Pela primeira vez, cientistas conseguiram coletar DNA pelo ar, em vez de usar a coleta de material genético em superfícies, novidade que pode revolucionar a ciência forense, a medicina e a antropologia. A descoberta foi apresentada em um estudo publicado na revista PeerJ no dia 31 de março.
Conduzido por pesquisadores da Queen Mary University of London, na Inglaterra, o estudo tinha o objetivo de verificar se o DNA ambiental, material genético liberado no meio ambiente por organismos vivos (animais e plantas), poderia ser coletado através do ar e utilizado para identificar espécies animais.
Até agora, a maioria das pesquisas se concentrava na coleta do eDNA, como este tipo de material também é conhecido, da água. Mas os cientistas britânicos resolveram testar se seria possível retirar amostras do DNA deixadas no ar quando os organismos interagem com o ambiente.
A técnica pode ser usada, por exemplo, para identificar animais que vivem em cavernas de difícil acesso.Fonte: Pixabay
Para tanto, eles contaram com a ajuda de alguns ratos-toupeira-pelados, uma espécie de roedor que vive em colônias subterrâneas. As tocas destes animais foram os locais escolhidos pelos especialistas para a tentativa de encontrar as amostras do material genético utilizando a técnica inovadora.
Como a coleta foi feita?
Usando uma bomba peristáltica combinada com filtros de pressão, a equipe de pesquisa tentou coletar o eDNA diretamente na toca do rato-toupeira-pelado e também na sala onde foi realizado o teste. Em seguida, eles contaram com kits especiais para encontrar e sequenciar genes nas amostras resultantes do trabalho.
De acordo com o artigo, a tentativa foi um sucesso. Eles conseguiram não só localizar o DNA dos ratos, tanto no seu alojamento natural quanto na sala, como também encontraram DNA humano nas amostras de ar coletadas para análise.
Rato-toupeira-pelado.Fonte: PeerJ/Reprodução
A princípio, acreditava-se que o material genético de humanos detectado fosse originado a partir da manipulação das tocas do animal, mas depois de novas análises chegaram à conclusão de que ele estava se afastando da sua fonte original e se espalhando pelo ar.
Mesmo com os bons resultados apresentados inicialmente, o método inovador de coleta de DNA no ar ainda precisa de algumas melhorias. Uma das dificuldades mencionadas pela pesquisa é a busca por eDNA em espaços ao ar livre e nas salas com grandes quantidades de pessoas, situações que dificultam a coleta, enquanto a busca em ambientes fechados pode ser mais eficiente.
Possíveis utilidades da tecnologia
Conforme a pesquisadora da Queen Mary University Elizabeth Clare, líder do estudo, o método foi desenvolvido originalmente para auxiliar ecologistas e conservacionistas em busca de “maneiras eficientes e não invasivas para monitorar ambientes biológicos”. No entanto, ela acredita que a descoberta abre inúmeras possibilidades.
“O que começou como uma tentativa de ver se essa abordagem poderia ser usada para avaliações ecológicas tornou-se agora muito mais, com aplicações potenciais em ciência forense, antropologia e até medicina”, comentou Clare. Com algumas melhorias, a técnica pode colher material para determinar se um suspeito esteve presente na cena de um crime, por exemplo.
Facilitar investigações de crimes é uma das possibilidades.Fonte: Freepik
Ela também pode ser útil para entender melhor como funciona a transmissão de doenças como a covid-19. “No momento, as diretrizes de distanciamento social são baseadas na física e estimativas de quão longe as partículas de vírus podem se mover, mas com esta técnica poderíamos realmente coletar amostras do ar e encontrar evidências do mundo real para apoiar essas diretrizes”, explicou a cientista.
Os usos da técnica no dia a dia ainda estão longe de se tornarem uma realidade. Mas os pesquisadores já começaram a trabalhar em parceria com empresas privadas, como a NatureMetrics, buscando desenvolver aplicações práticas para a tecnologia.