Em 2018, o mundo foi alertado sobre a extinção da mais popular e comercial espécie de banana, dizimada por uma praga ainda sem nenhum controle. A fruta foi apenas 1 entre as dezenas de espécies de plantas comestíveis cuja manipulação humana deixou pelo caminho a variedade genética.
Dessa forma, isso é o que os cientistas estão tentando recuperar com a ajuda da manipulação dos genes através de Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas e Regularmente Interespaçadas (em inglês, Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats — Crispr), técnica em que uma enzima bacteriana é usada para editar sequências de DNA.
Um dos expoentes na área é o agrônomo e botânico Lázaro Eustáquio Pereira Peres, especialista em fisiologia vegetal. Ele e sua equipe da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), em vez de tentarem consertar milênios de domesticação, voltaram-se para a espécie selvagem e, a partir disso, usaram a edição do DNA para recuperar algumas das melhores características do tomate.
“Combinamos características agronomicamente desejáveis a outras úteis, presentes em linhagens selvagens. Com a domesticação, houve alteração não somente na morfologia como no tamanho, no número de tomates em cada ramo e no seu valor nutricional. As características benéficas das espécies selvagens, como resistência a doenças e tolerância ao estresse, foram perdidas”, explicou ele no estudo publicado na Nature.
Mais nutritivo e resistente
Um dos primeiros resultados foi um tomate geneticamente modificado que produz 500% mais licopeno (um antioxidante celular) em relação ao selvagem. Em 2 anos, eles partiram de um tomate melhor, porém minúsculo, para frutos 3 vezes maiores, com 10 vezes mais tomates em cada ramo e mantendo as mesmas características aprimoradas.
O tomate selvagem é resistente, mas minúsculo; foram necessários milênios de seleção humana para chegar ao fruto que consumimos hoje.Fonte: Alamy/Judith Flacke/Reprodução
Controlar os caminhos genéticos pode ser a chave para conseguir vegetais mais nutritivos e resistentes tanto a pragas quanto a elementos, como o frio e a seca. Peres é um entre milhares de pesquisadores ao redor do mundo, em centenas de laboratórios de pesquisa e desenvolvimento, trabalhando naquela que é considerada a próxima "revolução alimentar".
A Crispr está sendo usada hoje desde no clareamento de cogumelos (que escurecem quando fatiados) à criação de grãos de café sem cafeína e trigo com níveis reduzidos de glúten, passando pela sobrevivência de frutas altamente consumidas mundialmente, como a já citada banana e o cacau, ambos atacados por pragas ainda sem remédio, cuja única "cura" é a incineração de toda a plantação.
Arqueologia arbórea
A busca por ancestrais de alimentos está acontecendo também em um canto idílico da Itália, pelas mãos da agrônoma Isabella Dalla Ragione, especializada em genética. Ela procurou plantas que não sobreviveram à transição para a agricultura industrial nos anos 1950 — quando variedades que não cresciam rapidamente tinham baixo rendimento ou não podiam ser colhidas mecanicamente e foram abandonadas.
Isabella procurou em arquivos, campos abandonados e pomares de monastérios até perceber que as melhores pistas estavam em museus e palácios italianos, nos afrescos e nas pinturas renascentistas, como no quadro de Albrecht Dürera Madonna e a criança com a pera (que é na verdade uma maçã).
Após encontrar uma espécie perdida, a agrônoma plantou 3 amostras em sua fazenda; depois que elas frutificaram, ela ofereceu mudas no site da Archeologia Arborea, organização fundada há mais de 20 anos. “Algumas dessas frutas estão crescendo em lugares distantes como nos EUA ou na Austrália”, disse ela.
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