Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Após entendermos que megaeventos como as Olimpíadas infelizmente não conseguem impactar positivamente nos níveis de atividade física da população, é hora de explorar o porquê. Afinal, quais razões podem explicar que preferimos terceirizar o esforço físico em vez de nos divertir nos movimentando?
Estamos mais ou menos ativos?
A verdade é que o mundo está com poucas oportunidades de movimento. Passamos a maioria do último século inventando tecnologias que tornam o movimento humano desnecessário. Fomos efetivos nisso.
Os dados não mentem: 1/3 dos adultos está inativo fisicamente, ou seja, não faz atividade física suficiente. Entre crianças e adolescentes, o cenário é ainda pior. Mas considerando a história e evolução da nossa própria espécie - moldadas por movimento, isso não seria uma incompatibilidade?
O cérebro é sedentário, mas não inativo
O ambiente atual nos gera essa incompatibilidade, pois evoluímos para ser ativos fisicamente, mas também para conservar energia. A tendência humana de economizar esforços tem nos consumido no sofá de casa, pois o cérebro percebe o movimento físico como algo desnecessário no mundo de hoje.
- Descubra: Usar o celular atrapalha o treino?
Evitar ficar no sofá parece exigir uma resposta inibitória cerebral maior do que evitar atividades físicas, em pesquisa com eletroencefalografia em 29 homens e mulheres. O que demonstra que sair da inércia é mesmo difícil. Na verdade, no curto prazo não tem sido nem necessário levantar do sofá e se mover, pois o celular nos fornece tudo que precisamos para (sobre)viver.
A promoção de exercício nos (des)motiva
O modo como os exercícios têm sido promovidos na mídia não tem nos atraído, pois envolve uma narrativa limitada de remédio e isso não interessa quem não está doente. Além disso, muitos dos que buscam exercícios por estética, com fins de emagrecimento e/ou hipertrofia, se frustram devido à falta de resultados.
O exercício físico como experiência não tem nos interessado, portanto, estamos sem tempo para ele, sendo essa a principal barreira apontada pelas pessoas para a inatividade.
Na prática, como os exercícios têm sido prescritos e aplicados, tem gerado desprazer nas pessoas, pois elas se sentem mal praticando exercícios, especialmente devido à intensidade elevada.
O acesso à infraestrutura também é fator importante para a prática de exercícios e esportes.Fonte: GettyImages
Preferimos assistir a praticar
Se dermos oportunidade de escolha a uma criança para assistir ou praticar um esporte, provavelmente ela escolherá a segunda opção. Quando adultos, mudamos. Em pesquisa com britânicos sobre o uso de tempo e o quanto de prazer sentem em cada atividade, as atividades mais apreciadas foram durante o descanso ou lazer – como ir ao teatro, a eventos esportivos, brincar com crianças, ir a um restaurante ou bar, e dormir. Praticar esportes esteve na categoria abaixo, com média de 6 na avaliação do prazer, em escala de 1 a 7.
Esportes: um caminho?
Algo que poderia nos levantar do sofá são os esportes, que unem aspectos lúdicos que geram diversão, com socialização e competição. Essa mistura poderia favorecer a participação das pessoas que tem aversão ao esforço físico, pois pode distraí-las das sensações e percepções corporais.
Entretanto, talvez a prática esportiva tem sido rara devido ao isolamento e a falta de vínculos sociais entre as pessoas, minimizando o potencial dos esportes coletivos como experiência positiva na vida das pessoas.
Atividades esportivas em grupo, pode ser uma alternativa para quem busca incluir exercícios físicos a sua rotina. Fonte: Getty Images
A baixa percepção de competência para esportes nos assola, pois temos medo de experimentar novas modalidades, como as que nos são apresentadas pelas Olimpíadas, como escalada e skate, que são possíveis de serem praticadas no ambiente urbano, refletindo o que Pedro Calabrez e Clóvis de Barros Filho reconhecem no livro “Em busca de nós mesmos”: “Com o peso das responsabilidades da vida adulta e a redução dos hormônios que nos mantinham enérgicos na juventude, vem uma grande preguiça - de tudo. Preguiça de encarar coisas que nos desafiem e que nos obriguem a gastar energia. Existem dois exemplos óbvios: aprender coisas novas e praticar exercícios.”
Já pensou juntar esses dois? Aprender algo novo praticando um novo esporte ou exercício? Sempre temos um amigo que pratica uma modalidade diferente. Talvez seja o momento de experimentar.
***
Fábio Dominski é doutor em Ciências do Movimento Humano e graduado em Educação Física pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). É Professor universitário e pesquisador do Laboratório de Psicologia do Esporte e do Exercício (LAPE/UDESC). Faz divulgação científica nas redes sociais e em podcast disponível no Spotify. Autor do livro Exercício Físico e Ciência - Fatos e Mitos.