O que acontece com um satélite que ‘perdeu a validade’ no espaço?

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Satélites artificiais são equipamentos importantes para uma série de indústrias. Eles são usados para telecomunicações; nas ciências, em estudos como meteorologia; na navegação, para sinais como o GPS; e sustentabilidade, monitorando questões como desmatamento e queimadas.

Só que eles não ficam na órbita terrestre para sempre. Os satélites são descontinuados por vários motivos depois após a operação, substituídos por modelos iguais ou modernizados.

A partir desse ponto, surge um problema. O que fazer com um equipamento fora de operação no espaço? Entre deixá-lo por lá e trazer para a Terra existem obstáculos, iniciativas ainda distantes e um clima de urgência sobre o lixo espacial.

A rotina de trabalho no espaço

Satélites artificiais são lançados de bases de lançamentos por foguetes de empresas de transporte especializadas, como a SpaceX. Ao ganharem altitude, eles separam o módulo com a carga das estruturas do veículo espacial.

Tudo é calculado para que o satélite entre de forma precisa na órbita da Terra pelo movimento dos propulsores. Ao se estabelecer no local de operação, ele está oficialmente em funcionamento.

Amazonia-1, primeiro satélite de observação projetado e operado pelo Brasil. (Imagem: INPE/Divulgação)Amazonia-1, primeiro satélite de observação projetado e operado pelo Brasil. (Imagem: INPE/Divulgação)Fonte:  INPE 

O espaço é povoado por satélites artificiais de todos os tamanhos. Cada equipamento tem um conjunto de componentes para comunicação de dados, fornecimento de energia e posicionamento.

Eles são separados em duas grandes categorias: os de baixa órbita, mais próximos do planeta a uma altitude média de 1.500 km, e os geoestacionários, com período orbital igual ao da Terra, posição fixa altitude em torno de 36.000 km da superfície.

Uma central de controle de missão na Europa. (Imagem: Eumetsat/Divulgação)Uma central de controle de missão na Europa. (Imagem: Eumetsat/Divulgação)Fonte:  Eumetsat 

Centros de controle mantêm as operações, estabelecendo a comunicação com cada unidade em órbita. E são esses locais os responsáveis por desligar os sistemas quando os trabalhos são finalizados.

O fim da vida de um satélite

Assim como eletrônicos no geral, os satélites não podem trabalhar para sempre e eventualmente chegam a um limite. Isso acontece por vários motivos, como explica o coordenador-geral de Engenharia, Tecnologia e Ciências Espaciais do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), Adenilson Silva.

Em entrevista ao TecMundo, ele diz que dentre os fatores que definem a vida útil do satélite estão elementos dentro do planejamento, como orçamento do projeto, tempo da missão e qualidade dos componentes.

Satélites hoje Satélites hoje "disputam" espaço entre si. (Imagem: Getty Images)Fonte:  GettyImages 

Só que há condições que fogem ao controle da equipe. O equipamento se desgasta por fenômenos como a colisão de detritos e a radiação espacial. Além disso, o satélite lida com grandes variações de temperatura, gerados pelo movimento em direção do Sol.

Idealmente, o momento de descontinuar o satélite ocorre só após o fim da missão, que pode levar até décadas. E, quando isso acontece, começa uma dor de cabeça para os envolvidos.

Isso porque a sua "aposentadoria" traz um dilema. Se ele continuar no mesmo lugar, ocupa espaço que poderia ser usado por satélites funcionais. Caso seja movido, pode virar "lixo espacial" e corre o risco de colidir com satélites em operação.

"Isso é mais do que o suficiente para danificar seriamente ou destruir satélites e espaçonaves que estiverem em seu caminho, com isso prejudicando o sinal de internet, pesquisas científicas e a observação da Terra", afirma o gerente de projetos e operações da Viasat no Brasil, Felipe Merkel. A empresa de telecomunicações é uma das que promovem iniciativas no período de encerramento de atividades.

Aposentadoria com segurança

Um estudo entre pesquisadores e entidades como o Jet Propulsion Laboratory (JPL) da NASA previu o lixo espacial como um problema crescente. Segundo a pesquisa, 60 mil satélites vão orbitar a Terra em 2030, número muito maior que os atuais 9 mil.

Em outras palavras, o "congestionamento" de satélites tanto em funcionamento quanto desativados já é realidade. "A conclusão é de que, se não houver um uso organizado e racional do espaço, daqui a pouco ninguém vai conseguir fazer mais nada, porque vai ficar inviável", alerta Silva. Por isso, remover modelos desativados é prioridade.

Lixo espacial é especialmente perigoso em baixa órbita. (Imagem: Getty Images)Lixo espacial é especialmente perigoso em baixa órbita. (Imagem: Getty Images)Fonte:  GettyImages 

Como explica o coordenador do INPE, o fim de vida depende do tipo de satélite. No modelos de baixa órbita, o método é usar a reserva de combustível para acionar os propulsores e levá-lo a uma órbita menor. A cada ciclo, ele é freado até reentrar na atmosfera e queimar quase completamente.

Com os geoestacionários, a situação é diferente. Por estarem em uma altitude distante do planeta, eles não podem retornar — para isso, precisariam atravessar toda a zona de baixa órbita sob risco de colisões. Neste caso, ele é levado para órbitas mais altas, em um "cemitério" de satélites com ar bastante rarefeito, liberando espaço para que um modelo novo ocupe o lugar.

Satélites geoestacionários são maiores e mais pesados. (Imagem: Viasat/Divulgação)Satélites geoestacionários são maiores e mais pesados. (Imagem: Viasat/Divulgação)Fonte:  Viasat 

Apesar dos protocolos, nem sempre é isso que acontece. "O que ocorre ultimamente é que o satélite é usado até dar uma falha, não se pode mais comunicar com ele e o lixo fica por centenas de anos", detalha Silva.

O quanto isso afeta os projetos na prática? Como relata o Inpe, quase toda semana há um alerta de colisão com o satélite brasileiro Amazônia-1.

Por protocolo, o melhor é esperar que a trajetória do outro objeto se altere naturalmente. Se o alerta vermelho se mantém até poucas horas da colisão, o satélite precisa fazer uma manobra para deixar a órbita original e evitar o incidente.

E o futuro?

Para Merkel, o ideal para reduzir o lixo espacial é uma "abordagem multifacetada", misturando avanços tecnológicos, cooperação internacional e regulamentações efetivas.

A empresa japonesa Astroscale, por exemplo, apresentou uma possível solução. Ela consiste em um dispositivo que acopla a satélites no espaço e direciona eles de forma segura de volta à Terra, fazendo a faxina no espaço. O primeiro teste bem sucedido aconteceu em 2022 e a expectativa é de que as primeiras missões comerciais aconteçam em 2025.

Outra iniciativa é a ainda inexistente regulamentação internacional do espaço em baixa órbita, assim como ocorre em outras camadas da atmosfera. Sem ela, a exploração espacial pode ser bastante prejudicada em curto prazo.

Tecnicamente, há ainda a possibilidade de desenvolvimento de satélites menores e mais eficientes. Isso, porém, demanda um enorme investimento ainda pouco viável.

Como reforçam o coordenador-geral do INPE e o gerente da Viasat, o lixo espacial é uma ameaça significativa global e um desafio. Afinal, por mais grave que seja o problema, todo o segmento de satélites simplesmente não pode parar.

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