Componentes capazes de conduzir eletricidade sem resistência alguma e sem a dependência de resfriamento especial são discutidos há anos, além de ser um objetivo até então não atingido.
Considerados verdadeiros milagres tecnológicos, já que poderiam ser utilizados em diversos setores, como redes de distribuição de energia e transportes (levitação de trens, por exemplo), a necessidade de temperaturas baixas para que esses componentes funcionem é uma barreira difícil de contornar, tida como intransponível por décadas.
Felizmente, cientistas se dedicam – e muito – ao estudo dessas ferramentas, o que resultou em um feito inédito publicado ontem (14) na revista Nature: um grupo de pesquisadores obteve a chamada supercondutividade em temperatura ambiente (13,3 °C), superando marcas atingidas anteriormente.
Condução de eletricidade sem perda de eficiência é promessa dos componentes.Fonte: Pexels
Para o experimento, Elliot Snider, líder do estudo, e sua equipe criaram um composto de enxofre e carbono (na proporção de um para um) e, submetendo-o a pressões de aproximadamente 2,5 milhões de vezes maiores que a do ar que respiramos, exercidas por 2 diamantes, injetaram hidrogênio nas pequenas bolas originadas da mistura.
No processo, um laser foi responsável por quebrar as ligações entre os átomos, alterando a química do sistema e o comportamento dos elétrons da amostra – gerando, por fim, um cristal com os "poderes" esperados, ainda que mínimo (com cerca de 30 milionésimos de metro de diâmetro).
As condições atípicas são essenciais, pois, diferente do que ocorre em condutores comuns, os elétrons não devem se libertar com facilidade de suas correntes e se transformar em calor, o que acarreta a perda de eficiência – um processo longamente estudado por teóricos há décadas com diversos elementos.
Apesar de tudo parecer calculado com exatidão, ao que parece, o resultado não passou de acidente, pois os cientistas não têm certeza do que exatamente foi criado nem o porquê de funcionar. Agora, eles correm atrás das respostas.
Muita coisa precisa ser explicada.Fonte: Unsplash
O céu é o limite
A conquista representa um passo a mais para um futuro disruptivo. José Flores-Livas, físico computacional da Universidade de Roma "La Sapienza", Itália, que não participou da pesquisa, conta que, com a aplicação de metade das pressões utilizadas no experimento, a industrialização de sensores superminúsculos de alta resolução se tornaria possível, revolucionando a Medicina e o armazenamento de dados – só para começo de conversa.
Ralph Scheicher, modelador computacional da Universidade de Uppsala, na Suécia, aposta mais alto: segundo ele, supercondutores maiores e capazes de funcionar em temperatura e pressão ambientes se tornarão realidade em até 1 década. A consequência? Levando-se em conta que cerca de 5% da eletricidade gerada pelos Estados Unidos é perdida em sua transmissão e distribuição, bilhões de dólares seriam economizados, sem contar o impacto climático.
Sistemas inéditos de energia podem surgir a partir dessa evolução.Fonte: Unsplash
Resumindo, supercondutores habilitariam um sistema totalmente novo, cujos componentes, menores e mais baratos, também otimizariam o armazenamento de energia renovável produzida por turbinas eólicas ou células solares. Computação quântica seria outro ramo beneficiado. Antes disso, é preciso frear as expectativas, já que há muito o que fazer.
De acordo com os pesquisadores, ainda que hipotético, todo esse cenário não está fora de cogitação, e este é o grande trunfo do achado: um material supercondutor robusto à temperatura ambiente que transformará a economia de energia, o processamento de informações quânticas e a detecção pode ser alcançável. Será?
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