas contas todas com precisão, eu ainda estaria disposto a apostar que tudo isso junto tem um impacto muito maior sobre o meio ambiente do que se o carregador simplesmente viesse na caixa.
As empresas não estão mentindo quando dizem que ao remover o item elas estão reduzindo o impacto no meio ambiente. Porém, o efeito disso é que o impacto de cada comprador sobre o meio ambiente aumenta. Resumindo: as empresas transferiram o peso delas para os consumidores, saíram com a imagem limpa e ainda lucram nesse processo. É assim que se faz negócios, crianças!
Afinal, como ajudar o meio ambiente?
Mas então o que as empresas poderiam fazer se realmente quisessem ajudar o meio ambiente? Bom, eu não tenho todas as respostas, mas uma opção que tem bom potencial é investir em carregadores melhores.
Um exemplo são os novos carregadores à base de nitreto de gálio, um material que consegue ser 25% mais eficiente do que o usado nos acessórios modernos, ao mesmo tempo em que permite fazer itens bastante potentes que ainda assim caberiam nas caixas menores dos celulares mais recentes.
Por serem mais eficientes, eles também aquecem menos, o que permite que durem mais tempo. Ou seja, em uma tacada, a gente gastaria menos energia, reduziria o uso de materiais, mais celulares por container poderiam ser mandados, não haveria aumento do envio separado de carregadores e demoraria mais tempo até que virassem lixo.
A Xiaomi, que tinha originalmente dado a entender que lançaria o Mi 11 sem carregador também, voltou atrás no lançamento global e não somente o deixou na caixa, mas o fez de nitreto de gálio. Vamos ver agora se eles continuam assim nos lançamentos futuros ou se serão discretamente removidos.
E você, o que acha sobre a remoção dos carregadores das caixas? Conte para nós aí nos comentários.
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