As proteínas são um componente essencial à vida e tomaram as manchetes ao longo do último ano, com a pandemia do novo coronavírus. É possível que você já tenha ouvido ou lido sobre a famosa proteína spike, responsável por fazer a ligação do vírus às células do corpo humano. Agora, um novo estudo da Universidade de Illinois (UIC), em Chicago, nos Estados Unidos, mapeia a história evolutiva dessas moléculas formadas por aminoácidos e as inter-relações de seus domínios ao longo de 3,8 bilhões de anos.
Gustavo Caetano-Anollés, responsável pelo estudo da composição molecular das proteínas.Fonte: Fred Zwicky/Reprodução
O estudo foi publicado na revista Nature, no caderno Scientific Reports, em 8 de junho. O cientista Gustavo Caetano-Anollés, professor de Bioinformática do Departamento de Crop Sciences (Ciência de Cultivo) da UIC e líder da pesquisa, estudou a evolução das mutações da covid-19 desde os primeiros estágios da pandemia e criou uma linha do tempo – uma fração minúscula do que ele e o estudante de doutorado Fayez Aziz já mapearam desde o início da pesquisa.
A importância das proteínas
No nível celular, proteínas são responsáveis por quase tudo. Elas são tão fundamentais que o DNA – material genético que torna cada um de nós único – é, essencialmente, apenas uma longa sequência delas. E isso ocorre em animais, plantas, fungos, bactérias e até mesmo vírus. Assim como esses grupos de organismos evoluem e se transformam com o tempo, o mesmo acontece com as proteínas e seus componentes.
"Saber como e por que os domínios se combinam nas proteínas durante a evolução pode ajudar os cientistas a entender e projetar a atividade delas para aplicações em medicina e bioengenharia. Por exemplo, esses insights podem orientar o gerenciamento de doenças, como fazer vacinas melhores a partir da proteína spike do vírus da covid-19", disse Caetano-Anollés em entrevista ao site Phys.
Estudando o Big Bang de proteínas
Os pesquisadores compilaram milhões de sequências de proteínas codificadas em centenas de genomas de todos os grupos taxonômicos, de organismos superiores a micróbios. Mas eles se concentraram em domínios estruturais, não em proteínas inteiras. “A maioria das proteínas é composta de mais de um domínio. São unidades estruturais compactas, ou módulos, que abrigam funções especializadas”, explicou Caetano-Anollés, e completou: "Mais importante, eles são as unidades de evolução".
Após classificar as proteínas em domínios para construir árvores evolutivas, eles começaram a trabalhar criando uma rede. "Construímos uma série de redes temporais que descrevem como os domínios se acumularam e como as proteínas reorganizaram seus domínios durante a evolução", explicou Aziz.
Esta é a primeira vez que a rede de "organização de domínio" foi estudada como uma cronologia evolutiva. "Nossa pesquisa revelou que há uma vasta rede em evolução que descreve como os domínios se combinam nas proteínas", disse o doutorando. Cada link da rede representa um momento em que um determinado domínio foi recrutado para uma proteína, normalmente para desempenhar uma nova função.
"Este fato por si só sugere fortemente que o recrutamento de domínio é uma força poderosa na natureza", afirmou Fayez Aziz. A cronologia também revelou quais domínios contribuíam com funções importantes de proteínas, por exemplo, rastreando as origens dos domínios responsáveis pelo sensoriamento ambiental e por metabólitos secundários (subprodutos de uma ação do organismo), ou toxinas usadas como defesa em bactérias e plantas.
O que foi descoberto mapeando a história das proteínas?
A análise mostrou que os domínios começaram a se combinar no início da evolução da proteína, mas também houve períodos de crescimento explosivo da rede. Por exemplo, houve um "Big Bang" de combinações de domínio há 1,5 bilhão de anos, coincidindo com o surgimento de organismos multicelulares e eucariotos (organismos com núcleos ligados por membrana, que incluem humanos).
A existência de Big Bangs biológicos não é nova, e a equipe de Caetano-Anollés relatou anteriormente a origem massiva e precoce do metabolismo. Recentemente eles a encontraram novamente rastreando a história das redes metabólicas. Agora, o registro histórico desse Big Bang, descrevendo a colcha de retalhos evolutiva das proteínas, irá fornecer novas ferramentas para entender a composição delas.
“Isso poderia ajudar a identificar, por exemplo, por que variações estruturais e recombinações genômicas ocorrem com frequência no SARS-CoV-2”, disse Caetano-Anollés. Ele acrescentou que o mapeamento das proteínas pode ajudar a prevenir pandemias, dissecando o mecanismo como as doenças virais se originam. Assim, o estudo também pode ajudar a mitigar doenças, melhorando o desenvolvimento de vacinas quando ocorrem surtos, como o de covid-19.
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