Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
O maior estudo realizado até hoje sobre exercícios físicos e depressão acaba de ser publicado na BMJ, famosa revista científica médica. Maior no sentido de número de estudos – mais de duzentos, pois é uma revisão, e não em número de pessoas.
Essa é a diferença do estudo mais recente que permite melhores e mais fortes conclusões sobre os resultados. Não é apenas um único estudo com muitas pessoas, é uma meta-análise, que inclui cálculos sobre estudos relevantes sobre o tema, representando o mais robusto conjunto de evidências.
Quais foram os resultados do estudo que abrange exercício e depressão?
A notícia geral e mais importante do estudo é que ele reforça o exercício como tratamento para depressão, pois vários tipos de exercício parecem exercer efeitos benéficos.
Estamos falando de exercício físico e não de atividade física, que pode ocorrer em situações cotidianas como lavar a louça, limpar a casa ou carregar compras.
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Diversas modalidades de exercício podem ser aliadas contra a depressãoFonte: GettyImages
Quais foram as melhores modalidades para tratar depressão?
O exercício físico é um tipo de atividade física, mas organizado e repetitivo, como uma caminhada ou corrida no parque. Essas formas foram, junto com treinamento de força e Yoga, as modalidades de exercícios mais efetivas para tratar depressão no mais recente estudo. As duas últimas ainda foram mais bem toleradas pelos pacientes e tiveram menos desistências.
O yoga, em especial, pode ser visto como “a cessação ou diminuição das flutuações da mente”, conforme traz Pedro Casagrande – Profissional e Doutor em Educação Física e Professor de Yoga, que considera o Yoga uma prática integral que tem como objetivo um olhar e aprendizado sobre a mente através do corpo.
Na prática, o yoga utiliza diversas técnicas (posturas psicofísicas, exercícios respiratórios, meditação, relaxamento, entre outras), que podem levar o praticante a um processo de interiorização e atenção plena sobre cada movimento e em cada respiração, o que o conduz a todo momento perceber e lidar com as oscilações da mente, ou seja, com os próprios pensamentos.
“Esse caminho de prática e auto-observação conduz o praticante a compreender melhor os seus próprios processos mentais. Por isso pode-se obter resultados positivos com Yoga para saúde mental, não somente pelo componente do exercício que as posturas possuem, mas em especial pelo trabalho corpo-mente que a prática propõe”, destaca Casagrande.
Ele ressalta que: “Na prática, o Yoga não busca analisar os pensamentos como a terapia, mas a prática meditativa leva a uma dissolução dos mesmos, diminuindo o barulho mental e pensamento excessivo, além do impacto negativo de pensamentos ruminativos e depreciativos, aumentando a clareza mental e a possibilidade de viver melhor o momento presente”.
Yoga para saúde mentalFonte: GettyImages
Uma associação de dose-resposta foi encontrada em relação à intensidade do exercício e os efeitos antidepressivos. Maior intensidade, maiores benefícios.
Um aspecto a ser considerado é a dificuldade de as pessoas manterem exercícios de alta intensidade na rotina, uma vez que a maioria sente desprazer durante a prática mais intensa. A boa notícia é que mesmo atividades de baixa intensidade, como a caminhada, tiveram efeitos positivos.
Além disso, grandes efeitos antidepressivos foram reportados a partir da dança, mas o baixo número de estudos limitou a conclusão dessa forma de exercícios como efetiva.
Em geral, o exercício em grupo não foi mais eficaz do que o exercício individual, exceto no yoga. O que nos traz avanços, considerando que no passado considerávamos mais os efeitos antidepressivos do aspecto social, mas claramente não foi o caso encontrado nesse estudo, que atribui os efeitos mais ao exercício em si.
Como o exercício trata depressão?
Os mecanismos exatos ainda não são totalmente conhecidos, mas a cada dia a ciência descobre um pouco mais. Um conjunto de fatores é utilizado para explicar os efeitos, que vão desde a distração dos pensamentos ruins, passando pelo coquetel de neurotransmissores produzidos durante o movimento, até dormir melhor à noite.
Na verdade, quando nos mexemos ligamos simultaneamente pelo menos quatro interruptores que ativam efeitos sobre a saúde mental: o neurobiológico, o psicossocial, o comportamental e o do sistema imune.
O exercício atua via diferentes mecanismos para melhorar a saúde mentalFonte: GettyImages
Exercícios, medicamentos ou terapia?
Parece que a combinação dos três é a melhor forma de tratar depressão. O tamanho do efeito do exercício foi comparável ao da terapia cognitivo-comportamental, mas a qualidade das evidências que apoiam tal terapia foi superior.
O efeito do exercício pareceu superior ao dos antidepressivos, embora quando o exercício foi combinado com antidepressivos o efeito dos medicamentos melhorou.
Segundo esse estudo, médicos podem agora recomendar exercícios, psicoterapia ou antidepressivos como alternativas independentes para adultos com depressão leve ou moderada. A escolha final depende da preferência do paciente e de outras considerações, incluindo quaisquer barreiras de acesso.
Precisamos de uma mudança cultural em relação a como pensamos e prescrevemos o tratamento para depressão, não considerando o exercício como uma panaceia, coisa que ele não é, mas adicionando como terapia complementar às demais – medicamentos antidepressivos e psicoterapia.
A ciência descobre cada vez mais que o maior benefício de se movimentar talvez seja sobre o que temos entre as duas orelhas.
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Fábio Dominski é doutor em Ciências do Movimento Humano e graduado em Educação Física pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). É Professor universitário e pesquisador do Laboratório de Psicologia do Esporte e do Exercício (LAPE/UDESC). Faz divulgação científica nas redes sociais e em podcast disponível no Spotify. Autor do livro Exercício Físico e Ciência - Fatos e Mitos.
Fontes