Você soube do projeto chinês de criar um “Sol artificial” aqui na Terra? Na realidade, a iniciativa está focada no desenvolvimento de novas tecnologias para a obtenção de energia limpa – uma vez que os modelos atuais, especialmente os baseados na queima de carvão, gás natural ou petróleo, precisam ser revistos, já que, além de a demanda energética não parar de aumentar, eles produzem um gigantesco volume de emissões.
Mais especificamente, a iniciativa chinesa consiste na construção de um reator de fusão nuclear – muito mais eficiente do que os de fissão nuclear em atividade atualmente no mundo – que gera o mesmo tipo de calor produzido pelo Sol e pode revolucionar a forma como se obtém energia no futuro.
Sol artificial?
Antes de falarmos mais sobre o reator, deixe a gente explicar que papo é esse de “Sol artificial”. Você já deve ter ouvido falar que a nossa estrela “funciona” a partir da queima do hidrogênio presente em seu núcleo, certo? O que ocorre é que, por conta da extrema pressão presente por lá, devido à altíssima força gravitacional, os átomos de hidrogênio se aproximam e colidem uns contra os outros, se fundindo em hélio – e liberando colossais quantidades de energia no processo, essa que é emitida pela estrela por todo o Sistema Solar e que permite que a vida exista na Terra.
Obviamente, replicar essas mesmas condições em um reator aqui no nosso planeta é um desafio e tanto, mas se trata de algo que faz algum tempo que cientistas de várias partes do mundo vêm tentando reproduzir. Para se ter ideia, a fusão nuclear produz pelo menos 4 milhões de vezes mais energia do que a que se conseguiria em usinas termelétricas com a queima do carvão, gás ou petróleo, e 4 vezes mais do que a gerada em usinas nucleares, que trabalham com a fissão nuclear.
Entretanto, os chineses conseguiram avanços importantes com relação à fusão nuclear e muitos outros países decidiram se unir ao esforço. O “Sol artificial” construído na China consiste em um reator em forma de rosquinha conhecido pela sigla EAST – de Experimental Advanced Superconducting Tokamak ou Tokamak Supercondutor Avançado Experimental em tradução livre – que se tornou o primeiro no mundo a proporcionar as condições necessárias para que a fusão nuclear pudesse acontecer.
Foi no EAST, aliás, que os cientistas conseguiram sustentar as reações de fusão por mais de 100 segundos – 102, para sermos mais exatos, o que é todo um recorde – e atingir temperaturas de 100 milhões de graus Célsius, equivalentes a 6 vezes a temperatura no núcleo do Sol. Impressionante, você não concorda? Pois, quando finalmente formos capazes de controlar e sustentar a fusão nuclear de forma eficiente, a promessa é que as reações se tornem fontes praticamente inesgotáveis de energia. E o mais importante: de energia limpa.
Onde a mágica acontece
Sobre o funcionamento dos Tokamak, como aqui no nosso planeta não temos como reproduzir a força gravitacional que existe no núcleo do Sol, isótopos de hidrogênio precisam ser expostos a temperaturas absurdas até se transformarem em um plasma e começarem a fundir seus átomos, liberando, com isso, energia. É preciso que exista uma grande quantidade de partículas, para garantir o maior número de colisões possível, assim como campos magnéticos poderosíssimos para se obter um tempo de confinamento elevado para que essas “trombadas” aconteçam cada vez mais depressa.
Essas reações todas ocorrem no interior de uma câmara a vácuo repleta de sensores e outros equipamentos. Suas paredes absorvem o calor produzido – que, por sua vez, é utilizado por uma central para gerar vapor e, então, produzir energia elétrica a partir de turbinas e alternadores. O bacana do processo é que, além de empregar materiais com níveis superbaixos de radiação e cujos subprodutos podem ser reutilizados nas próprias reações, ele não resulta em emissões de gases de efeito estufa e nem em rejeitos radioativos, como é o caso das usinas termelétricas e de fissão nuclear, e oferece menos riscos de acidentes.
Futuro energético
Hoje existem 18 reatores Tokamak em testes no mundo, incluindo esse famoso da China, e existe um projeto bilionário de cooperação internacional chamado International Thermonuclear Experimental Reactor (ITER) – ou Reator Termonuclear Experimental Internacional – que conta com a participação de 35 países, incluindo os EUA, Rússia, Índia, Coreia do Sul, Japão, China e a União Europeia. A expectativa é que esse reator produza temperaturas na ordem de 150 milhões de graus Célsius.
A iniciativa está focada na construção de um Tokamak no sul da França, na região de Provence, e que deverá incorporar tecnologias do EAST e de outros reatores de fusão nuclear para a realização de pesquisas. Ademais, existe outro centro em construção na província de Sichuan, na China, que será capaz de produzir temperaturas 13 vezes superiores às do núcleo do Sol – ou na ordem de 200 milhões de graus Célsius –, o que permitirá que as pesquisas relacionadas com a fusão nuclear avancem ainda mais.
Se tudo correr como esperado, a construção do reator em Sichuan deve ser concluída em 2021, bem como a do ITER, e o local deve iniciar os primeiros testes com plasma em 2025. E se os experimentos forem satisfatórios e a tecnologia progredir, a expectativa é de que em 2035 já seja possível construir um protótipo industrial – e que por volta de 2050 uma planta com capacidade para produzir energia em larga escala comercial entre em funcionamento.
Fontes