É lógico assumir que um dos motivos da onda de calor extremo que tem sufocado os habitantes do hemisfério norte durante o atual verão pode ser o aquecimento global. Afinal, uma temperatura recorde de 54,4ºC verificada no Vale da Morte, nos Estados Unidos, no dia 9 de julho, só pode estar relacionada com um rápido aquecimento do planeta Terra.
Mas, o que dizer da massa de ar frio que atingiu a região Sul do Brasil no final do mês passado, trazendo quedas bruscas de temperatura até mesmo em regiões pouco afeitas ao fenômeno, como o Norte e o Nordeste do país? As baixas temperaturas, e até as nevascas observadas em alguns locais, levaram ao questionamento: se estamos num aquecimento global, por que esse frio todo?
Para responder a essa pergunta, uma equipe internacional de cientistas se debruçou sobre a questão, na busca de um nexo causal que explique como o aquecimento global é capaz de gerar, ao mesmo tempo, ondas de calor sufocantes e nevascas congelantes. O resultado do estudo foi publicado na segunda-feira (09) na revista científica Advances in Atmospheric Sciences.
Garota caminha na neve em cidade chinesa (créditos:Yinghui Lee/Shutterstock)
Metodologia da pesquisa
Para esclarecer os mecanismos pouco claros entre essas mudanças climáticas, os pesquisadores trabalharam com três eventos de frio extremo ocorridos sucessivamente no Leste Asiático e na América do Norte, durante o inverno passado.
Para o primeiro autor do estudo, o professor de ciências climáticas e atmosféricas da Universidade do Alasca Fairbanks, nos EUA, Xiangdong Zhang, esses acontecimentos "fornecem uma oportunidade única para examinar quais processos físicos ou mecanismos conduzem esses eventos" aparentemente incompatíveis, afirmou em um comunicado à imprensa.
Para ligar os eventos, a pesquisa conectou a chamada "quebra" do vórtice polar, um enorme anel de ventos frios de baixa pressão na estratosfera terrestre acima do polo norte, com os eventos de temperatura abaixo de zero. Isso ocorre devido à ligação entre o vórtice polar e as correntes de jato, uma espécie de escoamento de ar com ventos fortes que fluem de oeste para leste, em baixa altitude.
Assim, quando a temperatura planetária se eleva, devido ao aquecimento global, o equilíbrio entre o vórtice polar e a corrente de jato se enfraquece e "quebra", o que permite que o ar extremamente frio desça para latitudes mais baixas, à medida que o ar quente sobe até as regiões polares.
Conclusões do estudo
No primeiro evento analisado no estudo, ocorrido na China, o ar polar modulou a corrente de jato para latitudes médias e direcionou o ar frio para o sul. No segundo, também na China, o vórtice polar se dividiu, levando o ar frio diretamente do Ártico para a região. Finalmente, nos EUA, também houve a divisão do vórtice polar, porém a atmosfera de baixa pressão foi para o sul, causando temperatura recorde de frio no Texas.
No comunicado, Zhe Han, cientista do Instituto de Física Atmosférica da Academia Chinesa de Ciências, que também participou da pesquisa, afirma que, embora os eventos se manifestem de diferentes formas, todas se relacionam com o aquecimento global.
De acordo com Han, “junto com o aquecimento, a amplificação do Ártico e as anomalias térmicas oceânicas intensificadas podem interagir com a circulação atmosférica, como o vórtice polar e o aquecimento estratosférico repentino, para causar a ocorrência de eventos extremos de frio ou de calor”.
Agora, os cientistas esperam que o sensoriamento remoto possa autenticar essas simulações de modelos de mudanças climáticas. Se confirmados, os modelos poderão ser úteis na previsão de eventos precursores de monções no leste asiático, além de outros eventos climáticos.
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