Pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) acabam de criar três dispositivos eletrônicos extremamente úteis utilizando um material "mágico" composto por camadas finas de grafeno em um ângulo específico. A abordagem do MIT, publicada na edição de 3 de maio da revista científica Nature Nanotechnology, resolve uma variedade de problemas associados à produção de dispositivos utilizados na indústria de eletrônicos quânticos.
Até agora, equipamentos como os criados pela equipe do instituto eram feitos com uma variedade de materiais e passavam por várias etapas de fabricação. As camadas de grafeno sobrepostas substituem todos esses materiais, segundo o estudo.
"Nesse trabalho, demonstramos que o grafeno no ângulo mágico é o mais versátil de todos os materiais supercondutores. Ele permite realizar em um único sistema uma infinidade de dispositivos eletrônicos quânticos. Usando essa plataforma avançada, fomos capazes de explorar pela primeira vez uma nova física supercondutora que só aparece em duas dimensões", disse, ao site Phys, Pablo Jarillo-Herrero, professor de Física afiliado ao Laboratório de Pesquisa de Materiais do MIT e líder da pesquisa.
Como o grafeno foi utilizado
O grafeno é um nanomaterial composto por uma única camada de átomos de carbono dispostos em hexágonos que se assemelham a uma estrutura em favo de mel. Descoberto há cerca de 17 anos, tem uma gama de propriedades incríveis, como ser mais forte do que o diamante; além disso, por ser transparente e flexível, conduz facilmente calor e eletricidade.
Em 2018, o grupo de Jarillo-Herrero fez uma descoberta surpreendente: ao colocarem duas camadas de grafeno uma sobre a outra, ligeiramente torcidas em um "ângulo mágico" de 1,1 grau, a estrutura resultante se tornava um supercondutor ou um isolante que impedia o fluxo de corrente elétrica — dependia apenas do número de elétrons presentes no sistema em que estivesse.
Representação do ângulo mágico de sobreposição do grafeno.Fonte: Universidade Federal do ABC/Reprodução
Formalmente conhecido como magic-angle twisted bilayer graphene (MATBG, ou bicamada de grafeno torcida em ângulo mágico, em tradução livre), o novo material gerou interesse intenso na comunidade científica e acabou inspirando um novo campo de pesquisa, a twistrônica (junção de twist (torcido) e eletrônica).
Dispositivos de trabalho
A equipe composta por cientistas e estudantes criou três dispositivos eletrônicos quânticos: uma junção Josephson (ou chave supercondutora) e dois aparelhos relacionados. As junções Josephson são os blocos de construção dos bits quânticos (ou qubits) que estão por trás dos computadores quânticos e têm uma variedade de outras aplicações, como incorporação em dispositivos de medição precisa de campos magnéticos.
Os outros dois produtos são um espectroscópio de tunelamento e um transistor de elétron único. O primeiro é a chave para estudar a supercondutividade, e o segundo tem uma variedade de aplicações devido a sua extrema sensibilidade a campos elétricos.
Os três dispositivos são benéficos por serem feitos de um único material eletricamente ajustável, já que equipamentos produzidos convencionalmente a partir de vários materiais sofrem uma variedade de desafios, como possíveis incompatibilidades entre os componentes.
Sede do Massachusetts Institute of Technology (MIT).Fonte: MIT/Divulgação
William Oliver, professor associado do MIT no Departamento de Engenharia Elétrica e Ciência da Computação, mas não envolvido na pesquisa, explicou ao site Phys: "A abordagem convencional seria fabricar um dispositivo em várias etapas utilizando materiais diferentes. Com MATBG, os dispositivos resultantes são totalmente reconfiguráveis simplesmente mudando as tensões de porta".
Na pesquisa de 2018, o time mudou a voltagem fornecida ao material mágico por meio de um único eletrodo ou porta metálica. No trabalho atual, "introduzimos portas múltiplas para sujeitar diferentes áreas do material a diferentes campos elétricos", disse na entrevista Daniel Rodan-Legrain, estudante de Física e autor principal do artigo da Nature Nanotechnology.
Daniel Rodan-Legrain ao lado de um transportador de chip usado na pesquisa.Fonte: Bharath Kannan, MIT/Reprodução
A equipe conseguiu sintonizar diferentes seções do mesmo material mágico em uma infinidade de estados eletrônicos, de supercondutores a isolantes — e em algum ponto intermediário. Então, aplicando portas em configurações diferentes, foi capaz de reproduzir todas as partes de um circuito eletrônico que normalmente seria criado com materiais completamente diferentes.
O estudo do MIT abre caminho para muitos avanços futuros. Por exemplo, segundo Rodan-Legrain, agora seria possível criar o primeiro qubit sintonizável por voltagem a partir de um único material que poderia ser aplicado em futuros computadores quânticos.
Fontes