Na última terça-feira (2), a Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (CERN) anunciou a descoberta de 59 novas partículas com o uso do Grande Colisor de Hádrons (LHC) em Genebra, na Suíça, sendo quatro delas totalmente inéditas desde o início dos estudos da área em 2009. Algumas já eram esperadas de acordo com teorias estabelecidas, mas outras representam verdadeiras surpresas à comunidade científica mundial.
A partir do LHC, pesquisadores são capazes de explorar propriedades da matéria nas distâncias mais curtas e nas energias mais altas sondadas em laboratório, possibilitando, assim, maior aprofundamento do Modelo-Padrão da Física de Partículas, teoria que descreve forças e elementos que constituem todos os corpos no Universo.
Aliás, foi pela máquina que o Bóson de Higgs, ou "partícula de Deus", última peça faltante da hipótese, veio à luz, garantindo o prêmio Nobel de Física de 2013 ao britânico Peter Higgs e ao belga François Englert. Em suma, ela é a manifestação física da interação de bósons, partículas associadas a forças (com exceção dos fótons) que produzem quebras espontâneas de simetria em regimes de alta energia.
Bóson de Higgs, a "partícula de Deus".Fonte: Reprodução
Apesar de todas as conquistas, o Modelo-Padrão da Física de Partículas está longe de ser compreendido em sua totalidade, pois a descrição detalhada da força que mantém o núcleo atômico coeso (formado por prótons e nêutrons, compostos por três quarks) e de sua atuação fundamental sobre tudo o que existe é um cenário ainda não atingido nem pelos equipamentos mais potentes da Terra.
Se essa força desaparecesse por um segundo que fosse, a matéria se desintegraria em uma sopa de quarks soltos – estado que, pressupõe-se, existiu por um instante no início dos tempos.
A esta propriedade deram o nome de cromodinâmica quântica, que explica como os quarks interagem por meio da troca de outras partículas chamadas glúons – análogos do fóton, partícula de luz e portadora da força eletromagnética. A força gerada neste caso é fundamentalmente diferente de sua "irmã" mais conhecida.
Quanto mais os quarks se separam, mais forte a interação fica, algo que os mantém irremediavelmente presos aos hádrons, partículas feitas de dois ou mais quarks, gerando os prótons e nêutrons.
Isto é, presos até que passem pelo CERN e atinjam velocidades absurdas, revelando-se, assim, aos olhos dos cientistas. Entretanto, a coisa é mais complicada do que parece.
CERN está por trás de novidades.Fonte: Reprodução
Teste atrás de teste
Especialistas até hoje não se depararam com um quark solitário, e os cálculos necessários para se detalhar um processo simples no eletromagnetismo se tornam altamente complexos na cromodinâmica quântica. Além disso, antipartículas, previstas no Modelo-Padrão da Física de Partículas, acabam surgindo antes da extração de quarks, criando, assim, um par e freando a evolução das pesquisas. Diversos experimentos acabaram no mesmo ponto, impedindo, também, mesmo suposições a respeito de quais combinações de quarks seriam viáveis e quais não.
Pares de quarks e antiquarks (mésons), trios de quarks (bárions), trios de antiquarks (antibárions) e grupos formados por dois quarks e dois antiquarks (tetraquarks) ou quatro quarks e um antiquark (pentaquarks) foram hipóteses combinatórias propostas por cientistas desde a descoberta dos quarks, várias comprovadas com o passar dos anos. Surpreendentemente, além da consolidação de outras delas com o recente anúncio do CERN, coisas inesperadas se juntaram ao rol das análises.
Dentre os 59 novos hádrons – combinações possíveis – encontrados, quatro tetraquarks inéditos deram um "oizinho" à humanidade, cujo diferencial mais marcante é a presença, exceto em um, de pares de quarks pesados batizados de charm (encanto, em tradução livre) e bottom (essência), evidenciando, assim, algumas preferências da natureza.
Combinações de quarks inéditas são reveladas.Fonte: Reprodução
Renovando a ciência
Segundo os pesquisadores à frente do anúncio, o mais impressionante é, justamente, a falta de explicação para a existência desses hádrons. Por exemplo, por que não há partículas correspondentes com pares de quarks estranhos e todas contêm uma dupla semelhante?
De todo modo, tais fatos trazem indícios da existência de uma física além do modelo-padrão, notadamente inconsistente com teorias cosmológicas atuais que descrevem a formação do Universo.
Outras partículas poderiam, em tese, preencher as lacunas do conhecimento científico contemporâneo. Entretanto, por estarem escondidas no fundo de interações, se encontram, agora, além do alcance de nossa compreensão plena.
Ou seja, a cada passo dado, como o recentemente divulgado, estamos mais perto da descrição apurada das propriedades essenciais da matéria – e de outras perspectivas de nossa existência neste ponto azul perdido no espaço.
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