O Ministério Público Federal (MPF), a partir de sua sede no estado do Mato Grosso, iniciou uma investigação sobre a possibilidade de a criptografia ponta a ponta do WhatsApp ser inconstitucional. Não há informações sobre eventuais penas caso a possibilidade seja confirmada, mas parece que o app não terá para onde fugir dessa vez.
Isso porque a parte da Constituição que o serviço supostamente fere é a que trata sobre os direitos e garantias fundamentais do cidadão brasileiro. Considerando que é muito improvável que o Congresso esteja disposto a mexer em qualquer segmento desse texto, o WhatsApp e todos os meios de comunicação criptografados ponta a ponta estariam em violação Artigo 5°.
Para ser mais específico, o parágrafo XII diz claramente o seguinte:
Art. 5º (…) XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.
Mas não era por isso... até agora!
Apesar disso, o WhatsApp tem sofrido com bloqueios, multas e prisões pelo fato de não atender e sequer se explicar à justiça quanto à possibilidade de quebrar ou não o sigilo das mensagens de seus usuários. Fora isso, as ações que correm hoje na justiça rementem à casos relativamente antigos, de quando o WhatsApp não utilizava a criptografia inviolável que possui hoje.
Isso quer dizer basicamente que a companhia deixou de atender a uma intimação judicial aparamente de propósito para ganhar tempo. Agora com o mecanismo de segurança implantado, o app pode alegar ser tecnicamente incapaz de fornecer o conteúdo requisitado. Contudo, na época em que foi requisitado, ele provavelmente era capaz de fornecer os dados.
O WhatsApp deixou de atender a uma intimação judicial aparamente de propósito para ganhar tempo
O fato de a criptografia ponta a ponta ferir a Constituição Federal é um outro ponto que, a partir de agora, pode representar medidas muito mais sérias ao mensageiro no Brasil. Afinal, a decisão de um juiz pode ser revogada por um outro de instância superior com relativa facilidade, mas a Constituição é a Constituição.
Essa mesma situação da legalidade da criptografia no Brasil bate de frente com o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/14), que entrou em vigor há pouco tempo. Em seu décimo artigo, o Marco atesta o seguinte:
Art. 10. A guarda e a disponibilização dos registros de conexão e de acesso a aplicações de internet de que trata esta Lei, bem como de dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas, devem atender à preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das partes direta ou indiretamente envolvidas.
§ 1o O provedor responsável pela guarda somente será obrigado a disponibilizar os registros mencionados no caput, de forma autônoma ou associados a dados pessoais ou a outras informações que possam contribuir para a identificação do usuário ou do terminal, mediante ordem judicial, na forma do disposto na Seção IV deste Capítulo, respeitado o disposto no art. 7o.
O investigador
O Procurador da República no Mato Grosso e responsável pela investigação, Guilherme Rocha Göpfert, disse ao site oficial do órgão que o direito à privacidade, apesar de garantido na Constituição, não é absoluto, como o WhatsApp tenta fazer crer. Ele também se mostrou preocupado com a disseminação desse tipo de pensamento, uma vez que favorece o crime organizado e o tráfico.
“O direito a intimidade, tal como os demais direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, não é revestido de caráter absoluto, de forma que não pode ser utilizado para ocultar práticas criminosas, explicou.
O criador da criptografia
Enquanto isso, em entrevista ao jornal carioca O Globo, Moxie Marlinspike, criador da criptografia ponto a ponto usada no WhatsApp, criticou a insistência da justiça brasileira em tentar forçar o app a colaborar em investigações policiais.
“Parece que, no Brasil, o juiz e os agentes da lei apenas não entendem como isso funciona, e não há nada que o WhatsApp possa fazer. Eles podem bloquear o WhatsApp pelo tempo que quiserem, que o WhatsApp não vai poder fornecer informações que eles não têm”, comentou ele ao jornal.
No Brasil, o juiz e os agentes da lei apenas não entendem como isso funciona
Marlinspike, que usa esse nome fictício para se proteger de agências de segurança e governos, ainda afirmou acreditar que empresas como WhatsApp e Apple não implementam criptografias inquebráveis em seus serviços para frustrar governos pelo mundo. Para ele, elas fariam isso a fim de proteger a informação dos usuários.
Mesmo sendo considerada inquebrável, a criptografia ponto a ponto não é à prova de falhas. Mesmo mandando mensagens embaralhadas com a tecnologia, se alguém burlar a segurança do smartphone do destinatário diretamente, será possível ter acesso ao conteúdo sem problemas. Foi basicamente isso que o FBI fez com o “iPhone do terrorista” quando a Apple se negou a colaborar.
Penalidade máxima?
Da forma que está, é quase certo que o WhatsApp e seu concorrentes que usam criptografia similar sejam penalizados no Brasil a partir da investigação do MPF-MT. Quais penas essas empresas podem sofrer, não sabemos, mas o mais provável é que haja um bloqueio definitivo em algum momento no futuro (considerando que o app não abandone a criptografia), impedindo para sempre que o WhatsApp funcione no Brasil.
Será que chegaremos a esse ponto, ou a discussão sobre a privacidade vai acabar gerando uma mudança na Constituição? Deixe sua opinião nos comentários.
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