Em outubro, quando a Organização Mundial de Saúde (OMS) anunciou que o remdesivir havia falhado em aumentar a sobrevida de pacientes infectados com o novo coronavírus, a notícia não foi bem recebida pela comunidade médica: a droga era a grande esperança para tratar vítimas de covid-19 em um mundo ainda sem vacina. Mesmo assim, a droga continuou a ser pesquisada e, aos poucos, seu uso (emergencial) foi permitido nos EUA, em países da União Europeia e, agora, no Brasil.
Seu uso, porém, não substitui a vacina, é restrito ao ambiente hospitalar e não é recomendado para pacientes críticos, já intubados. Ainda segundo o fabricante, há “risco de redução da atividade antiviral quando coadministrado com cloroquina ou hidroxicloroquina” – dois dos medicamentos recomendados pelo governo brasileiro para um "tratamento precoce" contra a doença.
Ainda não há preço para a droga no Brasil; nos EUA, um frasco (100mg/20mL, correspondente a uma dose) custa US$ 520 (R$ 2.900); a recomendação do tratamento para adultos e crianças acima de 12 anos (mais de 40kg) é de 200mg no primeiro dia, seguido por doses diárias de 100mg por até dez dias.
Como ele age
Fabricado pelo laboratório americano Gilead Sciences com o nome de Veklury, ele é um pró-fármaco antiviral (uma substância inofensiva que se transforma em um fármaco quando metabolizada dentro do corpo) que impede a ação de uma enzima do vírus, essencial para que ele consiga replicar seu RNA.
Inicialmente, o remdesivir foi criado como um tratamento contra a hepatite C, sendo usado depois contra infecção pelo ebola e, depois, passou a ser testado in vitro contra outras doenças causadas por vírus, como , mas começou a ser testado contra outros vírus, como os causadores da síndrome respiratória do Médio Oriente (MERS) e da covid-19.
Aprovação
Quando parecia que nada deteria a pandemia a não ser a vacina (quadro que ainda se confirma), a Organização Mundial de Saúde lançou o estudo Solidariedade, envolvendo mais de 11,3 mil adultos internados em 405 hospitais de 30 países. Além do remdesivir, foram testados isoladamente ou combinados entre si hidroxicloroquina, lopinavir, interferon ou interferon mais lopinavir.
No grupo do remdesivir, dos 2.743 pacientes hospitalizados que receberam o medicamento, 11% morreram, contra 11,2% do grupo de controle. Por isso, a OMS decidiu não recomendar a droga: além de, à época, não existirem evidências robustas de que o remédio seria eficaz contra a covid-19, os possíveis efeitos colaterais e mais o seu alto custo não o tornariam efetivo como protocolo a ser adotado pelos sistemas de saúde.
A organização, porém, recomendou que mais testes clínicos fossem feitos, o que aconteceu. Na China, um estudo randomizado, duplo-cego e controlado (padrão-ouro em testes clínicos) com 237 pacientes com infecção grave por SARS-CoV-2 foram tratados com remdesivir (158 receberam a droga e 79, o placebo).
Os resultados não foram estatisticamente significativos; porém, o tempo para melhora clínica foi menor para aqueles que receberam remdesivir nos primeiros dez dias a partir do início dos sintomas.
Outro estudo, organizado pelo Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos EUA (também randomizado, duplo-cego e controlado), mostrou que o remdesivir ajudava a diminuir o tempo de hospitalização de pacientes com pneumonia causada pelo SARS-CoV-2: 11 dias contra 15 dias no grupo de pacientes que receberam placebo. A mortalidade no grupo dos pacientes que receberam a droga foi de 7,1%, contra 11,9% no grupo do placebo.
O remdesivir mostrou resultados em pacientes que não foram intubados.Fonte: UNICEF/Reprodução
Foi exatamente no efeito sobre o tempo de melhora clínica que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) se baseou para liberar o medicamento nesta sexta (12).
Efeitos colaterais
Uma das reservas da comunidade científica sobre o uso do remdesivir diz respeito à sua semelhança com outro antiviral, o tenofovir (usado no coquetel anti-HIV distribuído pelo Sistema Único de Saúde), que afeta o funcionamento dos rins.
Também o fígado deve ser monitorado durante o tratamento (o fabricante recomenda que sejam feitos exames laboratoriais hepáticos antes da administração da droga); o efeito adverso mais comum relatado foi o aumento dos níveis de enzimas hepáticas, seguido de hipotensão arterial.
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