Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Como são ruins crises de ansiedade. Uma aflição enorme e sintomas somáticos que parecem uma tortura e as vezes nem sabemos por quê. Mas o fato é que é um transtorno comum, cada vez mais prevalente. Além dos tratamentos tradicionais como psicoterapia e medicamentos, temos o exercício físico. Entenda o que acontece no cérebro quando nos exercitamos, como o exercício produz efeitos ansiolíticos.
Apesar das ligações entre exercício e ansiedade, como pessoas mais ativas com menor risco de desenvolver ansiedade, em cerca de 27%, pouco se sabe sobre os mecanismos que estão por trás de suas interações. O exercício provoca uma infinidade de mudanças adaptativas em todo o corpo e cérebro, o que torna um desafio saber quais mecanismos tem ação ansiolítica. Mas vamos ao que entendemos até agora.
Começamos do mais simples. Os fatores psicosociais. O primeiro deles é a simples distração. O exercício te distrai de pensamentos ruminativos. Ruminação vem dos animais ruminantes que mastigam novamente o alimento que retorna do estômago, ou seja, uma série de pensamentos negativos repetitivos por um longo tempo. Quando estamos ansiosos pensamos demais, não é mesmo? Uma sessão de exercícios quebra isso e ajuda no humor.
O exercício pode aumentar a autoestima e a percepção de competência, o que pode contribuir para aliviar os sintomas de ansiedade, além da oportunidade de socialização. A interação social pode melhorar o bem-estar psicológico, pois há prazer derivado de estar com outras pessoas.
Outro papel importante do exercício é na redução da sensibilidade à ansiedade por meio da exposição aos sintomas fisiológicos da ansiedade em um treino: frequência cardíaca aumentada, sudorese, respiração ofegante, mas sem os pensamentos negativos de uma crise de ansiedade. É como se fosse uma simulação para te dessensibilizar à ansiedade. O exercício mostra que esses sintomas são desconfortáveis, mas suportáveis e passam.
Autoeficácia, prazer, senso de escolha e de pertencimento também exercem papel importante dentro dos mecanismos psicossociais do exercício sobre a ansiedade. Traduzindo: você se sente capaz, pode sentir prazer, se sentindo protagonista da sua vida e pertencendo a um grupo, como a turma de CrossFit das 6 horas da manhã.
O exercício pode promover redução da sensibilidade à ansiedade por meio da exposição aos sintomas fisiológicos da ansiedade.Fonte: Getty Images
Neurobiologicamente, há uma gama de fatores complexos que foram demonstrados em pesquisas com animais e em um número crescente de estudos clínicos em humanos. As reações químicas no cérebro contribuem para o efeito antiansiedade do exercício, através da liberação de BNDF (fator neurotrófico derivado do cérebro), serotonina, dopamina, redução de citocinas inflamatórias e cortisol e alteração de vias estruturais no cérebro, por exemplo, o hipocampo e o córtex pré-frontal.
O BNDF merece destaque pois age como um fertilizante no cérebro, ajudando a estimular a atividade no cérebro a curto e longo prazo, aumentando notavelmente as conexões (sinapses) entre áreas chave do cérebro e no crescimento de novas células nervosas. Ele é um marcador de neuroregeneração, indicando que se movimentar pode auxiliar no processo. A ação no equilíbrio entre marcadores inflamatórios/anti-inflamatórios e marcadores oxidativos/antioxidantes também é papel da atividade física.
A serotonina influencia o humor e a dopamina é um neurotransmissor de recompensa e proporciona uma sensação de realização. Endorfinas geram bem-estar, mas são moléculas que têm dificuldade em atravessar a barreira hematoencefálica sozinhas, a menos que sejam combinadas com outras moléculas. Coisa que os endocanabinoides fazem.
Os endocanabionoides são neurotransmissores que se ligam aos receptores canabinóides no cérebro, causando efeitos semelhantes aos do componente ativo da cannabis, por isso o nome, caracterizando sintomas como relaxamento, redução do estresse e alívio da dor. Tudo isso sem efeitos colaterais.
Outra resposta fisiológica importante ao exercício, é em nosso sistema central de resposta ao estresse fisiológico - o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA) e o sistema nervoso autônomo (simpático e parassimpático). Pessoas ansiosas tem o sistema nervoso simpático em estado de alerta elevado.
O exercício aeróbico regular está associado a uma ativação do eixo HPA mais baixo e menor reatividade do sistema nervoso simpático, assim como amígdalas cerebrais, que estimuladas podem levar a um estado de vigilância ou atenção aumentada, ansiedade e medo. Em pesquisa na Alemanha, foi verificado que uma caminhada de 60 minutos na natureza reduziu a ativação das amígdalas, enquanto em ambiente urbano isso não aconteceu.
O contato com ambientes naturais pode favorecer o tratamento da ansiedade.Fonte: Getty Images
Não há um consenso sobre a frequência, intensidade, tipo e duração dos exercícios ideais para tratar ansiedade. Mas uma coisa tem sido recomendada quando falamos de saúde mental: qualquer exercício é melhor do que nada. É importante, sobretudo, que você escolha uma modalidade que goste em ambiente agradável.
Recentemente, pesquisas tem demonstrado vantagens do ambiente natural para alguns distúrbios de saúde mental, incluindo ansiedade. O contato com a natureza, aliado aos benefícios do exercício pode te trazer novos ares e alívio da cruel ansiedade, como caminhar ou correr em uma trilha.
Exercício físico é um poderoso fármaco natural antiansiedade, com baixíssimo risco de efeitos colaterais e elevado potencial de mudar sua vida, para melhor, atuando desde a simples distração de pensamentos ruins até transformações estruturais no cérebro.
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Fábio Dominski é doutor em Ciências do Movimento Humano e graduado em Educação Física pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). É Professor universitário e pesquisador do Laboratório de Psicologia do Esporte e do Exercício (LAPE/CEFID/UDESC). É autor do livro Exercício Físico e Ciência - Fatos e Mitos, e apresenta o programa Exercício Físico e Ciência na rádio UDESC Joinvile (91,9 FM); o programa também está disponível em podcast no Spotify.
Fontes