Se você acessa o TecMundo, é bem provável que goste de tecnologia e tenha vários eletrônicos em casa. Porém, entre as marcas de celular, televisor, Blu-ray player e outros produtos, você deve ter percebido que existem empresas orientais, norte-americanas, europeias, mas praticamente nenhuma brasileira. Já parou para se perguntar por que isso acontece?
Parece que há vários fatores que impedem que haja grandes empresas nacionais no ramo. Em 2012, por exemplo, a Interbrand fez uma pesquisa global e descobriu que entre as 10 empresas mais valiosas no mundo, cinco eram de tecnologia; contudo, ao realizar a pesquisa localizada no Brasil, a primeira companhia de tecnologia no ranking não chegava a ocupar nem o 20º lugar.
Justificando os motivos, André Matias, gerente de Avaliação de Marcas da Interbrand, disse que “as empresa brasileiras de tecnologia não têm tamanho suficiente para entrar na lista”. Ele diz que não se trata de um problema cultural, “porque somos inovadores”, mas sim falta de investimento no setor.
Qual é a primeira empresa brasileira de tecnologia reconhecida mundialmente?
Nós ainda não temos nenhuma, apesar de várias candidatas a altura. Algumas são inovadoras, como Easy Taxi, outras são gigantes do e-commerce como a Dafiti e Netshoes e há grandes empresas consolidadas, como o Buscapé.
O problema é que nosso contexto no Brasil não ajuda quando a questão é empreendedorismo. E isso inclui principalmente o governo, excessivamente burocrático e impiedoso com as taxas. A maioria das empresas nacionais de tecnologia que alcança alguma notoriedade cresce porque investidoras estrangeiras veem ali algum potencial.
E como crescer por conta própria quando o governo reduz a quantidades risíveis o faturamento das start-ups e pequenas empresas que estão nos primeiros passos? Outro problema se encontra em nosso sistema educacional, que — carente como é — limita dramaticamente o potencial de uma sociedade que poderia ser muito mais desenvolvida em aspectos tecnológicos. Afinal, sem capacitação não há desenvolvimento.
Um terreno fértil
Talvez a maior frustração ao analisar tudo isso venha do potencial desperdiçado. Como bem comentou Antônio Gil, conselheiro e ex-presidente Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom) nosso cenário, no que se refere à Tecnologia da Informação, não deixa de ser promissor.
“Tirando a China, [o Brasil] é o país que mais cresce — mais do que a Índia, mais do que o dobro da média mundial”, afirmou Gil, durante o painel “O Brasil como Potência de Inovação e Tecnologia”, no 26º Fórum Nacional realizado em maio de 2014 no Rio de Janeiro.
Apesar de dizer que o mercado de negócios em nosso país cresce ao ano 10% , em dólar, e 15% em reais, Gil alerta para as áreas críticas em que a tecnologia não tem sido bem aplicada no Brasil, como a Educação e as pequenas e médias empresas.
Para ele, nós carecemos de grandes empresas na área de Tecnologia da Informação, pois somos o quarto maior mercado do mundo “e nossa maior empresa fatura US$ 1 bilhão, quando a Índia tem cinco empresas faturando US$ 10 bilhões”.
A questão da pesquisa
Além de questões econômicas, há também o fator pesquisa. Em 2012, dados da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) diziam que 37% dos pesquisadores do Brasil atuavam em empresas, mais de um terço. Porém, na realidade, esses cientistas atuam praticamente apenas em empresas estatais ou ex-estatais (Eletrobrás, Vale do Rio Doce, Embraer, etc.)
As empresas privadas brasileiras preferem importar tecnologia estrangeira em vez de motivar a pesquisa em inovação e gerar patentes nacionais. O Professor Mariano Francisco Laplane, do Núcleo de Economia Industrial e da Tecnologia da Unicamp, diz que “parece que as empresas brasileiras têm medo de investir em Pesquisa e Desenvolvimento e perder dinheiro por falta de resultado, por isso compram a tecnologia de outras”.
Enquanto em países emergentes a atividade de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) é alavancado pelo setor industrial, investindo muito mais do que o governo nesse processo, no Brasil o mesmo setor investe apenas o equivalente ao governo na área.
Parceria entre cientistas e companhias
Outro obstáculo no que diz respeito à pesquisa está relacionado a regras burocráticas que desmotivam relações entre as universidades e as empresas. Os professores e pesquisadores acabam sendo impedidos de participar de projetos fora das universidades pela exclusividade exigida pelas instituições de ensino — regra que não existe em países de alto desenvolvimento tecnológico como os Estados Unidos.
Tudo isso, sem contar a falta de autonomia das universidades para firmar parcerias com empresas em o controle do governo. Visto que o quadro é problemático, as empresas acabam não investindo em inovação, por acharem arriscado, e importam tecnologias desenvolvidas por estrangeiros.
