A perda de 28 trilhões de toneladas de gelo nos últimos 23 anos se reflete na situação da calota da Groenlândia, a segunda maior reserva de água doce da Terra: não há mais como parar seu derretimento. Esses e outros dados estão contidos em dois estudos que apontam os efeitos do aquecimento global na criosfera do planeta.
Usando dados de satélites sobre geleiras, glaciares e montanhas com gelo, pesquisadores das universidades de Leeds e Edimburgo e da Imperial College London conseguiram definir o quanto de gelo a Terra perdeu entre 1994 e 2017.
"Se nada mudar, o nível do mar deverá aumentar entre 60 centímetros e 1 metro ao fim deste século, o que corresponde ao pior cenário previsto pelo Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Cada centímetro de elevação do nível do mar significa o deslocamento de 1 milhão de pessoas", explicou Andy Shepherd, glaciologista e diretor do Centro de Modelagem e Observação Polar da Universidade de Leeds.
Menos gelo do que se contava
Segundo ele, "o que encontramos nos surpreendeu. Não pode haver dúvidas de que a perda de gelo da Terra é uma consequência direta do aquecimento do planeta".
A pesquisa, publicada na revista Cryosphere, usou dados de outros trabalhos, entre eles o de uma equipe internacional de pesquisadores liderada pelo glaciologista suíço Matthias Huss, em 2019, que determinou a espessura do gelo e o avanço do derretimento de todos os glaciares do mundo (cerca de 215 mil), excetuando-se a Antártida e a Groenlândia.
O estudo apontou que eles guardam 158 bilhões de toneladas de gelo, mas boa parte pode sumir mais rapidamente do que se previa. Na chamada Alta Ásia, região que inclui o planalto tibetano e as montanhas da Ásia Central, há 27% menos gelo do que se supunha. As conclusões da pesquisa condizem com as do IPCC: será em 2060, e não 1 década mais tarde, que a cobertura de gelo na região chegará à metade do que é agora, o que reduzirá em até 24% o abastecimento de água de 600 milhões a 1 bilhão de pessoas até 2090.
Ponto de não retorno
A gigantesca perda da cobertura de gelo do planeta não é a única má notícia: a camada de gelo da Groenlândia pode não mais se recuperar. "O gelo que está se quebrando e caindo no oceano ultrapassou em muito a neve que se acumula na superfície do manto de gelo", disse a geóloga e cientista planetária Michalea King, do Centro de Pesquisa Polar e Climática Byrd da Universidade Estadual de Ohio, principal autora do estudo publicado na revista Communications Earth and Environment.
A geleira de Sukkertoppen, na Groenlândia, em 1935 (acima) e 2013 (abaixo).Fonte: Nationalmuseet /Geodatastyrelsen/Reprodução
Quarenta anos de dados coletados por satélites mostraram que nem se as temperaturas baixassem hoje a perda de gelo da Groenlândia cessaria. Entre 1980 e 2000, a perda anual de 450 bilhões de toneladas de gelo era compensada pela queda de igual quantidade de neve, conservando intacto o manto da Groenlândia. A partir daí, o derretimento subiu para 500 bilhões de toneladas de gelo anuais, não acompanhado pelo acúmulo de neve.
Se o nível dos oceanos subiu 15 centímetros no século 20, neste a velocidade aumentou: 3,6 milímetros todos os anos, e o ritmo está acelerando. Em 2019, o gelo derretido da Groenlândia foi responsável por fazer os oceanos subirem 2,2 milímetros em apenas 2 meses.
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