Uma hipótese há muito teorizada e pesquisada, a de que cabos submarinos de fibra ótica utilizados por empresas de telecomunicações podem monitorar ocorrências de terremotos e tsunamis, foi agora confirmada por pesquisadores do Instituto de Tecnologia da Califórnia em um estudo publicado nesta sexta-feira (26) na revista Science.
No trabalho, realizado no ano passado através de uma parceria interdisciplinar entre geofísicos e engenheiros de rede, um dos cabos de fibra ótica da Google foi capaz de detectar com sucesso terremotos próximos, utilizando distorções nos pulsos de luz enviados ao longo do cabo.
Falando sobre a pesquisa em uma videoconferência, o seu autor sênior Zhongwen Zhan, geofísico do Instituto de Tecnologia da Califórnia, destacou as implicações científicas e sociais do projeto, explicando que a maioria dos sensores geofísicos existentes atualmente para prospectar terremotos está em terra firme, enquanto a maioria dos processos geológicos ocorre no oceano.
Dessa forma, concluiu Zhan: “Estamos aproveitando cabos pré-existentes no oceano para uma forma relativamente escalonável de detectar terremotos. Achamos que, no futuro, poderemos usá-los para avisos antecipados de terremotos e tsunamis”, o que faria desses cabos de telecomunicações verdadeiras ferramentas geofísicas.
Metodologia da pesquisa
Fonte: Google/DivulgaçãoFonte: Google
A instrumentalização geofísica do fundo do mar é uma tarefa difícil e cara, tanto em termos de implantação como de manutenção. Zhan e seus colegas utilizaram a polarização do tráfego regular em um cabo de fibra ótica de 10 mil quilômetros de comprimento, chamado pela Google de cabo Curie, durante 9 meses.
Cabos desse tipo, ainda mais quando utilizados pela companhia que é dona do maior mecanismo de buscas do planeta, significa a transmissão de uma quantidade inimaginável de dados, a velocidades extremamente altas, para garantir um mundo sempre conectado.
Por outro lado, um cabo de águas profundas é uma garantia de menos ruídos que seus colegas terrestres, permitindo uma melhor percepção de sua tensão. Logicamente, imperfeições físicas poderão resultar em variações da polarização da luz, também presentes em caso de atividade humana ou flutuações de temperatura.
Ora, como no fundo do mar as temperaturas são relativamente estáveis e raramente ocorrem atividades humanas, quando uma pequena onda sísmica ondula no meio ambiente, ou quando uma grande onda ascendente do oceano passa, esses fenômenos tornam-se facilmente detectáveis pela deformação do próprio cabo.
Triangulando polarizações
Terremoto em Oaxaca, México, detectado na vibração do cabo Curie (Fonte: Patricia Castellanos/AFP/Getty Images/Reprodução)Fonte: Patricia Castellanos/AFP/Getty Images
O que torna esse projeto de utilização da polarização do tráfego de telecomunicações para detectar abalos sísmicos mais promissor é a existência de muitos cabos submarinos para ler esses dados. Enquanto o cabo Curie mede cerca de quatro quintos do diâmetro da Terra, a rede total de cabos submarinos existente poderia circundar o planeta 20 vezes.
Em meio século de história de registro de eventos geofísicos, o Instituto de Tecnologia da Califórnia utilizou um cabo submarino pela primeira vez em junho do ano passado, para “ouvir” o terremoto de magnitude 7,1 que atingiu a cidade de Oaxaca, no México. Quando atribuíram uma perturbação no sinal do cabo Curie a um terremoto, foi algo totalmente inesperado, segundo Zhan, pois era umsa coisa que ninguém havia feito antes.
Atualmente, a equipe já contabiliza o reconhecimento de 20 terremotos e 30 ondas de tsunami. Como o cabo detecta apenas a perturbação, os cientistas ainda não conseguem detectar o epicentro do evento sísmico. No entanto, Zhan garante que, no futuro, será possível triangular polarizações perturbadas em diferentes cabos para estabelecer o epicentro dos fenômenos, como em um GPS submarino.
Salvando vidas de forma econômica e segura
Conseguir detectar tsunamis e terremotos quando eles ainda estão longe da costa é um trabalho que pode salvar vidas. Segundo a Google, os cabos de fibra ótica são capazes de enviar avisos para a terra mais rápido do que qualquer sensor específico para esse tipo de detecção existente, "talvez em questão de milissegundos".
Em uma postagem feita em julho do ano passado em seu blog, a companhia de Cupertino se mostrou entusiasmada em poder "colaborar com as comunidades de pesquisa óptica, submarina e sísmica para usar toda a nossa infraestrutura de cabo para maiores benefícios sociais”.
Ao encerrar a videoconferência, Zhongwen Zhan fez questão de destacar dois pontos: a economia, uma vez que a abordagem não requer novas infraestruturas; e a segurança, pois os cientistas não conseguem ver qualquer tipo de informação sobre o tráfego de dados transmitidos pelos cabos.
“É uma forma perfeitamente segura de aproveitar as infraestruturas pré-existentes para fazer algo que seja bom para a sociedade e para a ciência”, conclui o geofísico.
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