Nesta semana, cientistas brasileiros de norte a sul participaram de uma manifestação virtual no Twitter (tuitaço) contra o corte de verbas para o CNPq e a Capes, principais agências de financiamento de pesquisas no país. A mobilização aconteceu após a renúncia coletiva de 52 pesquisadores vinculados ao MEC.
Hoje, é o último dia para o governo mandar ao Congresso o PLN que reconstitui o orçamento do #CNPq.
— Eduardo Tarazona Santos (@tarazona_santos) November 30, 2021
PLN é um nome técnico dos projetos de lei de iniciativa exclusiva do Poder Executivo, que liberam créditos no orçamento.
A SBPC a publicarem a hashtag #SOSCNPQ.
O movimento foi levantado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
BORA DE TUITAÇO!? Vamos levantar a #SOSCIÊNCIA! pic.twitter.com/ZJlL6dn0ih
— SBPC (@SBPCnet) November 23, 2021
A SBPC é a principal organização de cientistas do país. Fundada em 1948, a entidade atua no aperfeiçoamento do sistema nacional de ciência e tecnologia, e na difusão da ciência no País. Além do tuitaço, houve ato presencial em frente ao ministério da economia e ato virtual transmitido via YouTube.
Alguns pesquisadores aproveitaram para comentar as dificuldades e perrengues enfrentados no país. A intenção foi atrair a atenção da comunidade científica internacional para a situação de calamidade da pesquisa aqui.
It is Summer in Brazil now, and also the rainy season, so we get to discover where in the lab the ever-changing cracks in our ceiling now allow rainwater to drip through. This year we were lucky: the main leak (and it is substantial!) is right where we keep our plate reader.
— Alicia Kowaltowski (@AJKowaltowski) November 23, 2021
"É verão no Brasil agora, e também a estação chuvosa, então nós descobrimos os lugares onde as rachaduras do teto, que sempre mudam, permitem agora o vazamento da água da chuva. Esse ano tivemos sorte: a principal goteira (e ela é substâncial!) é justamente no lugar onde nós deixamos nosso leitor de placas."
I say we are lucky because the plate reader isn´t currently there: it broke down months ago, and we sent it out for repairs, which are delayed while they import parts. Importing anything here takes at least 3 months. So our main leak in the lab is on a currently empty benchtop.
— Alicia Kowaltowski (@AJKowaltowski) November 23, 2021
"E eu digo sorte porque o leitor de placas não está atualmente lá: ele quebrou meses atrás, e nós o enviamos para reparo, que está atrasado enquantos as partes importantes dele [não chegam]. Importar qualquer coisa aqui leva no mínimo 3 meses. Então nossa goteira principal no lab está uma bancada vazia agora."
Adesão de universidades e pesquisadores
A mobilização foi endossada por universidades públicas do país, como a Universidade Federal de Uberlândia (UFU), que aproveitou para divulgar pesquisas relacionadas ao coronavírus.
Ciência não é gasto, é investimento. Investir na ciência é investir no futuro. O desenvolvimento científico é um dos pilares para o avanço da humanidade. A UFU participa da campanha #SOSCIÊNCIA. Na foto, nossos cientistas que pesquisam variantes do coronavírus. pic.twitter.com/HPCeAcHvi2
— UFU (@UFU_Oficial) November 23, 2021
Durante o último governo, o orçamento da ciência tem sofridos grandes cortes, criando precariedade na área. O CNPq, agência de fomento nacional vinculada ao MCTI, sofreu um apagão no servidor esse ano por falta de verba, causando transtornos para pesquisadores. O problema demorou 20 dias para ser resolvido.
O corte mais recente foi de R$ 600 milhões, sancionado pelo presidente no dia 15 de outubro, comprometendo de forma grave a distribuição de novas bolsas e a atividade de fomento à pesquisa do CNPq #SOSCIÊNCIA
— carmen rial (@carmenrial) November 29, 2021
O corte de verbas reduz o dinheiro disponível para a realização de pesquisas. Estudos importantes, como do HIV e do câncer, são ameaçados pela falta de dinheiro. O governo aprovou agora mais um corte de R$600 milhões, que gerou a mobilização.
CNPq e CAPES ajudaram muito a colocar o país entre os melhores do mundo em pesquisa. Mas o investimento de vários anos pode se perder se não for possível dar andamento às pesquisas #SOSCNPQ #SOSCAPES #cienciasalvavidas
— Lucia Vacina&PFF2 Pellanda (@lupellanda) November 30, 2021
A Capes, vinculada ao MEC, foi outro órgão de fomento mencionado. Voltada à formação profissional, é a principal pagadora de bolsas na graduação e pós-graduação no Brasil.