De olho no Brasil
A American Chamber of Commerce for Brazil (Amcham) junto à Embaixada brasileira em Washington, EUA, percebeu uma interessante tendência que aumenta. Empresas americanas de TI estão buscando novos negócios além da China e Índia e o Brasil é um dos favoritos entre os candidatos para esse tipo de parceria é o Brasil, devido a sua “abundância de recursos e afinidade cultural”.
Entretanto, para isso é preciso que as empresas brasileiras do setor de Tecnologia da Informação se tornem mais conhecidas no mercado americano. Segundo John Stoddard, da consultoria Web Associates, entrar no mercado dos Estados Unidos não é algo rápido, mas é um processo que requer preparação e desenvolvimento de relacionamento.
"Notamos muito interesse pelas companhias brasileiras na [conferência] Interop. Fomos procurados em busca de maior entendimento sobre as maneiras de se entrar no Brasil e iniciar negócios no País”, comentou Camila Moura, gerente de Comércio Exterior da Amcham.
Crescimento nacional no setor de TI
Felizmente — pelo menos na área de TI —, houve uma movimentação interna para o crescimento das empresas de tecnologia em 2014. No censo realizado pela Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assespro) no ano passado, foi descoberto que, em comparação com outros 18 países, as empresas de TI no Brasil são as mais maduras e também foram as que mais contrataram nos últimos 12 meses.
90% das companhias ligadas à área de Tecnologia da Informação fizeram contratações de novos funcionários. O levantamento também revelou que no cenário nacional apenas 39% das empresas do setor foram criadas nos últimos 15 anos — a média varia entre 14 e 28 anos de existência no mercado.
A consultoria Robert Half afirma que a demanda por parte das empresas continuará em alta neste ano. De acordo com o relatório, gerentes de TI, desenvolvedores e analistas de negócios serão os cargos com mais oportunidades.
Empresas de tecnologia brasileiras nas bolsas americanas
Quanto à expansão para o exterior, a Exame informou que é possível que as bolsas de valores americanas tenham consigo em 2015 a primeira companhia brasileira das áreas de tecnologia e internet. Isso porque muitas empresas começaram a abrir mão de investidores estrangeiros e tentar captar recursos, visando justamente alcançar o alvo que é o tema desta publicação: o crescimento do mercado brasileiro lá fora.
Segundo a Agência Estado, pelo menos cinco empresas que se encaixam nesse perfil iniciaram negociações para tentar chegar ao mercado dos Estados Unidos. "Há muita conversa na América Latina, para as empresas entenderem os processos e os benefícios de listar ações em Nova York", explicou Alex Ibrahim, que é vice-presidente para a América Latina da bolsa de Nova York (Nyse).
Já existem 32 companhias brasileiras presentes na Nyse, porém nenhuma está no ramo de tecnologia. Na Nasdaq, a única empresa brasileira é a Garnero Group, que atua na área de fusões e aquisições — segmento completamente diferente deste que estamos tratando.
Entre as companhias que mais têm chances de debutar nas bolsas americanas estariam a Decolar.com, maior agência de viagens da América Latina, que funciona através de uma plataforma online; e a Bebê Store, maior e-commerce de produtos exclusivos para bebês do Brasil — que comprou em 2014 sua concorrente Baby.com.br.
Parece que a Drafiti, grande loja online de produtos de moda, esteve muito próxima do feito, mas realizou em setembro de 2014 uma fusão com outras quatro empresas do ramo e acabou tendo de adiar seus planos. A Netshoes, popular e-commerce de calçados, também chegou perto da oferta pública inicial, mas precisou desistir da ideia por ter encontrado um cenário desfavorável na época.
Fica a esperança
Em resumo, as dificuldades são enormes, mas nós temos o que há preciso. Não é por falta de inovação ou competência que ainda não temos marcas de eletroeletrônicos ou patentes tecnológicas revolucionárias sob os holofotes lá fora. Trata-se de um complexo problema e burocrático logístico.
E enquanto essas barreiras não somem, algumas pequenas empresas tentam usar oportunidades indo a feiras e falando veículos internacionais para ganhar algum destaque. Um exemplo foi a Beenoculus Tecnologia que marcou presença na CES 2015. A startup de Curitiba apresentou seu modelo de óculos de realidade virtual no evento, tentando aproveitar a alta do mercado de dispositivos VR.
Por fim, como filhos do Brasil, permanece em nós o sonho de um dia termos representantes do nosso país lá fora, melhorando a sociedade e trazendo desenvolvimento para outras nações através da tecnologia. Pode soar utópico, mas analisando as chances mencionadas anteriormente neste texto, é possível que essa seja uma realidade não tão distante — até porque somos brasileiros, e brasileiro não desiste nunca.
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