Por Arthur Prandato Buzatto.
“Escreva um resumo sobre a Guerra dos Palmares.”
Tecnologia, negócios e comportamento sob um olhar crítico.
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“Resolva essa equação para mim.”
“Traduza este texto.”
Se você abrir o ChatGPT, da Open AI, ou o Bard, do Google, e fizer qualquer uma dessas perguntas, com os dados que você quer descobrir, a resposta aparecerá em segundos na sua tela. Nem precisa ficar navegando entre páginas e páginas. Esse é o poder da inteligência artificial (IA).
O que isso significa para a educação? A resposta que eu ofereço traz algumas ramificações.
Em primeiro lugar, precisamos entender o que é a ferramenta. Pense lá atrás, quando a calculadora foi inventada, elas causaram um estrondo no mundo inteiro. Resolver cálculos se tornou tão simples, sendo necessário apenas apertar alguns botões, que o ensino da matemática, como acontecia até então, foi questionado.
Logo foi percebido que a ferramenta, por si só, funcionava como um auxílio e não como uma base de aprendizado. Com ela, os alunos não precisavam decorar a tabuada – mas quem disse que decorar a tabuada era o ponto? O foco é desenvolver raciocínio, entender as contas e treinar a mente. O resultado de cada equação nunca foi o mais importante. E a matemática continua sendo estudada aprofundadamente mesmo com calculadoras sendo facilmente acessíveis.
O mesmo vale para o momento que estamos vivendo agora. A inteligência artificial certamente traz facilidades e não pode ser ignorada. Assim como todo celular possui uma calculadora, não é tão difícil imaginar que, no futuro, o acesso a essa tecnologia será comum para grande parte da população. Afinal, é só pensar na linha cronológica pela qual passamos — fomos das enciclopédias para o Google. Este é o próximo passo.
Agora, o segundo passo é entender para que a ferramenta serve. Resumidamente, podemos dizer que a IA amplia o acesso à informação.
Quando falamos de educação, muitas pessoas pensam imediatamente em informação. Faz parte, mas o processo educacional não se trata apenas disso. É principalmente sobre desenvolver o aluno, ou, melhor dizendo, fornecer os instrumentos e o apoio necessário para que ele se desenvolva.
Por isso, acredito que o que o ChatGPT e o Bard propõem não é uma ameaça à educação. Pelo contrário: essas ferramentas permitem que os educadores se concentrem mais no que é essencial, que é trabalhar o pensamento crítico, a interpretação, o raciocínio e a crítica. Isso torna a inteligência artificial uma aliada, na verdade, e não um perigo.
É até possível utilizar a IA como um mecanismo para auxiliar o docente. Por exemplo, ao formular um debate em sala de aula a partir de perguntas e respostas dadas pela tecnologia. Tudo o que for produzido a partir desses dados fará parte da formação do aluno, e não será mera informação concedida.
Isso vale, inclusive, para os debates éticos que estão dominando a internet a respeito do uso das ferramentas — dá para fazer trabalhos ou estudar a partir delas? Como descobrir as referências para validar uma pesquisa? Existem muitas discussões possíveis que podem envolver os estudantes.
É contraproducente simplesmente banir o ChatGPT ou o Bard do ambiente escolar
A IA também pode apoiar a educação em outras frentes. Dúvidas mais simples, produção de questionários, tutoriais, são todas maneiras de complementar a vida escolar, tanto para os alunos quanto para os professores. Em outro aspecto, essa é uma tecnologia que pode analisar quantidades imensas de dados e ajudar na tomada de decisões a partir deles, o que permite que as instituições educacionais atuem melhor em prol do corpo discente, com maior nível de personalização, por exemplo.
De fato, existem muitos benefícios em potencial para o uso da inteligência artificial na educação. Ainda assim, é claro, há algumas cautelas importantes a serem tomadas. No caso do ChatGPT, não faltam relatos de informações imprecisas e até inteiramente fabricadas em alguns casos. A checagem dos fatos é essencial.
Além desses erros, o modo como as respostas são apresentadas, muitas vezes, pode gerar uma sensação de certeza que não existe em diversos debates. Na verdade, a educação passa pelas perguntas o tempo inteiro, e quanto mais descobrimos sobre um assunto, mais questões surgem.
Uma IA pode dar a entender que a resposta X é única e final. Aceitar isso de braços cruzados vai contra toda a ideia de desenvolvimento que mencionei há pouco. A simplificação das discussões, nesse cenário, pode se tornar um problema real.
Outro ponto que também é fundamental garantir é que os alunos entendam o papel desse tipo de auxílio, para que não se tornem inteiramente dependentes dele. Este é um desafio comportamental que deve ser trabalhado pelos educadores em todos os seus âmbitos, na escola e na família.
Dito isso, vale mencionar que as vantagens do uso (ou não) da inteligência artificial na educação depende de uma série de fatores, principalmente no contexto do estudante. O modo como ele estuda, sua rotina, sua autonomia, tudo isso deve ser considerado para entender se o ChatGPT ou qualquer outra tecnologia do tipo será mais benéfica ou mais desfavorável ao ensino.
Do outro ponto de vista, acredito que é contraproducente simplesmente banir o ChatGPT ou o Bard do ambiente escolar. O avanço tecnológico está acontecendo e não há razão para fugir dele. Se ele mudar o mundo, será como as demais mudanças que vimos até hoje: impossíveis de parar.
Por fim, você pode perguntar ao Bard ou ao ChatGPT sobre a Guerra dos Palmares, mas entender o contexto histórico e os efeitos do conflito só é possível com um estudo recorrente e fundamentado de História. Você pode perguntar o resultado de uma equação, mas não conseguirá refazer o problema se não conseguir raciocinar o que foi feito. Você pode pedir uma tradução, mas não aprenderá a falar um novo idioma.
A tecnologia pode e deve ser vista como aliada – nunca substituta –da educação. Ao invés de fugir, as escolas devem se adaptar e entender a IA como uma pressão para seguir o caminho do desenvolvimento e da potencialização, para além do informar. No fim do dia, os alunos precisam saber perguntar, interpretar e criticar, com ou sem um robô por trás. E é nosso papel fazer com que eles cheguem lá.
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