A @CAPES_Oficial qualifica a mão de obra brasileira em todas as áreas do conhecimento e nos diferentes ramos de atuação da sociedade; capacita profissionais a conduzir o país a um horizonte de sabedoria, prosperidade e igualdade. #EmDefesadaPósGraduação #SOSCAPES pic.twitter.com/6LfNa1CmbN
— Daniel Martins-de-Souza (@dms_unicamp) November 29, 2021
Sem a CAPES eu não estaria fazendo meu Doutorado e precisaria decidir em me dedicar aos estudos sem receber bolsa ou trabalhar, é quase impossível conciliar os dois! Agradeço muito a oportunidade #CAPES . #EmDefesadaPósGraduação #SOSCAPES https://t.co/Z5qP64fUlE
— genildogomes21 (@genildogomes21) November 29, 2021
Universidades e instituições públicas de pesquisa também foram lembradas. A maior parte dos estudos científicos feitos no país são realizados dentro dessas instituições, ou em parcerias entre elas e o setor privado.
A universidade pública não é inimiga da população. Ela garante acesso ao conhecimento que cura vidas, estabelece tecnologias, produz alertas sociais e ambientais e garante a existência de debate. A pós-graduação é fundamental pra isso continuar ocorrendo!
— Fernando Atique (@FerAtique) November 29, 2021
A ciência de ponta no Brasil se faz em instituições sérias e comprometidas, onde estão os pesquisadores e pesquisadoras de grande dedicação à atividade acadêmica e científica, respeitados em suas áreas. #EmDefesadaPósGraduação #SOSCAPES
— Isabela Gasparini (@isagasp) November 29, 2021
Preocupação com o pagamento de bolsas
Professores mostraram preocupação pelo futuro de seus alunos de pós-graduação.
Meus orientados merecem ter as mesmas chances de crescimento científico que eu tive. #SOSCNPq pic.twitter.com/K05bcHzRSc
— Jaísa Soares (@f_jaisa) November 30, 2021
Assistindo minhas alunas do Projeto de Extensão apresentarem no Congresso da @UFCSPA. Nossos resultados e alcances são significativos, mas precisamos que as verbas para pesquisas e projetos sejam viabilizados. Pesquisa e ciência são investimentos no futuro do país. #SOSCNPQ pic.twitter.com/6XXG18u7IF
— Mariana Oliveira (@prematurando) December 1, 2021
A ciência no Brasil é feita, em sua maior parte, por mestrandos, doutorandos e pós-docs... em resumo, a grande maioria da produção científica no país é feita por pós-graduandos! E pós-graduação exige investimento (+) #EmDefesadaPósGraduação #SOSCAPES
— Rayana Feltrin #imunizadah ?? (@rayomics) November 29, 2021
Os pesquisadores aproveitaram para denunciar os valores baixos das bolsas de pós-graduação. Os valores não são reajustados desde 2013. Estudantes altamente qualificados, de mestrado e doutorado, recebem pagamentos muito abaixo do mercado.
As bolsas de pesquisa no BR estão sem reajuste desde 2013, têm hoje o pior poder de compra da história. O gráfico do @ODellagostin traz os valores das bolsas de doutorado/mestrado e IC corrigidos. Para voltar ao patamar de 2013, o reajuste das bolsas deveria ser de 60%. #Ciencia pic.twitter.com/qAFnvp4R8F
— Gregório Grisa (@grisagregorio) November 19, 2021
Também é exigido dedicação exclusiva dos bolsistas, o que significa que eles não podem acumular outras fontes de renda ao valor recebido. Alunos de pós expuseram a situação complicada em que vivem na rede.
Além disso, não há nenhum vínculo empregatício entre o bolsista e sua instituição, o que deixa esses profissionais sem nenhum direito trabalhista... pic.twitter.com/i3HBbE3Kb5
— Ana Carolina Moreira Pessôa (@acmoreirapessoa) November 18, 2021
Alguns pesquisadores chamaram atenção para a fuga de cérebros no Brasil. O país figura entre os 20 maiores produtores de estudos no mundo, mas a falta de perspectiva faz com que os jovens cientistas busquem carreiras no exterior.
Mais de 10 anos de formação acadêmica, com ZERO apoio do estado, só culmina nos altos índices de exportação de recursos humanos em ciência! Não existe um pingo de consideração e dignidade na atuação acadêmica/científica no Brasil, isso é motivo de VERGONHA! #SOSCiencia https://t.co/0Dkvd0HSng
— Mequetreffe (@libelull4) November 23, 2021
No final, resta a esperança
Os cientistas, sobretudo, mostraram garra e vontade de transformar a realidade do país, e prometeram seguir lutando pela defesa da ciência.
Nós vamos seguir chegando nas escolas! Por mais ciência nas escolas!!#SOSCiencia pic.twitter.com/DbfgqFD3oF
— Daiana Avila ???????????? (@daia_avila) November 23, 2021
But above all, I am certain that we, Brazilian scientists, will persevere. We just have to focus, every day, on taking steps forward in our own Science, and in science policy. Tides are changing, and we are united, strong, and resilient. Anti-scientific stances will not prevail!
— Alicia Kowaltowski (@AJKowaltowski) November 24, 2021
"Mas, sobretudo, eu tenho certeza de que nós, cientistas brasileiros, iremos perseverar. Nós apenas temos que focar, todos os dias, em dar passos adiante na nossa ciência e nas políticas científicas. A maré está mudando, e nós somos unidos, fortes e resilientes. Posturas anticientíficas não prevalecerão!"