O atraso no início da campanha de vacinação para combater o coronavírus, a lentidão do processo e, mais recentemente, a escassez de vacinas em alguns momentos têm levado as autoridades a adiar a aplicação da segunda dose para fornecer proteção da primeira dose mais cedo para mais pessoas.
Esse raciocínio, embora socialmente justificável, levanta alguns questionamentos. Primeiramente, até que ponto o atraso na aplicação da segunda dose da vacina pode comprometer o controle efetivo da pandemia? E, o que é mais importante, em regiões com prevalência da nova variante delta do coronavírus, é seguro alterar a aplicação da segunda dose?
Para os pesquisadores do Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria (CeMEAI), da USP em São Carlos (SP), a resposta à segunda pergunta é um sonoro não. Para saber o intervalo ideal entre a primeira e a segunda dose da vacina, eles elaboraram um modelo matemático cujo funcionamento foi publicado neste mês na revista científica PNAS.
Como funciona o modelo matemático do CeMEAI?
O modelo matemático desenvolvido pelo CeMEAI foi construído a partir de dados preliminares da eficácia da vacina para a variante delta. Sua metodologia adota o pressuposto de um distanciamento social tolerante e usa como métrica principal a admissão em unidades de terapia intensiva (UTIs). Dessa relação, é possível selecionar a duração ideal entre as doses, comparada ao atraso padrão de quatro semanas.
Idosos recebem vacina contra a covid-19 em Londrina, no Paraná (crédito: Isaac Fontana/Shutterstock)
O grupo ModCovid-19, com pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), da Fundação Getulio Vargas (FGV) e da Universidade de São Paulo (USP), utilizou dados de eficácia das vacinas para projetar um tempo seguro e ideal entre as doses, que seja efetivo no controle da pandemia. O objetivo foi elaborar uma tecnologia capaz de eliminar “as incertezas epistêmicas”.
A aplicação do modelo matemático revelou que vacinas com até 50% de eficácia na primeira dose podem ser adiadas até oito semanas, no máximo. No entanto, se a eficácia da primeira dose for igual a 70%, adiar a segunda dose da vacina é uma opção viável. “O próprio algoritmo decide quando é melhor aplicar a segunda dose”, explica em nota Paulo José da Silva e Silva, coautor do estudo.
O modelo, cujo código foi disponibilizado pelos autores na internet, é particularmente útil no caso do avanço da variante delta em algumas regiões do Brasil e do mundo. Ou seja, "se você está em um lugar onde ela é a variante prevalente, a eficácia da primeira dose, pelas primeiras estimativas que estão saindo agora, é muito menor do que era com a alfa, então muda a relação da eficácia entre primeira e segunda dose", alerta Paulo.
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