A pandemia pela Covid-19 causou a morte de quase 7 milhões de pessoas no mundo desde 2020. É provável que esse número esteja subestimado. Essa subnotificação de óbitos por Covid-19 varia de 10%, como no Reino Unido, a 1000%, como na Índia. Baseado no dado de excesso de óbitos, ocorreram 16% mais óbitos do que o número de óbitos notificados pela COVID-19 (1).
Mas será que essa diferença se dá puramente por óbitos causados diretamente pelo SARS-CoV-2? Já é sabido que ter tido um teste reagente aumenta em 100% a chance de um infarto agudo do miocárdio (IAM) e em 60% as chances de um acidente vascular cerebral (AVC)(2). Um estudo com a população americana verificou que houve um excesso de óbitos em 5% por causas cardiovasculares entre 2020 e 2023 (3). Esse aumento no risco pode perdurar por um período de 1 ano e talvez mais.
Pessoas que já foram reagentes ao Covid-19 pode ter maiores chances de desenvolver problemas cardiovasculares.
Mas 5% parece pouco, não? Cuidado. As causas cardiovasculares correspondem à principal causa de óbito no mundo. Só no ano de 2019 ocorreram 19,6 milhões de óbitos por essas causas no mundo (4). Se extrapolarmos o dado americano para o restante do mundo, podemos estimar que, em decorrência indireta da Covid-19, ocorreriam 1 milhão de óbitos a mais por causas cardiovasculares ao ano. Esses óbitos não estão contabilizados como óbitos por Coronavírus, uma vez que ocorrem tardiamente e não há um vínculo direto entre os eventos.
Já são 3 anos de pandemia, com média de óbitos de 2,3 milhões de óbitos ao ano. Esses números estão felizmente caindo e há perspectiva de que caia para menos de 1 milhão em 2023. O risco de óbito por COVID-19 está caindo em grande parte devido à imunização.
É possível que o aumento no risco cardiovascular gerado pela infecção ao Covid-19 se mantenha. Se essa hipótese for verdadeira, ou mesmo que a imunidade atue favoravelmente na diminuição do risco cardiovascular gerado pelo Coronavírus, mas em um ritmo menor comparada à letalidade da doença pulmonar e inflamatória durante a fase aguda, a longo prazo, o SARS-CoV-2 irá matar mais por causas cardiovasculares do que pela fase aguda.
Essa hipótese têm lógica, pois já ocorre com outras doenças infecto-contagiosas como o influenza. O risco de IAM é de 6 a 10 vezes maior na semana seguinte à infecção por influenza. O risco de AVC, da mesma forma, é aumentada em 3 a 8 vezes, mesmo semanas após o quadro gripal.
A vacina para influenza, além de proteger contra hospitalizações e óbitos pela infecção, reduz em 18% o risco de óbito por causas cardiovasculares. A vacina para COVID-19, por sua vez, reduz também o risco de IAM e AVC em 2x comparado aos não vacinados. Ou seja, são impactos e proteção bastante semelhantes aos já vistos pelo influenza.
O que se pode fazer diante desse cenário? As mesmas medidas que já conhecemos. Evitar a infecção, especialmente por quem está em situação de maior vulnerabilidade como os idosos e os que possuem comorbidades (especialmente cardiovasculares).
Esses são, particularmente, os que possuem também maior risco cardiovascular, onde agregar risco gera maior impacto. É desejável também que o indivíduo esteja em dia com a saúde cardiovascular, visando tratar ou evitar fatores de risco como obesidade, sedentarismo, tabagismo, dislipidemia e doenças como hipertensão e diabetes.
O período mais crítico da pandemia já passou, mas não devemos menosprezar o efeitos daqui para frente, através da Covid-19 longa e aumento no risco cardiovascular.
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