Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
A recente série documental Arnold, na Netflix, traz a vida e a carreira multifacetada de Arnold Schwarzenegger em três episódios, ilustrando o campeão de fisiculturismo, astro de Hollywood e político. Porém, uma visão pouco explorada do astro é a psicológica, que diferentemente de muitas das práticas físicas na musculação que Schwarzenegger adotava, tem bases científicas.
É hora de conhecê-la, pois podemos aproveitar dela para fazer mais exercícios e ter mais resultados.

A mentalidade de Arnold Schwarzenegger
Arnold Schwarzenegger reconhece a importância das necessidades psicológicas básicas nas atividades que performamos. Para ele, é preciso ter a mentalidade ARC (um acrônimo para autonomia, relacionamentos e competência) para se sentir mais motivado e construir melhores comportamentos e hábitos na vida.
Ele sugere perguntarmos a nós mesmos: “me sinto no controle das minhas decisões? Tenho bons relacionamentos com as pessoas ao meu redor? Me sinto competente em minhas ações?”. Esse exercício pode ser uma autoavaliação constante em nossos comportamentos, pois as necessidades psicológicas são ingredientes críticos para a motivação, relatou Schwarzenegger.
Sem dúvida, seu histórico muscular se destacou diante de sua visão psicológica, mas o segundo fator possibilitou a construção do primeiro, pois Arnold teve e ainda tem aderência aos exercícios físicos. Podemos explorar esses fatores para a nossa prática diária.

A base da mentalidade: uma teoria consolidada
Autonomia, relacionamentos e competência são necessidades psicológicas básicas do ser humano. Tal abordagem é proveniente de uma teoria motivacional chamada Teoria da Autodeterminação. Há anos, junto com colegas, tenho feito estudos sobre o tema e descoberto que a motivação — conceituada como a força que nos leva a agir — é amplamente investigada a partir dessa teoria.
Geralmente, pensamos em níveis altos e baixos de motivação, mas a teoria distingue níveis de motivação, sendo que os de melhor qualidade são relacionados à satisfação das necessidades psicológicas. Portanto, uma pessoa mais bem motivada tem autonomia para decidir a respeito de suas ações, sente-se competente para e após suas atividades e possui conexões sociais. A partir desse cenário positivo, pode realizar atividades com bem-estar e crescimento psicológico a longo prazo.

Na prática, o que significa?
Muitas pessoas podem se sentir desmotivadas por conta da frustração das necessidades psicológicas. Para um dos hábitos de saúde mais importantes — exercícios físicos —, a abordagem também é válida. Entretanto, a forma como o exercício físico tem sido promovido atualmente tem dificultado o suporte de tais necessidades: a influência das redes sociais que gera comparação ascendente, a pressão por desempenho ininterrupta, o isolamento social e os ambientes hostis de prática são alguns dos fatores que explicam a dificuldade.
Em um dos principais ambientes de exercícios — as academias —, uma pesquisa mostrou que as três necessidades foram os preditores de continuidade da prática de exercícios dos praticantes dentro dos seis primeiros meses. Mas como dar suporte para essas necessidades?
1. Autonomia
Ser protagonista das próprias ações é uma necessidade nossa, portanto, seja autêntico na modalidade e na forma com que se exercita. O que o influencer fitness faz provavelmente não é o melhor para você. Existem inúmeras opções de atividades e exercícios disponíveis e, dentro desses, variações diversas.
Como as diferentes maneiras de estimular os músculos para hipertrofia muscular, escolha aquela que gostar mais, pois estar no comando de suas escolhas é motivação. Para funcionar, o comportamento de exercício precisa ser livre e autônomo, sem ser pressionado para fazer e agindo por livre escolha.

2. Relacionamentos
Vínculos sociais entre as pessoas foram os mais fortes preditores que mantiveram as pessoas se exercitando nos três primeiros meses — período mais crítico para desistência — segundo pesquisa feita na Coreia. Ou seja, parece que se isolar socialmente não é uma boa estratégia.
Esteja aberto para relações sociais e estabeleça conexões profundas no ambiente, pois elas podem te direcionar ao comportamento desejado. Cercar-se de pessoas com os mesmos objetivos — e que te apoiem — é coerente. Seguindo a dica de Schwarzenegger, pergunte-se: “tenho bons relacionamentos no meu ambiente de exercício?”.
3. Competência
Se sentir competente no que faz é fundamental. Para isso, solicite o feedback de profissionais sobre os exercícios que realiza. Na musculação, você pode anotar suas cargas e compará-las, melhorar a execução dos exercícios e, sobretudo, valorizar o próprio comportamento de se manter ativo — o qual é raro entre as pessoas.
Considero as necessidades psicológicas o combustível da boa motivação. Elas são universais e essenciais para bem-estar e crescimento. Para exercícios bem-sucedidos, não bastam os aspectos físicos, mas também os psicológicos.
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Fábio Dominski é doutor em Ciências do Movimento Humano e graduado em Educação Física pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). É Professor universitário e pesquisador do Laboratório de Psicologia do Esporte e do Exercício (LAPE/UDESC). Faz divulgação científica nas redes sociais e em podcast disponível no Spotify. Autor do livro Exercício Físico e Ciência - Fatos e Mitos.