Não se sabe ainda se a maior parte do Universo é composta por matéria ou por antimatéria, mas Paul Sutter, astrofísico da SUNY Stony Brook e do Flatiron Institute, traz uma teoria impressionante. De acordo com ele, pode haver estrelas e até galáxias inteiras formadas pelo material misterioso – e elas seriam detectáveis daqui mesmo, da Terra, a partir de uma pequena porcentagem das partículas que lançam ao espaço.
Sutter explica que cada componente existente possui um "irmão gêmeo", idêntico em tudo, exceto na carga. Portanto, um elétron, exemplifica, com carga negativa, tem um semelhante com carga positiva, o pósitron. Teorias fundamentais da física, complementa, apontam para uma simetria especial entre os tipos citados, um espelhamento perfeito. Sendo assim, tecnicamente, não há coisa alguma pelo cosmos que escape da balança (exceto pelo fato de que não enxergamos o outro lado ainda).
Aprofundando-se em sua reflexão, o astrofísico cita que nosso planeta e o Sistema Solar são feitos de matéria "normal", assim como a poeira entre galáxias e tudo o que conhecemos. De todo modo, em ao menos dois lugares a antimatéria já foi detectada: coletores de partículas ultrapoderosos e raios cósmicos, fluxos de partículas de alta energia oriundos do espaço sideral e de processos marcantes, como o surgimento de supernovas e a colisão de astros.
Dito isso, resta a pergunta: com um suposto equilíbrio como o mencionado, por que o antimaterial parece tão raro? O especialista indica que a resposta para essa questão reside no universo primitivo.
Para cada partícula, uma antipartícula. Será?Fonte: Reprodução
Cadê aquela antimatéria que estava aqui?
Quando aponta o início dos tempos como o responsável pela bagunça, Sutter está literalmente falando do momento em que o Universo tinha menos de um segundo de "vida", em que a produção de matéria e antimatéria era equivalente. Entretanto, algo ocorreu no processo, levando ao desequilíbrio que chegou à proporção de uma partícula da segunda para um bilhão da primeira. Aliás, mesmo a distribuição, detalha, não foi balanceada.
"É totalmente possível que o universo primitivo tenha deixado grandes aglomerados de antimatéria flutuando aqui e ali", pondera o pesquisador. "Se sobrevivessem por tempo suficiente, cresceriam em relativo isolamento", destaca, salientando que, como a colisão entre partículas de cargas opostas as aniquila, só restariam aquelas que superassem esse teste de fogo.
Anti-hidrogênio, anti-hélio e anti-todos-os-outros-elementos, brinca o cientista, estariam entre as possibilidades – o que não impediria a formação de antipoeira, antiestrelas alimentadas por antifusão e antiplanetas com antipessoas bebendo anticopos refrescantes de antiágua. "Ao longo de bilhões de anos, esses aglomerados de antimatéria poderiam ter se reunido e crescido. Lembre-se de que a única diferença entre a antimatéria e a matéria é sua carga; todas as outras operações da física permanecem exatamente as mesmas", defende.
Por enquanto, esse papo não passa de suposição, pois o mecanismo de eliminação da antimatéria no universo primitivo está além da física conhecida – o que não quer dizer que passos mais largos e plausíveis fiquem fora de cogitação.
Encontros as aniquilam, mas geram energia.Fonte: Reprodução
Um passado muito, muito distante
Há ceticismo quanto à perambulação de antigaláxias, já que a energia liberada por interações desses exemplares com os tradicionais ofereceria evidências sólidas de suas existências aos instrumentos dos quais a comunidade científica dispõe. Mas antiaglomerados menores, como os globulares, incrivelmente mais antigos, pequenos e densos, contendo menos de 1 milhão de estrelas orbitando galáxias maiores, bem, aí já é outra história.
Além de não formarem novos astros, aglomerados globulares estão cheios de pequenas populações vermelhas e envelhecidas, sendo relativamente livres de gás e poeira. A própria Via Láctea tem, à sua volta, cerca de 150 deles – e alguns podem ser feitos de antiestrelas. Nada aconteceria com esses exemplares, a não ser que mergulhassem em nossa vizinhança.
"O antiaglomerado teria somente estrelas, e estrelas não ocupam muito volume. Resumindo, não há muitas oportunidades para grandes eventos", conta Sutter, citando um artigo publicado recentemente no jornal pré-impresso arXiv. Determinar a origem de partículas de antimatéria que atingem nossa atmosfera desde sempre é outro desafio, já que o campo magnético de galáxias altera seus caminhos.
Por fim, se é para sonhar, que sonhemos alto. Caso astrônomos fossem capazes de detectar um aglomerado globular como uma fonte particularmente forte de antipartículas, a humanidade se depararia com uma espécie de janela, pela qual a compreensão da física dominante de um universo recém-nascido se desvendaria diante de nós, ampliando tudo o que sabemos (ou pensamos saber) sobre o que nos trouxe, de fato, até aqui.
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